domingo, 23 de março de 2014

GAZETA DA BD (22) NA GAZETA DAS CALDAS – Argumentistas na Banda Desenhada Portuguesa (1) – DAVID SOARES

Fotos da Exposição David Soares - O Ato da Escrita é um Ato de Autor, no AmadoraBD 2013
Estas fotos já não couberam na matéria publicada na Gazeta das Caldas.

GAZETA DA BD (22)
na Gazeta das Caldas
Argumentistas na Banda Desenhada Portuguesa (1)
DAVID SOARES

Gazeta das Caldas, 21 de Março de 2014

Por Jorge Machado-Dias 

A generalidade dos leitores de Banda Desenhada, terá a noção de que esta é um meio de expressão composto pela escrita e pela ilustração. Contudo, nem sempre é dado a quem escreve banda desenhada, o crédito pela obra. Lembremos que durante muito tempo (e ainda hoje nos comics americanos), o nome do escritor nunca, ou quase nunca, figurava nas fichas técnicas dos livros – a não ser que escritor e ilustrador fossem a mesma pessoa. Esta circunstância foi, durante muito tempo, quase um crime de lesa-autoria, uma vez que quem escreve é, de facto, o autor da história. A primazia foi dada na maior parte das vezes ao ilustrador, de tal maneira que era (e quase sempre ainda é) norma, considerar quem ilustra como o único autor da obra.

Mas as coisas começaram a mudar nos últimos vinte anos. Muito pelo aparecimento de uma nova fornada de escritores de BD, tanto pela qualidade literária, como pela força dos seus textos (argumentos). E estou aqui a falar apenas de escritores, não de escritores/ilustradores, na Banda Desenhada portuguesa, obviamente.

Se durante muito tempo apenas Jorge Magalhães dominou o espectro da escrita de BD em Portugal – acompanhado esporadicamente por António Gomes de Almeida-AGA (com Artur Correia), de Tito (criador, com André, de Tónius o Lusitano), ou de António Simões (ou Tozé Simões, parceiro de Luís Louro na criação de Jim del Monaco) – actualmente, devido a uma corrente de renovação da BD portuguesa, patrocinada especialmente por Mário Freitas, editor da Kingpin Books – o aparecimento e confirmação de novos escritores/argumentistas é um facto notório, de grande relevância. Sobressaindo neste contesto vários autores, como David Soares, André Oliveira (ambos também desenhadores), o próprio Mário Freitas e Nuno Duarte, um quarteto de boa (em quantidade e qualidade) produtividade.

Neste grupo sobressai David Soares. O percurso deste autor é muito curioso e quase sui-generis, uma vez que começou por realizar banda desenhada, no final dos anos 1990, como “autor completo” (escritor/ilustrador) em histórias publicadas em fanzines – de que foi criador/editor – e seguidamente em livros editados por ele próprio, com a chancela pessoal “Círculo de Abuso”, passando depois à escrita de contos e uma série de romances, que o tornaram escritor profissional com créditos firmados, voltando depois à escrita de banda desenhada.

David Soares

Lembremos então, que David Soares nasceu em 1976 em Lisboa, formou-se como designer gráfico, tendo trabalhado nesta área durante vários anos. Iniciou em 2000 uma carreira de autor de BD com o álbum Cidade-Túmulo, auto-editado com sua chancela Círculo de Abuso. Editou de seguida o álbum Mr. Burroughs, que escreveu e foi ilustrado por Pedro Nora. Em Março desse ano já publicara o álbum Sammahel, uma sua adaptação em banda desenhada do romance Doutor Fausto de Thomas Mann. No mesmo mês, publicou ainda o seu primeiro livro de contos, intitulado Mostra-me a Tua Espinha. Em 2002 realizou o álbum de BD A Última Grande Sala de Cinema, editado em 2003 – o mesmo ano em que a editora franco/belga Frémok publicou Mr. Burroughs em língua francesa. Em 2004, publicou o livro de ensaio literário Sobre BD.

Depois veio a escrita de contos e romances. Publicou então dois livros de contos: As Trevas Fantásticas (2005) e Os Ossos do Arco-Íris (2006). A editora Saída de Emergência publicou os seus romances A Conspiração dos Antepassados e Lisboa Triunfante, em 2007 e 2008 respectivamente.

Regressou à escrita de banda desenhada com o álbum Mucha (2009), ilustrado por Osvaldo Medina e Mário Freitas, antes de publicar o romance O Evangelho do Enforcado (2010).

Em 2010 escreveu os textos do álbum de BD É de Noite Que Faço as Perguntas, desenhado por Jorge Coelho, João Maio Pinto, André Coelho, Daniel Silvestre Silva e Richard Câmara, uma narrativa ficcionada sobre a cronologia da primeira república portuguesa, a publicar no âmbito das comemorações do 1.º centenário da implantação da República.

Em 2011 foi editado o seu romance Batalha, também pela Saída de Emergência. Nesse ano seria publicado pela Kingpin Books O Pequeno Deus Cego, com argumento seu e ilustrado por Pedro Serpa, que lhe valeria o Prémio de Melhor Argumentista português – atribuído pelo AmadoraBD em 2012.


E, acerca deste O Pequeno Deus Cego, para se perceber como realiza David Soares a sua escrita/argumento de banda desenhada, nada melhor que citar Pedro Vieira Moura, no texto que escreveu para o Catálogo do AmadoraBD de 2013, a propósito da exposição dedicada ao escritor:

“(...) Se a composição das páginas é sempre significativa, onde o balanço entre páginas mais regradas por vinhetas "retóricas" e outras que respiram toda a paisagem, onde certas sequências se concentram num pequeno mas decisivo gesto e outras se es­praiam em longos momentos controlados (o monólogo do Dragão Castrador), e sem qualquer detrimento para com o ilustrador, isso deve-se aos minuciosos e detalhados planos de Soares [nos story board com que acompanha os textos]. Cultor, como se sabe, do full script, isto é, argu­mentos nos quais não apenas se apresenta a ideia da diegese [narração], mas os porme­nores dos gestos e fácies das personagens, onde cada estrutura típica da banda desenhada, sobretudo a composição, é tão-somente uma outra ferramenta de escrita, David Soares fornece, por assim dizer, os ilustradores com quem colabora, de um mundo já composto, de uma ideia formada, que apenas necessita de um corpo, de uma matéria cumprida. O que em nada derime o papel do ilustrador, e os contornos nos quais ele ou ela terão liberdade para incutir a sua pró­pria expressividade (...)”

Duas páginas do “Story Board” de David Soares para O Pequeno Deus Cego e as páginas realizadas por Pedro Serpa.

Parte que não coube no espaço da Gazeta da BD:

Em 2013, durante o Festival Amadora BD, foi lançado o novo livro de David Soares e Pedro Serpa, Palmas para o Esquilo, edição Kingpin Books.

Pedro Serpa e David Soares em sessão de autógrafos - AmadoraBD 2013

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2 comentários:

  1. que revisionismo!
    e os anos 90? José Carlos Fernandes, Nuno artur Silva, João Paulo Cotrim, Marte, Pedro Brito, Paulo Patrício? esses sim argumentistas de qualidade e não esse lixo comercialóide!!!
    que tendência do pessoal da Bd esquecer o que foram os esforços da BaleiAzul, Bedeteca Lx e Polvo quando a BD em Portugal era de qualidade ao contrário dos últimos 10 anos!!! mesmo esse david Soares não ultrapassou o seu Mister Burrougths, em parte pelos desenhadores medíocrs que tem colaborado. mas isso não interessa, o que é triste é desprezar os bons trabalhos dos anos 90 e ainda os primeiros dois ou três dos anos 00...
    muito triste!
    nunca mais leio o vosso blogue - dizem que são um Jornal de BD, para mim parece antes o clube de aeromodelismo da covilhã!
    Nunes Rodésio

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    1. Caríssimo Nuno Rodésio, revisionismo? Que ideia mais estapafurdia e imbecil. Esquece que o texto que refere foi matéria para um jornal – com espaço curto. Quis escrever sobre o que se passa HOJE na BD portuguesa em matéria de argumentistas. Comecei pelo David Soares que é, quanto a mim o mais importante – reparou no nº 1 colocado no título do texto? Não deve ter reparado, como, aliás, me parece que não repara em nada. Está ancorado nos anos noventa, o resto não lhe interessa. Sabe que fui o primeiro editor de José Carlos Fernandes? Não sabe? Então não escreva disparates. Escrevi sobre a BD actual, não sobre a dos anos noventa. O Kuentro, já agora, não precisa de leitores que não percebem nada do que lá se publica. Tchausesco e até mais nunca!

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