Jornal de Notícias, 3 de Novembro de 2011
SEDE DA REVISTA CHARLIE HEBDO INCENDIADA
ATENTADO É RETALIAÇÃO A UM NÚMERO DA PUBLICAÇÃO SATÍRICA COM MAOMÉ NA CAPA
F. Cleto e Pina
As instalações da revista satírica francesa Charlie Hebdo foram destruídas anteontem de madrugada por um incêndio causado por um cocktail Molotov, previsivelmente lançado por fundamentalistas islâmicos.
O atentado, que surge na sequência das ameaças que a publicação recebeu nos últimos dias, não foi reivindicado e terá sido a resposta ao número 1011 da revista, subintitulado “Charia Hebdo”, ontem posto à venda em França, que trazia na capa o profeta Maomé, “convidado” para o dirigir a propósito da vitória do partido islamista Ennahda nas recentes eleições tunisinas. Na caricatura, o profeta ameaça dar “100 chicotadas a quem não morrer de riso” e no miolo, a par das rubricas habituais, há diversos desenhos e artigos que têm os fanáticos religiosos como alvo.
Na sequência do atentado, os dois andares do edifício ocupados pela publicação ficaram completamente destruídos, bem como todo o equipamento informático. Ao mesmo tempo, o site da revista era vítima de pirataria informática, sendo substituído por uma mensagem integrista islâmica.
Apesar disso, a sobrevivência da revista não deverá estar em causa, uma vez que os seus arquivos em papel e digitais estavam noutro local. Entretanto, diversos jornais franceses ofereceram as suas instalações para alojarem provisoriamente a redacção da “Charlie Hebdo” tendo o presidente da câmara de Paris feito uma proposta no mesmo sentido.
Charb, o desenhador que dirige a revista, embora visivelmente afectado pelo sucedido, afirmou com algum humor: “Nós combatemos os integristas com desenhos, textos e papel… e o papel arde bem.” Na mesma linha, Luz, autor do desenho de Maomé, ironizou: “A primeira vez que um islamista se serve de um cocktail, é para enfiá-lo pela nossa garganta abaixo”.
O primeiro efeito do atentado foi uma corrida aos quiosques, tendo a “Charia Hebdo” esgotado em poucos minutos em muitos pontos de venda.
Surgida em 1970, como consequência da proibição pelo governo francês da “Hara-Kiri Hebdo”, nascida dois anos antes, como fruto dos ventos de mudança introduzidos pelas manifestações de Maio de 1968, a revista “Charlie Hebdo” adoptou desde sempre uma linha satírica, contundente e incómoda, sem poupar temas ou personalidades.
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Ver também em As Leituras do Pedro
Imagens da responsabilidade do Kuentro
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