Uma das grandes histórias de Fernando Relvas
Karlos Starkiller foi a 23ª história de Relvas depois de se iniciar na publicação de bandas desenhadas, no jornal/fanzine
O Estripador em 1975, quando ainda assinava Melo Relvas. Após o fim de
Taxi Driver no semanário
Se7e, Relvas iniciou em 1984, a sua oitava história naquele semanário:
Karlos Starkiller, jornalista de ponta, que viria a ter mais um episódio neste semanário em 1985,
A Sombra de Xizhakt Rabin. Em 1991 seria publicado um outro episódio,
Gulf Stream, na revista
Lx Comics e ainda outro n’
O Inimigo,
Testos Torres Contra Cara Dread. Estou a guiar-me pelo álbum publicado em 1997 pela Bedeteca de Lisboa e Baleiazul, apenas com o título
Karlos Starkiller, que conta com 67 páginas.
Mas
Starkiller aparece previamente na página 7 da história que o autor publicou anteriormente no
Se7e,
Sangue Violeta e que desaparece a partir da página 34, quando se conta como foi
Karlos Starkiller corrido a tiro, quando tentava entrevistar
Violeta para o “Rock Marginal”...
Portanto a história de Carlos Pombo Capador de seu nome completo, que usa o pseudónimo Karlos Starkiller, começa assim no seu próprio álbum: “Insuficiências sexuais mais ou menos notórias, de profissionais, responsáveis ou meros consumidores de informação (mal informados no período crucial da puberdade), tendente à recondução de velhos censores, novíssimos censores e pós-novíssimos sensores (... quão difícil é fazer humor e amor, directos, nesta terra!), obrigaram ao corte brusco da vertiginosa carreira de Karlos Starkiller como realizador de programas de televisão, cronista emérito, repórter independente e promotor de grupos (p. ex. Violet Blod) e o seu regresso ao funcionalismo, algo público, num hebdomadário lusitano, como reporter de secretária... ou seja – para simplificar, Karlos Starkiller está Fo-d-do e mal pago...”
É um episódio inicial (sem título) completamente rocambolesco e caótico, que começa com telefonemas cruzados, passa por uma viagem de avião quando Karlos, farto de estar agarrado à máquina de escrever e aos telefones, resolve fugir para a Nicarágua, com a Olga Punk e a filha do director do jornal, mas onde as coisas não serão nada pacíficas (é mesmo a confusão geral da história) e em que acaba por aparecer gente com cabeça de abacaxi, de nabo, etc... e o “Capitão Latino-América”. Enfim... demasiados copos no Bairro Alto até às tantas da manhã, dão nisto.
A história seguinte,
A Sombra de Xizhakt Rabin é uma complexa história de espionagem internacional passada no Líbano, vagamente inspirada no caso Irangate, que evoluirá para uma comédia delirante, como era típico do autor, onde aparece um Mário Soares com cabeça de abóbora e alguns colegas de Relvas no jornal
Se7e. A forma como a história reflecte a actualidade da época está bem patente na interrupção da intriga durante uma semana, para dar lugar a uma entrevista com o Presidente americano Ronald Reagan, de visita a Portugal em Maio de 1985. Uma tomada de posição que, segundo o que Relvas disse a um jornalista, se deveu às pressões da sua namorada da altura, uma rapariga politicamente muito empenhada…
Quanto a
Gulf Stream, é uma curta história de três páginas, publicada na revista
Lx Comics, em que Mort O’Gulf e a Billies O’Fell encontram Carlos em Janeiro de 1991, o traço de Relvas aqui já é diferente, mais limpo e conciso. Quando Starkiller se prepara para partir para o golfo, a fim de relatar os acontecimentos, com Mort O’Gulf, aparece-lhe em casa a provocante Billies O’Fell e então tudo se passa em frente da TV, com noitadas eróticas de parceria com a Billies, até se perceber, pelas notícias, que rebentara a guerra no Golfo.
Testos Torres Contra Cara Dread foi publicada n’
O Fiel Inimigo, é uma história de 14 páginas, num estilo completamente diferente das anteriores. Acabado de chegar do Mar do Japão, Karlos Starkiller não está com grande paciência para voltar a aturar aeroportos, sobretudo quando o mandam atrás do suposto funcionário mais duro do serviço de estrangeiros e fronteiras, Testos Torres. A história, publicada por altura das comemorações dos 20 anos do 25 de Abril, quando a fúria racista era patente, disfarçada de zelo administrativo. O traço de Relvas é aqui muito mais solto, as vinhetas sem enquadramentos de traço e uma expressividade mais conseguida.
O livro da Baleazul/Bedeteca de Lisboa inclui um interessante posfácio do autor, na contracapa:
"Karlos Starkiller é, de há cerca de quinze anos, o pseudónimo mais temível de Carlos Pombo Capador, personagem enérgico e multifacetado que só há menos de um ano o leitor português começou a conhecer.
Apesar de ter assinado um bom número de artigos, em diversos países, não é como jornalista que o seu nome é mais conhecido, mas sim (e eu que o diga!), como um chato extremamente perigoso, um predador sem escrúpulos nem ideologia, uma carraça execrável ou outras coisas que pendem, todas elas para pior do que isso. Não me cabe reabilitar a imagem humanista de Karlos (nem as minhas recentes funções junto do politburo mo permitiriam), mas quero deixar bem claro que nunca, em toda a minha carreira, encontrei personagem mais pitorescamente coerente com a imagem necessária, num mundo cada vez mais iconográfico.
Cor. Schlivovitza - Antigo oficial jugoslavo,ex-quádruplo espião, dois dos quais já mortos, um deportado e outro na reserva, actua como conselheiro informático em Moscovo e Pequim.
Macau, Dezembro de 1984"
Agradeço a Geraldes Lino e a Álvaro Santos as prestimosas ajudas para a elaboração deste texto.
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