sexta-feira, 18 de agosto de 2017

Gazeta da BD #78, 11 de Agosto de 2017 - Corto Maltese fez 50 anos – ou... 130?

Gazeta da BD #78, 11 de Agosto de 2017

Corto Maltese fez 50 anos – ou... 130? 
A personagem apareceu nas páginas de Sgt. Kirk em 1967 


Texto completo:

Para ser sincero, eu que escrevi já uma boa série de textos sobre Corto Maltese e o seu autor Hugo Pratt, esqueci completamente esta data e só fui recordado pelo texto de Francisco Louçã no jornal Público, graças ao inefável Geraldes Lino – sempre atento a tudo o que se passa no “reino da BD”.

O meu encontro com Corto Maltese, nas páginas da revista (A Suivre) em 1979 despertou-me definitivamente o interesse pela banda desenhada. Mal sabia eu que Corto iria acompanhar-me quase para o resto da vida. Quando trabalhei como designer das Edições 70, nos anos oitenta, coube-me mesmo legendar o último álbum da série editada por essa editora, substituindo a “mítica” legendadora de BD da altura, Zulmira Perdigão. Tratou-se de Tango Argentino (o título original era apenas Tango, mas o editor resolveu acrescentar Argentino, não sei porque carga de água) o que, por assim dizer, fez com que a personagem “se me colasse” definitivamente no imaginário bedéfilo. Isto numa altura em que a legendagem era feita à mão, uma vez que ainda não existiam os meios informáticos, que agora nos permitem legendagens na BD realizadas por computador.

Corto Maltese surgiu em 10 de Julho de 1967 nas páginas da revista italiana Sgt. Kirk, com a história A Balada do Mar Salgado, em que Hugo Pratt (1927-1995) apresenta uma história bem diferente do que era habitual na BD – e que seria, pela sua extensão, aquilo a que hoje chamamos um “romance gráfico”. Era uma história com 165 páginas, na primeira versão publicada em Portugal, pela Bertrand, em 1982. Em 1990 relegendei este álbum, para serem corrigidos alguns erros, com vista a uma segunda edição, que nunca seria feita.

Começando pelo princípio, Corto Maltese aparece pela primeira vez n’A Balada, preso a uma jangada de madeira à deriva no imenso oceano Pacífico, por ter sido abandonado à sua sorte no final de uma aventura que lhe tinha corrido mal e da qual haveríamos de conhecer pormenores nessa história. Mas digamos que este aparecimento de Corto Maltese foi, por assim dizer como personagem secundário daquela história. Mais tarde, depois do fecho da Sgt. Kirk, Pratt conheceu os directores da revista francesa Pif Gadget, que lhe propuseram uma série em torno de Corto Maltese. E entre Abril de 1970 e Abril de 1973, foram publicados 21 episódios das histórias de Corto, actualmente agrupados em ciclos: Sob o Signo do Capricórnio, Corto Sempre um pouco mais longe, As Célticas e As Etiópicas.

Na segunda metade dos anos 70 e nos anos 80, Pratt continuou a explorar o filão Corto Maltese, em aventuras de grande fôlego, que consolidaram o seu prestígio mundial como autor de BD, como um dos seus grandes criadores. Corto Maltese na Sibéria (1974), Fábula de Veneza (1977), A Casa Dourada de Samarcanda (1981), A Juventude de Corto Maltese (1981), Tango (1985), As Helvéticas (1987) e (1988), a última história de Corto.

Hugo Pratt, em 1993 seria operado a uma catarata e morreria dois anos depois, em Lausana, vitimado por um cancro nos intestinos, aos 68 anos, em 20 de Agosto de 1995. É para mim actualmente muito penoso escrever sobre os últimos anos de Pratt e aconselho vivamente a leitura do livro de Dominique Petitfaux, muito especialmente o último capítulo.

Segundo o autor, o marinheiro nasceu em La Valetta, na ilha de Malta, a 10 de Julho de 1887 (há 130 anos, portanto), filho de um marinheiro da Royal Navy originário da Cornualha, e duma cigana originária de Sevilha, daí Corto ter nacionalidade britânica. Reside oficialmente em Antígua y Barbuda, nas Antilhas, apesar de a sua única residência conhecida ser em Hong Kong... e conheceriamos, através da história A Juventude de Corto Maltese, o início do seu relacionamento com o russo Rasputin, o anarquista louco, personagem também ela carismática da série, que funciona como uma espécie de “alma negra” de Corto e é parte integrante em muitas das histórias do marinheiro maltês. Mas existem outras personagens marcantes destas histórias, desde Cush (As Etiópicas) ou Louise Brookszowic (Fábula de Veneza), passando por muitos outros.

Segundo o autor, Corto Maltese desapareceria durante a Guerra Civil de Espanha (1936-1939) - não se sabendo se morreu aí, uma vez que, para baralhar estas contas Pratt chegou a “afirmar” que Corto teria sido visto por algumas pessoas em vários recantos do planeta...

Numa das entrevistas com Dominique Petitfaux, publicadas no livro O Desejo de Ser Inútil, Pratt afirmou “Não fico nada chocado com a ideia de que um qualquer autor, possa um dia, vir a recuperar Corto Maltese”. Talvez por isso, a editora Casterman resolveu em 2015, 20 anos depois da morte do autor, ressuscitar Corto Maltese. Os autores escolhidos foram o castelhano Juan Diaz Canales, para os textos e o catalão Ruben Pellejero, para ilustrar as histórias. Foram já publicadas duas histórias: Sob o Sol da Meia Noite e este ano será editado em Portugal o álbum Equatória, dos mesmos autores.

Este artigo teve as ajudas de “Corto Maltese no Público, guia de leitura” de Carlos Pessoa, com a entrevista com o autor e do magistral livro de entrevistas com Hugo Pratt, de Dominique Petitfaux “O Desejo de ser inútil”.

Páginas de A Balada do Mar Salgado e Fábula de Veneza

A primeira edição de A Balada do Mar Salgado em Portugal, da Livraria Bertrand , Novembro de 1982. O velho exemplar que serviu para relegendar a história, apesar de não ter sido reeditada pela Bertrand - mas cuja legendagem me foi paga. Penso que este livro só foi reeditado pela Asa, mais tarde. 

O próximo Corto Maltese, Equatoria, de Juan Diaz Canales e Ruben Pellejero.

Última e 1ª página do BDjornaleco #8, de 31 de Outubro de 2015, dedicado aos 20 anos da morte de Hugo Pratt.

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