EMILIO SALGARI PASSA PARA BD
POR MÃO PORTUGUESA
Em 'Os Piratas do Deserto', Santos Costa adapta pela primeira vez em banda
desenhada em Portugal um livro do criador de Sandokan e do Corsário Negro
Eurico de Barros
Foi lido e elogiado por Umberto Eco, Borges, Neruda, Fellini ou Garcia Márquez, e 'Che' Guevara levou livros dele para a Síerra Maestra durante à guerrilha em Cuba. No passado dia 21 de agosto, assinalaram-se os 150 anos do nascimento do italiano Emilio Salgari, que empolgou várias gerações de leitores com dezenas e dezenas de livros de aventuras passadas nas paragens mais distantes e exóticas do mundo, e que criou heróis como Sandokan ou o Corsário Negro. A coincidir com a efeméride, acaba de sair Os Piratas do Deserto, de Santos Costa, a primeira adaptação 'para banda desenhada (BD)em Portugal de um romance do prolifero escritor Itália no; feita por um desenhador (também escritor, ilustrador e cartunísta) nos seus tempos livres de funcionário público, agora já reformado.
"Esta aventura foi originalmente publicada no Mundo de Aventuras, em dezembro de 1986, e agora levou uma nova versão, mais ampliada", conta o autor. "Afinal passaram-se 26 anos e tive que adaptar o traço para a obra ser mais homogénea. Eram 32 pranchas que agora foram transformadas em 165. E, graças à editora, Os Piratas do Deserto 'cai' mesmo na comemoração dos 150 anos do nascimento do Emilio Salgari - e no ano passado, passou o centenário da sua morte".
O álbum, onde um aristocrata corso e o seu fiel criado se aventuram no deserto do Sara, em busca de uma expedição desaparecida, adapta dois livros de Salgari, A formosa judia e Os Piratas no Deserto. "Esta obra foi uma das que sofreu uma maior corruptela por parte do editor português do Salgari, a Romano Torres, que fazia edições populares e muito baratas", explica Santos Costa. "Eles condensaram os dois livros num só volume e alguns capítulos foram amputados. Por isso, tive o cuidado de dizer no álbum que é uma adaptação livre da obra de Salgari, e porque também fiz a adaptação de maneira a que alguns episódios que não interessassem muito poderem sair sem deturpar o curso da história" .
O tipo de aventura, o traço do desenhador e o preto e branco dão a Os Piratas do Deserto um sabor nostálgico e tradicional, a contrapelo da maioria da BD de hoje. Uma intenção confirmada pelo autor. "É um álbum a contracorrente, sim. Mas eu, quer na BD, quer no cinema, nem sempre acompanho a maré e o público leitor e cinéfilo pode desejar que haja alguma coisa do passado que ainda seja feita hoje. E esta BD é a preto e branco porque também há ainda hoje alguns filmes que o são. É uma opção estética porque se enquadra na obra original, que é do século XIX, com um assunto do século XIX. Não podia ser de outra maneira, a cores não fica tão bem. E o deserto, a colorido, daria uma cor quase uniforme. O preto e branco fica muito melhor".
Admirador de Hugo Pratt, Santos Costa diz não ter "propriamente um estilo". "O meu desenho é um desenho saído muitas vezes quase espontâneo, intermédio entre a BD franco-belga e alguns autores ingleses". Para ele, "a BD e a escrita são apenas complementos, quase um vício que procurei sempre manter, às vezes com sacrifício meu e da família. Nunca pus a opção de ser um autor de BD a tempo inteiro, nem consegui ser um autor consagrado. E mesmo que conseguisse, não conheço autores portugueses que sobrevivam apenas desta arte. Não se consegue ser um profissional de BD a tempo inteiro. Isto não quer dizer que Portugal não seja um país que não acarinhe os seus autores. Mas é um país que, no âmbito que atingiu a 9.a Arte, é muito limitado".
Santos Costa gostava de desenhar outro livro de Emilio Salgari, A Montanha de Luz; "que foi a primeira
tradução dele editada em Portugal, um ano antes da sua morte, em 1911". "Não estou a planear nada, por causa das condições do nosso mercado, mas gostava que Os Piratas do Deserto não fosse o primeiro e último romance do Salgari a ser adaptado para BD em Portugal", diz.
Os Piratas do Deserto
Santos Costa
ASA (176 páginas) 12,50€
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