GAZETA DA BD #50 NA GAZETA DAS CALDAS
O NOVO LIVRO DE MILO MANARA
“CRAVAGGIO – O PINCEL E A ESPADA”
EDITADO EM PORTUGAL
30 de Outubro de 2015
Jorge Machado-Dias
Milo Manara (o primeiro nome é o diminutivo de Maurilio), nasceu em 1945 em Luson, na província italiana de Bolzano. É um dos actuais três grandes autores dos fumetti (Bandas Desenhadas) italianos mais conhecidos em toda a Europa, com Hugo Pratt (falecido em 1995) e Paolo Eleuteri Serpieri. Famoso pelas suas bandas desenhadas onde é forte o pendor erótico, Manara depois de estudar arquitetura e pintura, estreou-se no mundo da BD em 1969 com a obra Genius um conto noir sensual e sombrio na linha e séries como Kriminal e Satanik. Trabalhou para publicações menores (Jolanda, revista de arte soft core, e a revista satírica Telerompo) até ter sido convidado pelo "Il Corriere dei Ragazzi” para trabalhar com escritor Mino Milani. A primeira história dos dois chamava-se "HP e Giuseppe Bergman", de 1983. A sigla "HP" é a abreviação do nome de um grande amigo dos dois, Hugo Pratt. Mas Bergman, o alter-ego do autor, já havia sido criado por Manara cinco anos antes, para a revista francesa “À Suivre”. Mas penso no entanto, que o autor só passou a ter uma extraordinária divulgação na Europa (curiosamente não em Itália), especialmente depois das edições internacionais dos álbuns de “Il Gioco”, iniciados em 1983 – “O Clic” na edição portuguesa da Asa.
Muitas das obras de Manara foram editadas em Portugal (mas não todas), desde “O Homem de Papel”, pela Meribérica no início dos anos de 1980, até aos quatro volumes de “Os Bórgia”, com argumentos de Alejandro Jodorowski, pela Asa em 2011. Seguiu-se agora “Caravaggio – O Pincel e a Espada”, lançado pela nova editora Arte de Autor, no Museu Lisboa, Palácio Pimenta, no passado dia 14. Penso no entanto, que as pranchas de Manara, agora com 70 anos, perderam, como será natural devido ao avanço da idade, a frescura, a sensualidade e a dinâmica das primeiras obras, no início dos anos de 1970, tornando-se (pelo menos em “Os Bórgia” e nas pranchas que já vi deste novo álbum) talvez mais estruturadas, mas muito menos sensuais e também um pouco mais estáticas.
A história deste “Caravaggio…” é fundamentalmente uma interpretação da biografia do pintor Michelangelo Merisi da Caravaggio (1571 – 1610) que, numa carreira que durou apenas dez anos, realizou obras em Roma, Nápoles, Malta e Sicília, entre 1600 e 1610. É normalmente identificado como um pintor barroco, estilo do qual foi o primeiro grande representante. Contudo o realismo pioneiro de Caravaggio, é reforçado pelo embate metafórico entre luz e trevas, o chiaroscuro que o tornou célebre. Já agora, Caravaggio era o nome da aldeia natal da sua família, no ducado de Milão, onde seu pai, Fermo Merisi, era administrador e arquiteto-decorador do marquês de Caravaggio. Tinha apenas seis anos quando a peste bubónica matou praticamente todos os homens da sua família, incluindo o pai. O jovem cresceu forjando um temperamento puxado à violência e de instintos agressivos.
A vida deste pintor tem desafiado historiadores de arte, biógrafos, críticos e depois cineastas, durante quatro longos séculos. Muitos livros foram escritos a seu respeito que, a despeito de suas telas construídas com grande sensibilidade, se tornou num homem violento que, por exemplo, andava sempre com uma faca no cinto, pronto a sacá-la a qualquer provocação. Pensa-se que Caravaggio seria talvez bipolar e também homossexual, mas ninguém pode ter a certeza disto. Gentil com prostitutas e marginais, era temperamental e capaz de hostilizar os seus protectores do clero, provocando a sociedade ao ponto de morrer sozinho e doente, aos 38 anos, em Porto Ercole – uma pequena ilha a norte de Roma – em circunstâncias desconhecidas.
Foi o lado de aventureiro irresponsável, zaragateiro e beberrão que parece ter despertado o desejo de Milo Manara em retratar o pintor em banda desenhada. Este primeiro volume cobre a vida de Caravaggio desde a sua chegada a Roma, em 1592, até 1606, quando, aos 35 anos, foge da cidade escondido numa velha carroça, depois de matar a golpes de espada Ranuccio Tomassoni, um jovem que tinha sido seu modelo, constando que o fez para afirmar a sua virilidade.
Manara usa excertos das biografias escritas pelos ingleses Andrew Graham-Dixon (Caravaggio: A Life Sacred and Profane) e Helen Langdon (Caravaggio: A Life) – entre eles há também a história da Virgem morta (uma prostituta que teria posado como mãe de Cristo na tela “A Morte da Virgem”, hoje no Museu do Louvre).
Apenas em 2010 uma equipa de cientistas e universitários italianos do "Comité Caravaggio" pôde anunciar a identificação dos restos mortais do pintor, graças a análises de DNA e de carbono-14, no pequeno cemitério de Porte Ercole. A probabilidade de certeza desta descoberta, divulgada pelos pesquisadores, é de 85%.
Esperemos agora pelo segundo volume deste Caravaggio de Manara.
Milo Manara
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