NOSTALGIA (5)
O REGRESSO DE "ULISSES" (2)
por José Batista
Não era muito claro, em meados da década de 50, quem na realidade detinha os direitos de propriedade dos originais das ilustrações fornecidas às editoras. Na utilização de material importado, tal questão não se punha, pois os representantes dos sindicatos – empresas detentoras dos "copyrigths" – forneciam sempre uma cópia das ilustrações encomendadas, e nunca os originais. Com os desenhadores portugueses, o caso era diferente. Ajustado com o editor o preço da ilustração, ignorava-se se a quantia estipulada se cingia a uma ou mais publicações, e se o direito artístico da mesma e a posse do original – papel, cartolina ou outro material, onde era executada – seriam também sua propriedade.
Não estando clarificados, entre o autor e o editor, os limites dos direitos cedidos e adquiridos, os originais, uma vez utilizados, eram devolvidos pelas tipografias às editoras que os arquivavam como se os mesmos lhes pertencessem. Esta uma das razões pela qual os ilustradores portugueses têm tão poucos originais seus, pois tal indefinição inibia os autores de os reclamarem, uma vez utilizados. Por outro lado, só excepcionalmente os editores desenvolviam os originais portugueses que publicavam, isto especificamente na área da ilustração.
Outra, para além das causas acima indicadas, seria o apetite que tinham pelas ilustrações alguns funcionários das gráficas onde as publicações eram impressas, pois não sendo muitas delas devolvi¬das às editoras, se tal não fosse expressamente exigido.
Mas haveria de facto indefinição nos direitos que a lei reconhecia a ambos, autores e editores?
Na área da banda desenhada, em Portugal, talvez erroneamente tida por arte menor por ser apreciada maioritariamente por crianças e adolescentes, nada que se saiba foi legislado que balizasse direitos e deveres.
Essa ausência de legislação originou um nebuloso critério o qual permitia supor que, uma vez paga a ilustração, o editor a poderia publicar quantas vezes necessitasse, considerando também como suas a propriedade artística e o suporte gráfico – os originais – dos mesmos.
Verdade que, se excepções houve, estas ficaram a dever-se mais a factores fortuitos, que à sua espontânea e voluntária devolução.
Além disso, o arquivar, ano após ano, os materiais já publicados – especialmente numa editora com imensas publicações, como era o caso da Agência Portuguesa de Revistas – requeria um espaço enorme, como deve calcular-se.
Vez por outra, os arquivos com meia dúzia de anos ou mais eram considerados como monos dispensáveis, pouco se cuidando de saber o que na realidade se inutilizava. Foi por mero acaso que no rescaldo de uma dessas "operações de limpeza", num monte de papéis destinados à "venda a peso", encontrei, entre eles, os meus originais do "Ulisses", assim como outros de Vitor Peon, que recolhi.
Havia de facto muita inconsciência e desrespeito pelos originais desnecessariamente não devolvidos. Alguns chegaram mesmo a ser queimados... mas nunca devolvidos aos seus autores!
Os de "Ulisses", regressaram às minhas mãos casualmente, mais de dez anos depois de publicados, apenas porque o pacote onde estavam arquivados, esperando o transporte que os levariam para reciclar, se rasgou, libertando os originais mesmo junto aos meus pés.
Há perto de quatro décadas que me acompanham. É com imenso prazer que, revistos, são novamente dados à estampa, como se Ulisses, liberto de Circe, de novo regressasse aos braços de Penélope!
Ao fim e ao cabo, – até os "heróis" de papel –, como tudo na vida, têm a sua história!
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Agradecemos a Jobat o envio das imagens
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