O CICLO DO OUTONO
Publicado na Gazeta das Caldas, a 28 de Outubro de 2012
Com a chegada benfazeja das chuvadas da última semana, dei por mim – que, na anterior, me consolara com temperaturas de ar e água algarvias – a pensar que entrámos no ciclo do Outono.
É a época das castanhas, cuja importância na dieta alimentar dos portugueses foi enorme.
Vêm aí as padiolas das castanhas assadas, o São Martinho, qualquer dia o Natal, que se avizinha pobrezinho e triste, mas antes os Santos e os Fiéis Defuntos que hoje se comemoram juntos.
Padiola das castanhas assadas em 1966...
... e actualmente.
Dei por mim a revisitar “As Festas e Comeres de Portugal”, que Maria de Lourdes Modesto escreveu com Afonso Praça e que Nuno Calvet fotografou, edição da Verbo.
Por isso – também por razões de vizinhança – lembro que na região de Óbidos, onde se diz que no Dia de Todos‑os‑Santos “andam os defuntos pelo mundo”, é costume as crianças andarem em grupo a pedir o pão‑por‑Deus, levando cada uma o seu saquinho, onde recolhem o que lhes dão.
Peditório do Pão por Deus...
Ao que parece e, segundo a tradição, se nada lhes dão, afastam-se dizendo: ”Pão por Deus!, um pau pelas costas, livre-nos Deus”.
As broas da Columbeira, Bombarral, que se dão às crianças que andam a pedir, chamam-se pão por Deus.
Perto do Cadaval, também na região do Oeste, há quem dê uns pãezinhos de farinha triga, a que chamam brindeirinhas [de brinde...] ou merendeirinhas [de merenda...].
Como curiosidade refiro haver quem coloque as broas sobre folhas de figueira ou de couve para as levar ao forno.
São muitas as receitas e os ingredientes que compõem as broas dos Santos e em todas marca presença a erva doce, uma das aromáticas mais utilizada na doçaria popular do nosso país.
Estas práticas à volta dos Santos e dos fiéis defuntos não se circunscrevem ao início do ciclo do Outono. Estão ainda presentes no seu final!
Os costumes e práticas de Natal associam-se à evocação dos defuntos.
As visitas aos cemitérios é costume assente no Alto Minho, na véspera da consoada, assim como a crença de que os “mos maiorum” vão estar em espírito durante a ceia.
Como ensina o Prof. Francisco Sampaio, figura ímpar entre os gastrónomos portugueses, juiz da Confraria dos Gatrónomos do Alto Minho e presidente que foi da então Região de Turismo do Alto Minho, ”daí o lugar vago na mesa a recordar o falecido mais recente, assim como o deixar a mesa de consoada noite dentro com todas as iguarias, para que as alminhas tivessem uma ceia melhorada em dia de Natal”.
Ao alinhavar este texto, assaltaram-me algumas das recordações de infância e lembrei-me de uma prática comunitária a que, ainda miúdo, assisti da janela do meu quarto, em Faro, em noite de S. Martinho.
Como recordarão os mais velhos, na década de 50, proliferavam as tabernas, na sua “tripla” função de fornecedora de carvão, vinho e algum “petisco” para facilitar a bebida.
Taberna típica, com o seu balcão de mármore e os emblemáticos "copos de três"...
Cartaz dos anos 30 e... Salazar até dava o exemplo, claro....
João Reboredo
______________________________________________________________
______________________________________________________________
POR CAUSA DO SR. HERCULANO
Publicado na Gazeta das Caldas, a 10 de Novembro de 2012
A propósito do meu texto sobre as caldeiradas e sobre a do António da Barbuda (talvez a mais famosa do séc. XIX), cuja receita, então, deixei, na versão de Júlio César Machado sublinhei o imperativo de utilizar o azeite do Sr. Herculano.
Alexandre Herculano de Carvalho Araújo, nasceu em Lisboa em 1810.
Em 1837 assumiu a responsabilidade da redacção do Diário do Governo, nesse tempo um jornal de suporte ao partido no poder.
Em 1839 foi nomeado, por iniciativa do rei D. Fernando, para dirigir a Real Biblioteca da Ajuda e das Necessidades, tendo conservado esse cargo quase até ao fim da vida.
Em 1840 chegou a passar pelo Parlamento, eleito pelo círculo do Porto, como deputado do Partido Cartista, mas as manobras partidárias enojavam-no e sentia dificuldade em falar em público.
Foi-se afastando da actividade política e dedicando-se à literatura. Nos anos seguintes publicou romances de ambiente histórico e inicia da publicação da História de Portugal.
Viveu os últimos 10 anos da sua vida (até 1877) na Quinta Vale dos Lobos, em Santarém. Aí criou a marca “Azeite Herculano”, de baixa acidez, que recebeu prémios internacionais. O primeiro foi-lhe atribuído em 1876 e mais tarde nas exposições internacionais de Anvers 1894 e de Paris 1889.
Alexandre Herculano em Vale de Lobos
Desde as civilizações antigas mediterrânicas que o azeite é utilizado não só como alimento, mas também como produto básico na medicina tradicional, na higiene, e na beleza (no Egipto 5000 anos AC.).
A oliveira é uma árvore originária na da Ásia menor (Turquia) que teve um crescimento espontâneo nas zonas do mediterrânicas.
A oliveira chegou à Grécia na variedade cultivada, consagrada à deusa de Atenas e tornada símbolo de sabedoria, abundância e paz.
Vários historiadores atribuem aos romanos a responsabilidade do início do cultivo da oliveira na península ibérica.
Há um ditado popular que diz: “A melhor cozinheira é a azeiteira” e os livros de receitas tradicionais portuguesas comprovam-no. Utilizado em cru (como tempero), em cozinhados (como ingrediente), bem quente (como meio de cozedura) ou a frio (como agente conservador), marca presença na cozinha.
Faz parte dos hábitos das regiões mediterrâneas e está presente em boa parte de nossa história.
A dieta mediterrânica é um dos padrões alimentares mais saudáveis do mundo, na qual abundam alimentos de origem vegetal, cereais, legumes e frutos, a carne é consumida com moderação, preferindo-se o peixe e ovos.
Vários estudos provam que o azeite é um elemento fundamental da “dieta mediterrânica”.
João Reboredo
______________________________________________________________
As ilustrações e respectivas legendas, são da responsabilidade do Kuentro.
______________________________________________________________
Sem comentários:
Enviar um comentário