NONA ARTE
MEMÓRIAS DA BANDA DESENHADA
(LXXI – LXXI-A)
O Louletano, 6 de Setembro de 2005
A PAIXÃO DE ROUSSADO PINTO (2)
Por Manuel Caldas
A evolução da revista seria grande, mas esse primeiro número apresentava já todas as características, boas e más, que a marcariam até ao último da primeira fase: histórias aos quadradinhos antigas e modernas, de vários países, reedição de material já publicado em Portugal, a presença de Eduardo Teixeira Coelho e de Jesus Blasco, a referência destacada aos nomes dos autores das histórias (a partir do número 5, duas páginas passariam mesmo a ser preenchidas com uma rúbrica, a 9ª Arte, destinada a dar a conhecer os autores de banda desenhada, preocupando-se em especial com mostrar as fotografias deles), a ausência de material realizado exclusivamente para as suas páginas, espaço para novelas ilustradas e mesmo para a poesia (de Raul Correia), um colorido fraco, uma legendagem mecânica, muitas gralhas e, coisa banal na época, um considerável desrespeito pela forma original das pranchas publicadas (geralmente acrescentando-se-lhes espaço na parte de cima das vinhetas, o que permitia introduzir texto, naturalmente redundante). E havia, claro, o contacto com o leitor, a preocupação de lhe falar dos projectos, de lhe chamar a atenção para a qualidade do que se publicava, de o entusiasmar.
No começo a revista era ainda pequena, de facto, mas logo no número 5 passou a ter mais oito páginas, no número 44 a separata dedicada ao futebol foi substituída por um suplemento de banda desenhada "para as meninas", A Formiga, de quatro pequenas páginas, e a partir do número 50 passou a incluir um poster do tamanho de quatro páginas dedicado ao mundo do desporto e do espectáculo.
Claro, a certa altura a revista já era grande demais para continuar a custar os mesmos 5$00 e foi necessário subir de preço. Assim, com o número 64, o Jornal do Cuto passou a custar 7$50, mas o seu director aproveitou para o tornar maior: mais oito páginas, que, destacadas, formariam o volume "Selecções Jornal do Cuto".
Foi por esta altura, no final de 1972 ou início de 73, que a revista chegou mesmo a ter publicidade na televisão.
E o director quem era?
UM DIRECTOR APAIXONADO
Não é possível falar com profundidade do Jornal do Cuto sem falar do seu fundador, director e único responsável. E que o nome de Roussado Pinto, que foi trabalhar para O Mosquito ainda menor de idade, está associado a imensas publicações periódicas de inúmeros géneros, do final dos anos 40 ao início dos 80, distinguindo-se por um trabalho intensíssimo e um talento que se apercebe grande mas que quase sempre sacrificou à quantidade do que fazia. A "mão" de Roussado Pinto reconhecia-se em tudo em que pousava, mas no Jornal do Cuto mais do que em qualquer outra publicação. E que a revista era publicada pela editora que ele fundara havia pouco, a Portugal Press, e era feita como ele queria, sem ter de prestar contas a ninguém a não ser ao leitores. Como tal, nela se reflectiram as suas virtudes e defeitos, o seu carácter e a sua formação: uma inquietação e alguma insatisfação, que levariam às várias mudanças físicas da revista; um entusiasmo desmedido pelo que fazia, que se espelhava na forma como anunciava as coisas; uma grande generosidade, que o obrigava a querer dar sempre mais pelo preço que custava a revista e até a prometer mais do que o que depois conseguia concretizar; uma sensibilidade artística e um gosto ambíguos, que o impeliam tanto a glorificar o talento dos autores que publicava – e mesmo de outros que não publicava – e a chamar a atenção para os seus defeitos, como a alterar a forma original dos seus trabalhos.
(Continua...)
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O Louletano, 13 de Setembro de 2005
A PAIXÃO DE ROUSSADO PINTO (3)
Por Manuel Caldas
TRANSFORMAÇÕES
A certa altura, com problemas de distribuição, Roussado Pinto resolveu que seria a sua própria editora a fazer aquele trabalho. Como uma tal actividade seria semanalmente empreendimento exagerado para uma editora pequena como a Portugal Press, o Jornal do Cuto tornou-se mensal a partir do número 94, de 1 de Maio de 1973, com 68 páginas, mais as destacáveis com A Formiga e o quadro da História de Portugal, além do poster, agora dedicado às capas dos números 1 de publicações de banda desenhada. O preço passava a ser de 15$00 e a revista a incluir principalmente, para insatisfação de Roussado Pinto mas para agradar aos leitores, histórias completas. De qualquer modo, o material escolhido por ele continuou a ser do mesmo género e a revista manteve-se igualmente interessante, apesar de perder o suspense que providenciavam as numerosas histórias em continuação.
A experiência de distribuição própria não resultou e em 1 de Abril de 1974, com o número 105, o Jornal do Cuto voltou a ser distribuído, como o fora no primeiro ano e meio da sua vida, pela Agência Portuguesa de Revistas. E voltou também a sofrer transformações, passando o leitor a lucrar: tornou-se quinzenal, ainda que reduzindo em dezasseis o número de páginas. Nesse número o habitual poster foi substituído pelo fac-símile do primeiro número d'O Mosquito (vindo a ser incluído no número 108 o fac-símile do segundo número), por iniciativa do ilustrador José Batista, chefe de redacção do jornal desde 1972. A publicação de tais separatas são uma prova perfeita não só da paixão de Roussado Pinto por aquele célebre jornal infantil como da sua generosidade.
A 25 Abril de 1974 deu-se a revolução, mas os novos tempos cheios de promessas não foram bons para o Jornal do Cuto, pois com o número 109, de 1 de Julho desse mesmo ano, a revista suspendeu a publicação (apesar de no número anterior anunciar para o próximo "uma surpresa que iria deixar todos os leitores varados"). O seu director despedia-se falando de grandes prejuízos, de aumentos do custo de papel e oficinais superiores a 120 % (pelo que, para continuar a publicar-se, o Jornal do Cuto teria de passar de 15S00 para 33$00). Lembro-me perfeitamente da impressão de desgraça que aquilo provocou em mim, ao antever já o fim certíssimo das duas outras revistas que então acompanhava, o Tintin e o Mundo de Aventuras. Mas, estranhamente, e felizmente, ambas continuaram a sair, e com o mesmo preço durante meses. E o aumento que acabaram por ter não foi de modo algum superior aos que, regularmente, sempre haviam tido.
(Continua...)
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O PERRO NEGRO em A MORTE DA ÁGUIA
(2 e 3)
Benoit Despas (arg), José Pires (des)
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