quarta-feira, 27 de agosto de 2014

BDpress #428 (recortes de imprensa sobre BD): O NOVO FILME DE FRANK MILLER E ROBERT RODRIGUEZ SIN CITY – A DAME TO KILL FOR (MULHER FATAL) – ESTREIA AMANHÃ (1)


O NOVO FILME 
DE FRANK MILLER E ROBERT RODRIGUEZ
SIN CITY – A DAME TO KILL FOR
(SIN CITY – MULHER FATAL)
ESTREIA AMANHÃ (1)

ATUAL – Expresso, 23 de agosto de 2014 (1)

APOCALIPSE DO FILME NOIR
Texto: Francisco Ferreira

Após nove anos de espera, Frank Miller e Robert Rodriguez dão seguimento a "Sin City – Cidade do Pecado" e regressam com um segundo tomo em 3D não menos portentoso e vibrante. Chama-se "Sin City – Mulher Fatal”.

Recapitulamos rapidamente a história: há nove anos, Robert Rodriguez desafiou Frank Miller a passar para cinema a BD de sua autoria "Sin City", uma das mais expressivas do final do século XX (foi iniciada em 1991) e alvo de culto imediato no segui­mento da obra máxima do seu autor ("The Dark Knight Returns", de 1986). Em 2005, quando "Sin City: Cidade do Pecado" che­gou às salas, o Expresso recordou a génese e a história dessa BD num artigo de João P. Boléo. No universo degradante, aflitivo e muito negro de "Sin City", profundamente influen­ciado pelo film noir de Hollywood dos anos 40 e 50, nesse calabouço em que a Huma­nidade se perde para lá da ética, da moral e das regras da dramaturgia, as obsessões das personagens de Miller estavam dentro dele. Tinha as pranchas à sua frente, mas não as imaginava em movimento, nem ouvia ainda as suas vozes. Para Miller, o desafio lançado por Rodriguez representou muito mais do que uma mera adaptação para cinema (ao ponto de ter decidido nesse exato instante tornar-se realizador): foi também uma catar­se e, segundo ele, "a materialização de uma explosão, algo que foi expelido com violência de dentro de mim cá para fora através de ou­tro médium".

Nove anos de espera é muito tempo. Há duas semanas, numa breve entrevista tele­fónica entre Lisboa e Los Angeles (dez mi­nutos cronometrados ao segundo) a que ti­vemos direito, perguntámos a Miller porque tardou tanto a aparecer "Sin City: Mulher Fatal". "Nós estávamos prontos a arrancar com o segundo filme logo em 2005, mas queríamos enfrentar um desafio técnico superior.
O Robert já pensara então no 3D, mas estou a falar-lhe de um tempo em que ainda só havia duas salas de projeção em 3D nos EUA. Decidimos esperar. E como isto mudou entretanto... Nos últimos anos, a tec­nologia avançou a um ponto tal, deu um tal passo de gigante, que se aproximou dos nos­sos desejos." Para Miller, aceitar o 3D não foi fácil. Ele cresceu a desenhar, a devorar novelas de Mickey Spillane e de Raymond Chandler e, nos últimos anos, teve más ex­periências com os filmes em 3D que viu (até disse ter saído da sala a meio de "O Cava­leiro das Trevas Renasce", último filme de Christopher Nolan). "É verdade que tive ex­periências péssimas com os filmes em 3D de Hollywood. Acho-os sempre forçados e qua­se todos horrorosos. Parece que são feitos para o 3D em vez de se servirem dele. Para mim, que sou avesso a modas, o 3D signifi­cava ver uma data de coisas a voar, e eu não tenho nada disso nas minhas pranchas. Nem dinossauros, nem aliens. Foi o Robert, uma vez mais, que me levou a aceitar o 3D como um processo artístico.

Convenceu-me que com o 3D nós podíamos realçar alguns as­pectos da história. Por vezes, são só detalhes gráficos que despertam a atenção do espec­tador e que podem fazê-los pensar noutras coisas. E convenceu-me de que podíamos manter um registo sóbrio, sem espalhafato, que se mantivesse fiel ao que desenhei. Mo­destamente, acho que o conseguimos."

Há muitas novidades entre um filme e outro, mesmo se "Sin City: Mulher Fatal" recupera grande parte das personagens da obra matriz: o tremendo Marv, que não tem medo de coisa alguma (Mickey Rourke), Gail (Rosario Dawson), também Nancy Callahan (Jessica Alba), a protegida de Marv que ago­ra descobrimos mais angustiada que nunca, a ganhar a vida numa pista de striptease — a história da personagem dela no novo filme foi escrita de raiz sem ter passado pela BD. Outro aspeto de "Sin City: Mulher Fatal" é que é atraído como um íman para a 'má da fita', a mulher fatal do título, um furacão chamado Ava Lord (que recorda, como não?, certos papéis de Ava Gardner), desempenho genial de Eva Green a servir uma persona­gem tão maléfica que quase se pode dizer que ela encarna todos os pecados capitais (e "não há justiça sem pecado", reza o cartaz...).

Também houve perdas, com a morte dos atores Brittany Murphy (que fazia de Shellie) e Michael Clarke Duncan (que fazia de Manute), este último substituído por Dennis Haysbert. Especialista a infligir a dor, Manute é o motorista, guarda-costas e pau para todo a colher de Ava Lord, esperando-o um combate de antologia com Marv. Também houve trocas de atores: a de Clive Owen por Josh Brolin (já que o filme se passa antes da cirurgia plástica da personagem de Dwight McCarthy) e a de Michael Madsen por Jeremy Piven. Outra personagem, Johnny, ori­ginalmente pensada para Johnny Depp (que não pôde aceitar o papel), foi parar a Joseph Gordon-Levitt, e a sua história é de partir o coração, segundo Miller: "Ele é um daque­les tipos que julga que pode enganar toda a gente, basta-lhe atirar uma moeda ao ar. Eu adoro personagens assim. Mas, no fundo, Johnny só pensa nele próprio. Está obcecado com a sua persona. Decide que vai enfrentar Roark e vencer um homem mais poderoso do que ele, mas repete um erro que não se pode repetir: e esta é uma lição para a vida!"

Não vamos continuar a apontar diferen­ças entre o primeiro filme e o segundo, mas há que dizer mais uma coisa: "Sin City: Mulher Fatal" é uma obra bastante mais entro­sada do que a anterior, com duas histórias paralelas que não se dividem na narrativa tal como se dividiam no primeiro filme. Pa­rece-nos que a essência 'thrillesca' ganha bastante com isso. Também perguntámos a Miller como é que o trabalho de realização é dividido no set, e ele respondeu como os ir­mãos Coen: "Não partilhamos, tomamos as decisões juntos. Nem sei como se podia fazer um filme de outra maneira. Chegamos intui­tivamente ao que queremos e separamos o que está a funcionar do que está errado. É claro que eu não percebo grande coisa de 3D, e o Robert neste terreno está como peixe na água. Mas ele está sempre a 'enganar-me'. Nos anos 90, andava o cinema longe da mi­nha cabeça, eu dizia a mim mesmo que, se havia uma BD minha que jamais poderia ser adaptada ao cinema, era 'Sin City'. Mas de­pois apareceu o Robert Rodriguez."

Outro aspeto comum às obras de Miller, e em particular a "Sin City", é uma atração pela violência e pela luxúria — em sintonia com a memória do film noir. Basin City é uma cidade infernal, um poço sem fundo que não procura a verosimilhança com a reali­dade. Perguntámos ao autor porque é que o seu universo criativo tem de ser tão negro, se no seu trabalho também existe espaço para sentimentos mais nobres, como a luta pela dignidade, por exemplo. Miller conclui: '"Sin City' é atravessado por um grande tema: a vingança. Toda a gente se quer vingar de al­guém ou de alguma coisa, exceto Marv, que sofre de súbitos ataques de crise e reage ins­tantaneamente ao que lhe acontece, sem per­der tempo. As minhas personagens existem nesse mundo de violência e luxúria mas não deixam de ser humanas. Aliás, eu acho que o que elas procuram, já desesperadamente, é uma réstia de humanidade. Uma humanida­de presa por um fio mas que ainda sentimos que está lá.

No fundo, elas também choram, também ficam com o coração despedaçado. Muitas vezes, por amor."


O "puritanismo" americano...


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