NONA ARTE
MEMÓRIAS DA BANDA DESENHADA
(XCVIII - XCVIX)
O Louletano, 9 de Julho de 2007
O ARTISTA, O MESTRE, O COMPANHEIRO, O AMIGO - 19
Recordações de Tertúlia confidenciadas por José Ruy
» Por volta de 1953 quando estavam em publicação os jornais infantis «O Mosquito», «O Cavaleiro Andante» e o «Mundo de Aventuras», saiu uma lei que obrigava as publicações do género a incluírem o mínimo de 70% de colaboração portuguesa. O normal era a inclusão de 90% de material estrangeiro. Os directores destes jornais foram logo a quem de direito expor que não era possível cumprir a lei, por falta de artistas portugueses com nível para tal proporção de trabalho. No «Mosquito» estava o Eduardo T. Coelho; no «Cavaleiro Andante» o Fernando Bento e no «Mundo de Aventuras» o Victor Peon. E pronto! Não havia mais ninguém. Foi-nos contado isto por um amigo que estivera nessa reunião, e como é natural, ficámos fulos com esta maneira simplicista de resolver o problema. E começámos a reunir «peças». Desenhadores já com um certo nível, naturalmente que havia. Para escrever argumentos também. E a partir daí, começámos a pensar em fazer um jornal infanto-juvenil só com colaboração portuguesa, e com nível.
A oficina que tinha sido do «Mosquito» na Travessa de S. Pedro, encontrava-se parada, pois estava alugada à redacção do «Camarada», publicação suspensa na altura. O jornal «O Mosquito» com a partida do Cardoso Lopes para o Brasil estava a fazer-se noutra oficina, dirigido só pelo Raul Correia, na Editorial Organizações.
Pensámos pôr essa antiga oficina do «Mosquito» a funcionar de novo... As cores continuariam a meu cargo, executadas nas chapas de offset pelo sistema litográfico. Como colaboradores literários dispúnhamos do Padinha, do Orlando Marques e do Lúcio Cardador. Para a parte artística contávamos com uma boa equipa que já estava a dar mostras de um bom nível: Fernando Bento, Victor Peon, Fernandes Silva, Victor Silva, José Garces, Artur Correia, o Coelho e eu. Claro que à partida não tínhamos contactado com outros elementos literários, devido à sua vinculação em publicações no activo, como Roussado Pinto, Simões Muler, Raul Correia, Artur Varatojo...
Como não tínhamos dinheiro, fomos à redacção do «Camarada» expor a ideia. »»
"Peregrinação de Fernão Mendes Pinto". Tira da história inédita, desenhada por Eduardo Teixeira Coelho especialmente para a 1ª exposição portuguesa de histórias aos quadradinhos e ilustração infantil, em 1952.
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O Louletano, 16 de Julho de 2007
O ARTISTA, O MESTRE, O COMPANHEIRO, O AMIGO - 20
Recordações de Tertúlia confidenciadas por José Ruy
» Fomos bem recebidos na redacção do «Camarada», tanto mais que nos propúnhamos anular o prejuízo que a oficina causava estando parada. O E.T. Coelho mostrou os originais das ilustrações para os contos de Eça de Queiroz que maravilharam os responsáveis, que como não liam «O Mosquito» não conheciam ainda o trabalho. Discutiu-se o nome do jornal, e ficou assente que se chamaria «O Lidador». Diziam eles que seria uma réplica ao «Cavaleiro Andante».
Concordámos, pois era um nome que soava bem. Umas semanas mais tarde mudaram de opinião, e resolveram sair com a 2ª série do «Camarada» nuns moldes idênticos aos da 1ª série.
capa do nº 1 - 2ª série - do "Camarada"
Quantas vezes tenho pensado como este «Lidador» teria alterado a posição das publicações infanto-infantis em Portugal... se tivesse chegado a sair. Nós pensámos criar uma espécie de cooperativa. Os lucros que a publicação tivesse, a partir de pagas as despesas, seriam equitativamente distribuídos por todos os colaboradores. Isto dava um enorme incentivo para que cada um se aperfeiçoasse o mais possível no seu trabalho, pois estávamos directamente interessados no êxito da revista.
Poucos meses passados, e porque «O Mosquito» já tinha também suspendido a sua publicação, tentámos ressuscitá-lo pela mesma forma. Agora, seria um jornal mais modesto em formato e número de páginas: 15x21 cm., a três cores, trabalho manual, com oito páginas, custando uma moeda de 50 centavos, moeda mágica que tinha sido, uma dezena de anos antes, utilizada pelo Cardoso Lopes... Nesta altura, o E. T. Coelho estava a decidir o seu futuro nesta terra. Para esta iniciativa, chegou a criar desenhos que se têm mantido inéditos até hoje. Uma pequena história d'O Mosquito a dar uma lição a um urso lambareiro, no seu estilo cómico tão fresco e cheio de movimento expressivo. Também para esse «Mosquito», ele concebeu e realizou «Marina e o Papagaio» mais tarde publicada pelo nosso amigo Roussado Pinto no Fomento de Publicações, em álbum.
Mais uma vez esta tentativa se gorou. E o E. T. Coelho partiu...
Esta pequena história inédita de E.T.C, destinava-se a meia página e os textos eram os seguintes: Título - «Para quem gosta de coisas doces». 1 - «Terás um bolo enorme e doce como tu nunca provaste!». 2 - «Têm amêndoas, passas, chocolates, cremes...». 3 - «Supõe-te a comer grandes fatias, doces como mel e até me sinto mal ao contar-te isto!» 4 - «Mas para isso tens que comer a sopa primeiro e comê-la toda!»
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