quarta-feira, 23 de novembro de 2016

«O Mosquito» e «Chicos» - AS PUBLICAÇÕES INFANTO-JUVENIS QUE ABALARAM A PENÍNSULA IBÉRICA (7) – por José Ruy

AS PUBLICAÇÕES INFANTO-JUVENIS
QUE ABALARAM A PENÍNSULA IBÉRICA

«O Mosquito»
«Chicos»

(7)

Por José Ruy

GUERRA E SONHO

Recordo as condições dramáticas que existiam em Espanha e as dificuldades porque passava a equipa de «Chicos» para pôr na rua esse semanário a horas certas.
Em 1937 um ano antes de ter surgido «Chicos» aconteceu uma tragédia na Cidade de Guernica. Foi bombardeada e arrasada.
Pablo Picasso fez uma pequena história em quadrinhos numa homenagem a este tipo de grafismo, e a denunciar o bárbaro acontecimento, antes de pintar o grande quadro que ficou célebre.


Picasso deu-lhe o título de «O Sonho e a Mentira de Franco». 
Estes originais encontram-se na Hayward Gallery de Londres. 

Claro que esta história não foi publicada no «Chicos» mas é uma curiosidade pelo facto de ser uma narrativa gráfica do grande pintor e desenhador espanhol, que se enquadra no ambiente de guerra vivido na altura.

«Chicos» conseguia manter o Sonho por sobre o ambiente dantesco e hostil, mesmo fratricida, num país dividido em dois grupos empenhados em destruir-se, sendo um jornal dedicado aos jovens no meio de um panorama mais desolador do que se possa imaginar.
Os recursos eram mínimos. Consuelo Gil intitulava-se de «Fada Madrinha», pois com uma varinha mágica invisível conseguia o milagre de colocar nos postos de venda, todas as semanas mais um número, como por encanto.


Entretanto em Portugal, numa neutralidade podre, também se sentia o efeito de incerteza quanto à Segunda Guerra Mundial. E as ilustrações criadas por ETCoelho produziam também um salutar Sonho, com figuras que voavam como que libertos da gravidade, em situações mirabolantes acompanhando o estilo das novelas de José Padiña que nunca iria assinar com o seu nome verdadeiro, deixando os leitores sonhando sobre quem seriam os vários autores que os pseudónimos sugeriam.
Estas ilustrações ao serem republicadas também em «Chicos» produziam no país vizinho o mesmo efeito.
Foi este fascínio que prendeu o público a estas duas publicações durante gerações.
A «pedrada-no-charco» produzida com o seu aparecimento em 1936 e 1938 foi mantendo as ondas de choque mesmo com o passar dos anos.
Em Portugal apareciam na redação de «O Mosquito» rapazitos que conseguiam cinquenta centavos devido a algum recado prestado a alguém, e pediam «um Mosquito». --Que número, perguntavam-lhes. -Um qualquer! 
Um exemplar isolado, com histórias que vinham de continuação e continuavam, servia para «sonhar» naquele momento, como um bolo que lhes mantivesse o doce na boca mesmo para além de o terem mastigado.
Mas este era principalmente o Sonho do Tiotónio, Raul Correia e de Consuelo Gil.

AS VÁRIAS PUBLICAÇÕES EDITADAS 
POR «O MOSQUITO» E «CHICOS» 

Em Portugal foi criada a empresa «Edições O Mosquito» e na sua oficina própria imprimiram-se muitas outras
Revistas e jornais, a maioria edições da casa.


  

   

Era inevitável que as aventuras, contos e novelas não tocassem mesmo esporadicamente no aspecto bélico que envolvia o mundo. 

Em Espanha Consuelo Gil, em 1941decidiu criar outra publicação.
Segundo o depoimento de Antonio de Mateo, Consuelo convocou Jesus Blasco, que ela chamava de «chefe do clã Blasco» (Adriano, Alexandro, Pili e ele próprio) e comunicou-lhe:

«Jesus, vamos reduzir o formato de «Chicos», o que representa uma sobra de papel. Isso nos permitirá criar uma revista pequenina, 11x21 cm e gostava de dedica-la a todas as meninas espanholas.
Cria-me uma personagem, uma menina que seja uma espécie de «Cuto» com saias».

Jesus Blasco esboçou de imediato a figurinha graciosa que ficou célebre na Península Ibérica. Em Espanha como «Anita Diminuta» (pelo reduzido formato da publicação) e em Portugal como «Anita Pequenita».


 

«Mis Chicas» começou com o formato do papel economizado das bobinas em que era impresso «Chicos» e depois conseguiu uma dimensão praticamente quadrada.
Mais tarde a revista «Chicas» substituíu a «Mis Chicas».

«O Mosquito» a partir de 1943 iniciou também um suplemento chamado «Formiga» incluindo as aventuras de «Anita» rebaptisada por Raul Correia de «Pequenita».


«A Formiga» tinha também um formato pequeno, metade da dimensão de «O Mosquito» nessa altura, o seu formato de guerra, que podia ser destacável e como se mostra, encadernada. Para o seu logótipo, digamos assim, ETCoelho criou também uma figurinha, uma formiga vestida com saia até aos pés, ao contrário da imagem de Blasco, que tinha saia curtinha.
Este suplemento nunca conseguiu a emancipação pensada. Ficou sempre a fazer parte do interior de «O Mosquito».



Entre as mais de vinte publicações suplementos de «Chicos», por certo a de maior importância foi o mensário «El Gran Chicos». Repare-se num pormenor que não era vulgar ver-se, a assinatura de Blasco a duas cores.

«CHICOS» E A MÚSICA 

E já que falo na rubrica de Blasco conto uma curiosidade.
Jesus Blasco sempre adicionou à sua assinatura uma nota de música. Não só eu como outros colegas em Portugal interrogávamo-nos do porquê, e do seu significado. Quando em maio de 1984, alguns de nós nos deslocámos a Barcelona à «Feria del Comic», o Eugénio Silva, o mais curioso de todos, não resistiu a perguntar o significado da nota musical. 
Blasco explicou que era o som que fazia a folha de papel onde acabara de desenhar mais uma página a afastar-se rapidamente para a gráfica, iniciando de imediato uma nova. Era o silvo produzido pela deslocação.
Isso correspondia à velocidade com que trabalhava. Mas se todos os seus colegas de «Chicos» rubricassem com notas de música, cada número das muitas edições de «Chicos» formaria uma verdadeira partitura.

Mas afinal esta sugestão não andará muito longe da realidade, pois «Chicos» teve mesmo um programa radiofónico,
«15 Minutos de Rádio». Ia para o ar aos sábados às 21 horas, no Rádio Madrid.
Dramatizavam histórias que saíam no «Chicos» e foi aí que estrearam o hino «Montañeros», a primeira canção de «Club de Chicos» entre outras canções, com música composta pelo marido de Consuelo, Jose Maria Franco, com letra de J. Fez Gomez.


Consuelo Gil também fazia poemas que seu marido musicava.
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Próximo artigo: 

Quanto ganhavam os Colaboradores. 

Por José Ruy

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