quarta-feira, 31 de agosto de 2011

BDpress #285: AS AVENTURAS DE FERNANDO PESSOA, UMA BANDA DESENHADA DE MIGUEL MOREIRA E CATARINA VERDIER – ENTREVISTA COM OS AUTORES

De vez em quando, durante uma qualquer pesquisa na internet damos de caras com algumas coisas com interesse em blogues que não conhecíamos. Esta entrevista com os autores da biografia em BD de Fernando Pessoa, no blogue http://blog.umfernandopessoa.com/ é um achado. Aqui fica, com a devida vénia aos autores do blogue, como recorte.

in Blogue “Um Fernando Pessoa”, Agosto 15, 2011


ENTREVISTA COM MIGUEL MOREIRA 
E CATARINA VERDIER

Temos o prazer de apresentar uma entrevista com os autores do blog "As Aventuras de Fernando Pessoa" - um projecto que está a elaborar, há já alguns anos, uma biografia de Fernando Pessoa em formato BD. Miguel Moreira (M.M.) faz os desenhos, Catarina Verdier (C.V.) trata da cor.

O que são "As aventuras de Fernando Pessoa" e o que cada um de vocês traz para o projecto?

M.M.: “As aventuras de Fernando Pessoa, Escritor Universal…” é uma introdução à vida e à obra de Fernando Pessoa. É também uma história, a história de uma personagem chamada Fernando Pessoa, neste caso uma personagem de banda-desenhada, que vive aventuras, como é típico nas bandas-desenhadas mas não obrigatório. O subtítulo desta história lança alguma luz sobre a natureza das aventuras desta personagem e a capa do álbum, tal qual está projectada, ilustrará outro aspecto dessas aventuras: a personagem encontrar-se-á flutuando sozinha no espaço sideral.

C.V.: O Miguel faz a história e os desenhos, eu faço a cor. Para mim “As Aventuras de Fernando Pessoa” é uma banda-desenhada que vai permitir mostrar aspectos da vida de Fernando Pessoa que são geralmente menos conhecidos e não menos importantes para a compreensão daquilo que foi e é Fernando Pessoa. Eu, por exemplo, não tinha tomado consciência do facto de F.P. ter ido para a África do Sul e ter tido uma educação inglesa, apesar de, muito provavelmente, isso ter sido abordado nas aulas de português no terceiro ciclo.

Porque foi Pessoa o escolhido?

M.M.: Pessoa veio antes desta banda-desenhada, de forma imprevista. O que começou por ser uma brincadeira superficial, uma série de tiras cómicas em torno de uma figura que eu mal conhecia, transformou-se gradualmente e graças à Catarina em um interesse sério da minha parte em saber mais sobre esse poeta que vim a reconhecer como sendo um desconcertante pensador: ao ler o seu texto “António Botto e o Ideal Estético em Portugal” (de que existe uma versão posterior intitulada “António Botto e o Ideal Estético Criador” - sublinho “criador”) percebi que o tempo das minhas brincadeiras superficiais com banda-desenhada tinha que acabar e decidi aprofundar essa minha abordagem inicial. Realizar uma biografia pareceu-me ser o procedimento mais interessante, para mim e para futuros e eventuais leitores.

C.V.: Eu só me lembro de dizer ao Miguel: «tens que ler Fernando Pessoa».

M.M.: Já lá vão onze ou doze anos…

Em que medida acham que esta BD se destaca de outras que já foram feitas em torno de Pessoa?

M.M.: Do pouco que eu vim a conhecer depois de termos começado este trabalho (em Dezembro de 2002), vejo que esta BD se diferencia pela extensão (terá mais de 150 páginas) e pelo facto de ser uma biografia. Penso que as bandas-desenhadas em torno de Fernando Pessoa e da sua obra têm em comum serem visões críticas ou de autor, de resto o mesmo se pode dizer de todo o tipo de trabalho em torno de Pessoa.

C.V.: Se calhar é uma abordagem mais densa sobre a obra, que exige uma maior pesquisa. Depois há um aspecto que eu acho curioso, que é a estrutura narrativa que o Miguel adoptou, da meia-página… com título… depois cinco meias-páginas compõem um grupo, e três grupos compõem um ciclo, etc… Mas isso já tem a ver com banda-desenhada em geral.

Qual é o processo típico para a produção de uma página, até a vermos online?

M.M.: A meia-página, ou prancha, é dividida em seis quadradinhos iguais que poderão depois ser por sua vez divididos ou fundidos formando assim um número maior ou menor de “quadradinhos”. Segue-se uma operação de “preenchimento de espaços vazios” onde se define ou descobre o conteúdo de cada meia-página, quer a nível do desenho como do texto. Apesar de ter elaborado três versões do argumento da história antes de começar a desenhar, optei por não fazer nenhum story-board para não me aborrecer durante a realização da banda-desenhada, que passaria a ser a mera ilustração de uma série de ideias pré-definidas (e provavelmente mal definidas). Posso ir assim descobrindo o ritmo próprio de cada meia-página e manter o meu nível de interesse e ao mesmo tempo transmitir (ou tentar transmitir) esse interesse ao eventual leitor. Este trabalho de improviso criativo guia-se pela biografia de Pessoa (e contexto histórico) e pela linha cronológica da sua produção literária. A esse nível não posso de forma nenhuma tomar liberdades. A meia-página é desenhada e escrita a lápis, depois é “arte-finalizada” a tinta da china.

C.V.: Depois vem a digitalização da meia-página e a separação e ampliação de cada quadradinho, ou figura, no Photoshop. Estes são impressos em papel de 180 gramas, “Clairefontaine” é a marca que eu gosto de usar, e pinto com tinta acrílica no verso da folha por ter menos textura. Nesta fase o mais complexo é encontrar as cores certas porque, por um lado, tenho que respeitar aquilo que são as cores da época o que nem sempre é fácil porque os documentos visuais apresentam-se a preto e branco - aqui socorro-me da obra de pintores como Bonnard, Renoir, Rousseau e de, por exemplo, “As aventuras de Adèle Blanc-Sec” do Tardi que se desenrolam na mesma época – por outro lado tenho que respeitar o equilíbrio cromático de cada meia-página, e grupo e ciclo, etc… Terminada esta fase volto ao scanner para uma digitalização cuidadosa dos originais pintados; convém que essa fique o mais fiel possível ao original! Estes são reduzidos e acertados com o desenho no Photoshop para que a cor “não saia fora dos riscos”. Há também todo um trabalho de limpeza quer do desenho quer das letras.

M.M.: Finalmente a meia-página está pronta para ser divulgada no blogue.

Pessoa teve uma existência exterior apagada. Não acham paradoxal falar da vida dele em imagens?

M.M.: Quando decidi fazer esta banda-desenhada as únicas dificuldades ou limitações em que pensei foram as minhas. A principal, que se mantém ainda hoje, tem a ver com tentar compor um retrato de Pessoa que não seja erradamente influenciado pelas visões críticas ou de autor de outros comentadores pessoanos, não ignorando portanto o que de bom essas visões possam ter. O primeiro comentador pessoano cuja obra conheci, ainda na escola, foi o pintor António Costa Pinheiro que produziu todo um discurso sobre Pessoa unicamente por meio de imagens (de que conheço ainda só uma pequena parte). Não achei portanto impossível ou contraditório falar da vida do poeta em banda-desenhada.

C.V.: Fernando Pessoa não era um escritor fechado em casa. Ele cultivou a sua imagem, que é há muito um ícone. Foi ele que a criou. Deixou-se ou melhor fez-se fotografar nas ruas de Lisboa, a descer a Baixa, sozinho ou acompanhado…

M.M.: Resta saber quem é que teve uma existência exterior apagada, se foi Fernando Pessoa ou então o meio cultural lisboeta e português. Talvez seja por isso ainda hoje tão incómodo o seu vulto que, por mais que o digam, não vai parar de crescer.

Acho a figura do corvo interessantíssima (muitas vezes presente), mas quero ouvir a vossa opinião sobre ele.

M.M.: O corvo surgiu durante o processo que acima descrevi como “preenchimento de espaços vazios”. É uma referência ao poema “O Corvo” de Edgar Allan Poe que F.P. traduziu e publicou na sua revista Athena. É também, dentro da banda-desenhada, uma referência à décima quarta meia-página cujo título é “Nevermore”.

C.V.: Também acho interessantíssima a presença do corvo e a sua permanência ao longo das meias-páginas. Para mim representa o indizível, o mistério na vida, o Destino: «Nevermore».

Pessoa aparece sempre de fato azul, porquê?

M.M.: É uma homenagem à tradição clássica da banda-desenhada de representar estereotipadamente as personagens. Facilita o seu reconhecimento (quase todas personagens desta história estão sempre vestidas da mesma maneira) mas é também um importante elemento estético. A cor azul em particular foi por mim escolhida por causa dos fatos dos super-heróis, de cores primárias onde o azul é normalmente uma cor importante, como é o caso do super-homem, do homem-aranha ou do capitão américa.

C.V.: Eu, neste caso, tentei corresponder ao que o Miguel me pediu utilizando azul cobalto misturado com azul claro permanente e branco. O vermelho do laço e da gravata pareceu-me a melhor opção, para o Pessoa não ficar todo de azul.

Foi difícil de conciliar a inclusão de muitas passagens de texto com o desenho e a cor das páginas?

M.M.: Graficamente a inclusão de muitas passagens de texto não é difícil. O que é difícil é seleccionar as passagens certas dos textos de Pessoa de forma a dar, ao longo da história (que ainda não está acabada), uma ideia geral dos diversos temas da sua obra, ou pelo menos os principais, de forma a não dar dele um retrato incompleto e manter ao mesmo tempo a coerência narrativa.

C.V.: Em termos de cor, é difícil encontrar as tonalidades certas e manter uma certa diversidade cromática ao longo da banda-desenhada. Por vezes tento criar a atmosfera própria para aquilo que está a ser narrado, outras vezes a única preocupação é o equilíbrio cromático da meia-página. Normalmente procuramos em conjunto encontrar a melhor solução.

M.M.: Voltando à pergunta inicial, eu submeto muitas vezes as páginas à Catarina para apreciação pois confio no seu sentido crítico e conto com o seu distanciamento para melhor ajuizar de possíveis erros meus no que diz respeito à lucidez da minha abordagem.

Como imaginam a BD publicada? E já agora, como gostariam que as pessoas a recebessem?

M.M.: Tenho uma ideia muita concreta da forma final que quero para esta BD. Da capa já acima falei: será uma representação do espaço sideral no qual “este” Fernando Pessoa surge flutuando, à deriva. O formato será vertical, preferencialmente com capa rija e as folhas cosidas.

C.V.: Esperamos que seja acolhida sem preconceitos e que possa interessar a um público variado e que tenha um preço acessível.

M.M.: Ou pelo menos não exorbitante.

Façam uma pergunta um ao outro.

C.V.: Como é que te sentes Miguel por estares há tanto tempo a dedicar-te a este projecto de banda-desenhada?

M.M.: Já lá vão de facto uns anitos, nove para ser mais ou menos exacto, tendo-me dedicado a ele exclusivamente nos últimos três. Sinto-me já no limite das minhas forças, mas a história ainda não está acabada, portanto ainda não posso descansar. Estou satisfeito com o trabalho até agora realizado e espero poder orgulhar-me do resultado final.

M.M.: Catarina, queres colaborar comigo no meu próximo projecto?

C.V.: Sim, com todo o gosto. Será mais um desafio.

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Algumas imagens desta banda desenhada, que podem ser vistas no blogue http://lmigueldsm.blogspot.com/, onde existem mais algumas:





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Existem mais versões de Fernando Pessoa na banda desenhada, como a de Laerte, Piratas do Tietê - O Poeta - Com a participação de Fernando (em) Pessoa 
como nos informa Geraldes Lino no seu blogue Divulgando BD
E existe pelo menos outra, de Guazzelli, cuja capa se pode ver mais abaixo.




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Imagens da responsabilidade do Kuentro
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segunda-feira, 29 de agosto de 2011

JOBAT NO LOULETANO – 9ª ARTE - MEMÓRIAS DA BANDA DESENHADA (V) – O “ULISSES” DE JOBAT (2)



9ª ARTE
MEMÓRIAS DA BANDA DESENHADA (V)



NOSTALGIA (5)
O REGRESSO DE "ULISSES" (2)

por José Batista

Não era muito claro, em meados da década de 50, quem na realidade detinha os direitos de propriedade dos originais das ilustrações fornecidas às editoras. Na utilização de material importado, tal questão não se punha, pois os representantes dos sindicatos – empresas detentoras dos "copyrigths" – forneciam sempre uma cópia das ilustrações encomendadas, e nunca os originais. Com os desenhadores portugueses, o caso era diferente. Ajustado com o editor o preço da ilustração, ignorava-se se a quantia estipulada se cingia a uma ou mais publicações, e se o direito artístico da mesma e a posse do original – papel, cartolina ou outro material, onde era executada – seriam também sua propriedade.

Não estando clarificados, entre o autor e o editor, os limites dos direitos cedidos e adquiridos, os originais, uma vez utilizados, eram devolvidos pelas tipografias às editoras que os arquivavam como se os mesmos lhes pertencessem. Esta uma das razões pela qual os ilustradores portugueses têm tão poucos originais seus, pois tal indefinição inibia os autores de os reclamarem, uma vez utilizados. Por outro lado, só excepcionalmente os editores desenvolviam os originais portugueses que publicavam, isto especificamente na área da ilustração.

Outra, para além das causas acima indicadas, seria o apetite que tinham pelas ilustrações alguns funcionários das gráficas onde as publicações eram impressas, pois não sendo muitas delas devolvi¬das às editoras, se tal não fosse expressamente exigido.

Mas haveria de facto indefinição nos direitos que a lei reconhecia a ambos, autores e editores?

Na área da banda desenhada, em Portugal, talvez erroneamente tida por arte menor por ser apreciada maioritariamente por crianças e adolescentes, nada que se saiba foi legislado que balizasse direitos e deveres.

Essa ausência de legislação originou um nebuloso critério o qual permitia supor que, uma vez paga a ilustração, o editor a poderia publicar quantas vezes necessitasse, considerando também como suas a propriedade artística e o suporte gráfico – os originais – dos mesmos.

Verdade que, se excepções houve, estas ficaram a dever-se mais a factores fortuitos, que à sua espontânea e voluntária devolução.

Além disso, o arquivar, ano após ano, os materiais já publicados – especialmente numa editora com imensas publicações, como era o caso da Agência Portuguesa de Revistas – requeria um espaço enorme, como deve calcular-se.

Vez por outra, os arquivos com meia dúzia de anos ou mais eram considerados como monos dispensáveis, pouco se cuidando de saber o que na realidade se inutilizava. Foi por mero acaso que no rescaldo de uma dessas "operações de limpeza", num monte de papéis destinados à "venda a peso", encontrei, entre eles, os meus originais do "Ulisses", assim como outros de Vitor Peon, que recolhi.

Havia de facto muita inconsciência e desrespeito pelos originais desnecessariamente não devolvidos. Alguns chegaram mesmo a ser queimados... mas nunca devolvidos aos seus autores!

Os de "Ulisses", regressaram às minhas mãos casualmente, mais de dez anos depois de publicados, apenas porque o pacote onde estavam arquivados, esperando o transporte que os levariam para reciclar, se rasgou, libertando os originais mesmo junto aos meus pés.

Há perto de quatro décadas que me acompanham. É com imenso prazer que, revistos, são novamente dados à estampa, como se Ulisses, liberto de Circe, de novo regressasse aos braços de Penélope!

Ao fim e ao cabo, – até os "heróis" de papel –, como tudo na vida, têm a sua história!

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Agradecemos a Jobat o envio das imagens
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quarta-feira, 24 de agosto de 2011

XVII SALÃO INTERNACIONAL DE BANDA DESENHADA DE VISEU - APRESENTAÇÃO

As imagens e os textos que apresentamos abaixo, são da responsabilidade do GICAV, (Grupo de Intervenção e Criatividade Artística de Viseu), organizador do 17º Salão de BD de Viseu.



NO 2.° CENTENÁRIO DO HISTORIADOR E ESCRITOR ALEXANDRE HERCULANO

O ano de 2010 chegou ao fim (e até deixou poucas saudades...). Como comemorações de grandes vultos da nossa Cultura, dois nomes: o desenhista Fernando Bento (1.° centenário do seu nascimento) e o historiador e escritor Alexandre Herculano (2.° centenário do seu nascimento). Evocando o primeiro citado, as entidades de BD dos Salões de Moura, Sobreda, Viseu, Amadora e Beja não o esqueceram.

Quanto a Alexandre Herculano, chegou agora a vez de Moura e Viseu relembrarem este gigante da cultura portuguesa, numa exposição em parceria. Alexandre Herculano (aliás, Alexandre Herculano de Carvalho e Araújo), nasceu em Lisboa a 28 de Março de 1810 e faleceu em Vale de Lobos a 13 de Setembro de 1877. Está sepultado no Mosteiro dos Jerónimos.

Da grandeza da sua vida e obra não nos compete aqui falar agora, mas apenas da sua conotação à Banda Desenhada, pois vários textos seus foram adaptados à 9.a Arte, a saber:

«A Abóbada», por Fernando Bento, José Batista (Jobat) e Victor Mesquita; «O Bobo», por José Ruy, editado em álbum pela Editorial Notícias; «A Morte do Lidador», por Eduardo Teixeira Coelho, publicado na revista «O Mosquito». Há também uma versão por José Garcês; «Eurico, o Presbítero», por José Garcês, publicado na revista «Modas & Bordados», na revista «Falcão» e mais tarde reeditado em álbum pela Futura; «Nuno Gonçalves», por José Antunes, adaptação de «O Castelo de Faria»; «Alexandre Herculano», uma biografia da autoria de Baptista Mendes, publicada no Jornal do Exército; «A Dama Pé-de-Cabra», por José Garcês e Augusto Trigo; a versão de Trigo, onde o próprio Herculano aparece como narrador, está incluída no 2.° tomo de «Lendas de Portugal», pela Asa. Existe também uma versão, de José Pires, que se mantém inédita até hoje; «O Monge de Cister», pelo brasileiro Eduardo Barbosa; publicado em 1954 no n.° 80/ Extra da colecção «Edição Maravilhosa», pela Ebal.; «O Último Combate», por Baptista Mendes, no «Camarada»; «A Morte do Lidador», numa versão de José Pires, publicada no Tintin belga e que será, em breve, publicada pela primeira vez em português no «Alentejo Popular»* e, posteriormente, no «Jornal do Exército». Por fim, e enquanto reuníamos todo o material para esta exposição, tivemos a grata surpresa de sermos contactados por José Ruy que nos enviou algumas pranchas, ainda em esboço, com a biografia (resumida) de Alexandre Herculano. Esta história destinava-se a ser publicada em jeito de preâmbulo na edição de «O Bobo» mas assim não aconteceu e este trabalho, até hoje, continua por concluir.

Luiz Beira; In Alentejo Popular (30.09.10)
(Texto actualizado para esta exposição).

Agradecimento especial a Carlos Rico - Moura e Luiz Beira – Sobreda

(*) Nota do editor do Kuentro: nesta altura, “A Morte do Lidador”, de José Pires já foi integralmente publicada no Alentejo Popular, iniciando-se ainda esta semana a sua republicação no Kuentro.

A dama pé de cabra
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CIDADES DO VELHO OESTE (TEX)


Tex Willer, a mítica personagem de Banda Desenhada criada em 1948, em Itália, pela dupla Giovanni Luigi Bonelli e Aurelio Galleppini, e hoje em dia uma das personagens de western com maior longevidade na história dos quadradinhos a nível mundial, sendo inclusive ainda publicado em diversos países. Ao contrário da quase totalidade dos heróis da BD, Tex percorreu, e continua a percorrer, um caminho inverso, seja nos confrontos com o público, seja naqueles com a crítica, facto este que é ainda mais interessante. Com efeito, enquanto as personagens comuns se vão desgastando ao longo dos tempos, com Tex acontece precisamente o contrário. Obrigado devido à sua natureza a navegar entre alvos bem definidos, que são obviamente aqueles das convenções do género western, ele continua a renovar-se interiormente, mas também exteriormente. Por um lado, a Sergio Bonelli Editore está a nível editorial a proceder desde há alguns anos a uma sistemática actualização dos seus quadros criativos, sem descurar a qualidade, seja a nível de argumentistas, seja de desenhadores, como ficou bem patente na exposição dedicada à nova vaga de desenhadores do Tex, ocorrida em 2007 no Salão de Moura. Por outro lado, a editora italiana tem-se multiplicado nos anos mais recentes na sedução aos leitores, diversificando o produto, isto é, à série canónica dos clássicos volumes mensais a preto e branco, acrescentou uma infinidade de outras séries, inclusive a cores, tendo também permitido a produção de outros itens associados à personagem e tem inclusive incentivado e patrocinado um cada vez maior número de exposições, como é exemplo "As Cidade do Tex" patente no XVII Salão Internacional de Banda Desenhada de Viseu.

Tex vive as suas aventuras principalmente na segunda metade do século XIX tendo por base de acção a reserva Navajo situada entre o Arizona, o Novo México, o Utah e o Colorado, um território em grande parte desértico que inclui o Monument Valley, parte do Deserto Pintado e parte da Floresta Petrificada, onde o inimigo não é representado apenas pelo homem, mas também pela própria natureza dura e hostil, mas como um verdadeiro herói, Tex está sempre pronto a acorrer em socorro dos amigos, seja sobretudo nas cidades do velho Oeste, que deste modo ainda hoje habitam a nossa imaginação, com as suas peculiares cadeias, barbearias, armazéns, saloons, hotéis, ferreiros, xerifes, pistoleiros e cheias de incríveis perseguições a cavalo e de duelos, seja inclusive nas principais cidades dos Estados Unidos da América como São Francisco, Nova Iorque, Boston, Nova Orleães, Washington, ou até mesmo em cidades canadianas e mexicanas ou ainda em terras mais distantes como a Oceânia.

Muitas das cidades onde Tex comparece ao longo da saga são caracterizadas por uma "main street"(rua principal) delineada por duas filas de construções dispostas paralelamente, única barreira entre o homem e os vastos espaços desabitados que as circundavam e que se tornaram célebres como teatros de duelos sanguinários, encontros mortais e desafios infernais, mas também convém dizer que por norma os fãs de Tex podem considerar-se afortunados porque os ambientes citadinos das suas histórias revelam sempre um surpreendente recheio de elementos dramáticos, em grado de oferecer um bom campo de acção a quem, como Tex Willer, tenha a vocação de reparador de injustiças. É impossível não recordar também as histórias de Tex acontecidas em inquietantes e melancólicas "ghost towns", pequenas cidades "fantasmas", nascidas nas vizinhanças de minas no decurso de poucos meses e depois entretanto rapidamente abandonadas quando a veia aurífera se esgotava ou se tornava uma trágica ilusão, ou nos pitorescos e misteriosos pueblos, aldeias índias construídas com pedras e tijolos de barro, no flanco de uma montanha, ou ainda nas perigosas e inacessíveis robber towns, inteiramente geridas por bandos de ladrões, assassinos e criminosos de todos os tipos, mas também nas fantásticas e improváveis cidades "esquecidas pelo tempo", habitadas por comunidades de espanhóis, vikings, egípcios, astecas ou russos.

Cenários esses que podem ser admirados na exposição integrada no XVII Salão Internacional de Banda Desenhada de Viseu, intitulada "As Cidades do Tex" e que contará com a presença de um dos mais renomados e admirados desenhadores citadinos de Tex Willer: Fabio Civitelli.

Zé Carlos Francisco  
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AS CIDADES DOS SONHOS (EM REDOR DAS OBRAS DE SCHUITEN E PETEERS)

" A capacidade da Arquitectura construir Cidade é incontornável, e por isso mesmo não deve ser negligenciada: " (...) forma e espaço estão tão intimamente ligados que uma é negativo do outro, e vice-versa, pelo que não podem separar-se, assim as formas visualmente apreendidas mantêm entre si estreitas relações - harmónicas ou desarmónicas - mas de qualquer modo evidentes." A forma de cada edifício produz, inevitavelmente, repercussões físicas no espaço onde se insere: a massa e o volume concretizam, configuram e condicionam espaço, enquanto a Imagem apenas o caracteriza."

Assim inicia a Dra. Inês do Carmo Borges o seu artigo "As arquitecturas setecentistas de Piranesi e a das Cidades Obscuras da BD de Scuiten do século XX - um elo artístico no trajecto do risco urbano", na Revista Cultura entre Culturas, onde magistralmente aproxima a obra La Tour (As cidades Obscuras - Schuiten e Peteers) da obra do arquitecto setecentista Giovanni Piranesi. "Os binómios Arquitectura/Cidade e Forma/Imagem que Schuiten apresenta na BD do século XX, com a série As Cidades Obscuras, e concretamente com o álbum "A Torre", evidencia a Excepção numa crítica à Cidade Moderna, e num processo de colagem de fragmentos sobreviventes de Piranesi. Há uma desmaterialização volumétrica da parte do edifício, e uma imperceptibilidade das suas infra-estruturas, nestes autores relativo às obras citadas.

O efeito cenográfico decorrente da estética da Estampa (setecentista) /imagética da BD (contemporânea) é concretizado numa mestria no controle do traço, e do efeito Luz/Sombra. De facto, o seu contributo faz-se pela excepção enquanto ruptura. Schuiten defende em "A Torre" uma Cidade Obscura que não rompe com a História nem com a Cultura, pretendendo assim uma obra que seja referencial, contextual. Os elementos dissonantes e por isso de Excepção de Piranesi tornam-se referências formais reconhecíveis no imaginário da Cidade, que os perdurará numa permanência de "estruturas da memória".

Schuiten e Peteers

"O ilustrador de Banda Desenhada, François Schuiten nasceu em Bruxelas, Bélgica em 13 de Abril de 1956, no seio duma família de arquitectos, área em que nunca fez estudos. Trabalha desde 1980, com Benoit Peeters na série As Cidades Obscuras, um dos melhores modelos das cidades/ficção da BD. Estes álbuns foram traduzidos numa dezena de línguas europeias e ganharam vários prémios, constituindo-se na sua obra mais conhecida. Esta série ficcionada decorre num universo paralelo ao nosso onde os protagonistas são quase sempre Cidades com características peculiares: Samaris, Alaxis, Calvani, Brüsel, Urbicande, Mylos, Galatograd, Xhystos, Pâhry, Blosssfeldtstad. Delas foi elaborado um guia turístico: "Le Guide des Cites" pelos geógrafos de Pâhry onde aparecem os espaços existentes no Continente Obscuro; um jornal, "L'Écho des Cites"; um site de Urbicanda na Internet, www.urbicande.be e diversas exposições. Autor de trabalhos de cenografia concebeu o pavilhão das Utopias na Exposição Universal de Hanôver, em 2000 bem como o pavilhão belga na Exposição de Aichi, no Japão em 2005, com o pintor Alexandre Obolensky. Em 2002 foi distinguido com o Grande Prémio de Angoulême pelo conjunto da sua obra, no decorrer do 29.° Festival de Banda Desenhada que decorreu em França. "

"O processo de concepção desta obra de Benoit Peeters e François Schuiten onde a Cidade é compreendida pelo binómio beleza etrusco-itálica / arquitectura romana Piranesica, enquanto realidade intrínseca e incontornável, assume-se como um processo projectual de servir o Homem contemporâneo na sua dimensão artística. (...) Somos colocados perante as questões da posição do observador face à obra de arte, num contextualismo integrado que não repete a Cidade Tradicional. (...) A distância temporal desta referência comprova-nos que possui uma capacidade de permanência e sucesso, demonstrando-nos que pode persistir no tempo, desde que aliado a significados e valores mais profundos que a sua própria Imagem. Estamos assim perante uma abordagem de edifício Ícone, mas que ultrapassa a questão da construção de uma Imagem de BD contemporânea forte e efémera, dada a continuidade com as Estruturas da Memória. A Excepção integrada do edifício nas Cidades Obscuras permite-nos compreender o diferente modo de com ele construir Cidade."

Esta exposição surge como singela homenagem a esta obra magistral no panorama da nova banda desenhada europeia. Remetemos para a leitura integral do artigo citado da autoria da Dra. Inês do Carmo Borges, a quem agradecemos a disponibilidade e autorização para esta adaptação textual. Adaptação Gicav 2011.

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FABIO CIVITELLI (ITÁLIA) - PRÉMIO ANIM'ARTE BD 2010


Fabio Civitelli nasceu a 9 de Abril de 1955 em Lucignano, província de Arezzo, Itália. Desde tenra idade mostrou uma grande aptidão para o desenho e com apenas 19 anos começou a colaborar com o StudiOriga, desenhando diversas personagens para a Edifumetto,com destaque para Lady Dust por ter sido o seu primeiro trabalho no âmbito da BD. Em 1977, com o pseudónimo Pablo de Almaviva, inicia a sua colaboração com a Editora Universo, desenhando para as revistas Il Monello e L'Intrepido. Dois anos mais tarde, ainda para a Universo, desenha Doctor Salomon nas páginas da revista Blitz, desenhando também o Homem-Aranha e o Quarteto Fantástico para a revista SuperGulp.Nesse mesmoano,1979, começaadesenhar Mister No para a Sergio Bonelli Editore, série onde realiza uma mão-cheia de histórias, até que em 1984 é chamado a desenhar Tex, personagem na qual trabalha até hoje com um estilo caracterizado por um grande cuidado nos mínimos detalhes, por um hábil uso do preto e branco e pelo extremo asseio do seu traço, sendo a sua versão de Tex, uma das mais apreciadas pelos leitores, respeitando a tradição, mas sendo ao mesmo tempo, moderna e cativante.

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CIDADES DA AMBIÇÃO - CENÁRIOS INTEMPORAIS

Os álbuns seleccionados para esta exposição marcam um período a todos os títulos notável na evolução da cultura e da mentalidade ocidentais: o período da Renascença Italiana (Renascimento). Os séculos XV e XVI tiveram uma influência determinante na construção da ocidentalidade moderna. A Pintura, a Arquitectura, a Escultura, a escrita, a Oratória, as Ciências Experimentais e outras áreas do saber tiveram progressos notáveis, onde se distinguiram alguns dos mais notáveis génios que a História já conheceu. Mas este período é também um tempo de crise nas mentalidades e na moralidade cristã, um período de excessos e cisões no seio do catolicismo, que vieram a resultar no aparecimento das igrejas protestantes. É neste ambientedecoabitaçãodosexageros de cortes papais arrogantes e imorais com a criatividade artística e literária em efervescência que decorrem os cenários e as histórias apontadas nesta exposição. O traço e a arte estão a cargo de alguns dos maiores nomes da banda desenhada europeia da actualidade: Didier Convard e Gilles Chaillet (VINCI) e Milo Manara/ Jodorowsky (BÓRGIA). Uma homenagem do Gicav a estes criadores de excelência, merecedores de uma Menção Honrosa neste Salão Internacional.

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CENÁRIOS INTEMPORAIS – PORTUGAL

Esta exposição é uma homenagem do Gicav a alguns dos nossos grandes desenhadores que procuraram nas suas histórias aos quadradinhos perpetuar imagens e cenários do nosso património edificado, espaços de eleição e memória por onde se passeiam, meditam, viajam, vivem, crescem e morrem os heróis da histórias ou as vidas de insignificância daqueles que nunca alcançam esse estatuto especial mas que imprescindíveis são na construção da narrativa.

Nomes como Eugénio Silva, José Garcês, Luis Diferr, Luis Louro, Vítor Mesquita, José Ruy, José Pires, Filipe Andrade e Filipe Pina, Luis Correia, ilustram esta mostra de cenários de Portugal, muitos deles presença habitual no salão iternacional de bd de Viseu.

Destacamos um nome estrangeiro, em jeito de homenagem, que partilhou trabalho com Luis Diferr - Jacques Martin (Portugal - ASA) , recordando a sua obra e a sua recente partida do mundo dos vivos (também dele se destaca a exposição ALIX, baseada num dos seus mais conhecidos heróis).

A todos o Gicav agradece pela qualidade do trabalho desenvolvido em prol da preservação e divulgação do nosso património monumental e artístico espalhado por muitas das nossas belas vilas e cidades. Bem hajam.

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EUGÉNIO SILVA - PRÉMIO ANIM'ARTE BD 2010

Eugénio Rafael Pepe da Silva nasceu no Barreiro, em 1937. Frequentou o curso de Desenhador - Gravador - Litografo, onde se iniciou na banda desenhada, impulsionado pelo Mestre Rodrigues Alves. Datam desta época as suas primeiras experiencias em trabalhos incompletos: o Ultimo Moicano, o Escaravelho de Ouro, A Perfeição(de EçadeQueirós). Asua listadetrabalhos ecurta,em parte devido ao seu carácter meticulosos de investigação histórica e documentação confirmada que sustenta a sua obra. Expôs em variadíssimos salões e festivais, nomeadamente na Sobreda, Lisboa, Barreiro, Viseu, Amadora, Moura, Ourique, Porto, Viana do Castelo, Castelo Branco, e também no estrangeiro: Japão, Roménia. Organizou o 1.° salão de bd do Barreiro em 1986. Recebeu o Troféu Sobredão, como Homenageado Nacional, na Sobreda/Bd 94, ano em que foi também convidado de honra do salão de Ourique. Tem participado como actor em vários projectos de teatro do Barreiro. Publicações: Amoni (Nau Catrineta); A Gruta dos três irmãos, no Pisca Pisca; Historia Pequena do Vidro (Espiral/Covina); Matias Sandor - álbum (Ed. Publica); Eusébio, o Pantera Negra (Meriberica/Liber); On a retrouve la foret perdue (Narration/Marselha); O Coelho Branco (Ed. Asa); Inês de Castro (Meriberica Liber - 1994), provavelmente o seu melhor trabalho. Em 1996 os Cadernos Sobreda BD n.° 11 reeditaram-lhe "Amoni" e " A Gruta dos três irmãos". Tem em execução um álbum sobre a figura do Zé do Telhado que aguarda publicação. Grande amigo do salão de Viseu, tem sido presença habitual neste certame que acompanha sempre com renovado interesse.

Obrigado Eugénio.

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TINTIN – HERGÉ

Hergé, pseudónimo de George Remi, nasce no dia 22 de Maio de 1907, em Et-terbeek ( Bélgica).

Desde muito cedo revela alguma vocação para o desenho, tendo publicado a sua primeira banda desenhada na revista Le Boy-Scout Belge, intitulada Les Aven¬tures de Totor, C.P. dês Hannctons.

Em 1925, concluídos os estudos, começou a trabalhar no jornal diário belga Le Vingtième Siecle, que passara a incluir, a partir de 1 de Novembro de 1928, o suplemento juvenil Le Petit Vingtième, que publica a banda desenhada Les Aventures de Flup, Nénesse, Poussette et Cochonet, desenhada pelo jovem Hergé.

No dia 10 de Janeiro de 1929, no número 11 do Le Petit Vingtième começa a publicar-se Tintin no País dos Sovietes, a primeira aventura de Tintin e Milou, a que se seguirão outras 22, durante quase meio século.

Hergé morre no dia 3 de Março de 1983 deixando incompleto Tintin e a Alpha Arte, o 24° álbum de uma obra que fez sonhar milhões de adolescentes em todo o mundo.

Numa época em que o acesso à informação era limitado, foi com Tintin e os seus inconfundíveis companheiros que começámos a descobrir o mundo. Foi com Tintin que fomos ao Congo e aos EUA, ao Médio Oriente ou à China. Aos Andes, à Escócia e ao Tibete.

Foi Tintin que nos levou à Bordúria e à Sildávia, nos Balcãs e à sul-americana República de San Theodoros, que muitos procurámos encontrar nos mapas, sem sucesso.

Enebriados por um desenho eficaz, linear e com cores planas e vivas, ao serviço de argumentos progressivamente mais consistentes, conhecemos Chi¬cago, Port Said, Bombaim, Petra, Xangai, Genéve, Katmandou ou as fictícias Klow e Los Dopicos.

E foi com Tintin que fomos à Lua, no início da década de 50, muito antes da viagem pioneira de Neil Armstrong.

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XVII SALÃO INTERNACIONAL DE BANDA DESENHADA VISEU
ORGANIZAÇÃO GICAV — GRUPO DE INTERVENÇÃO E CRIATIVIDADE ARTISTICA VISEU

CENÁRIOS URBANOS ... e do ermo nascem as cidades ...

A temática do XVII salão internacional de banda desenhada de Viseu conduz-nos ao encontro da arquitectura construída ou imaginada, transporta-nos aos cenários urbanos edificados pelas mãos de gerações de artistas da pedra ou cenários fantásticos imaginados pelo génio de inesquecíveis nomes da arte de desenhar aos quadradinhos. As histórias de vida que atravessam o tempo e o espaço e se animam nos desenhos que enchem a nossa memória e despertam a nossa curiosidade vivem de múltiplos sinais e arquitecturas; uma cidade é também uma paisagem coberta de sinais, "estruturas de memória" assinadas pelos homens que a edificam, e pelo tempo; e o tempo deixa marcas nas cidades, que se entrelaçam nas histórias de vida, mas também na arquitectura, elemento artístico e humanizado de contextualização e harmonização. desta dialéctica entre o espaço e o tempo, a arte e a vida que se constrói em grande parte este XVII salão e banda desenhada, procurando divulgar e honrar os espaços edificados por onde viajam, respiram e nos inspiram os autores e os heróis, dando brilho às histórias. Porque há cenários urbanos que brilham como pedras preciosas nas páginas da banda desenhada. E uma cidade torna-se num imenso universo quando estamos apaixonados por um dos seus habitantes, ou pelos seus espaços de memória, como acontece com o jovem repórter Tintin, ou com o eterno e enigmático viajante Corto Maltese, o histórico Alix ou o bravo pistoleiro Tex. Boa viagem pelas cidades dos nossos heróis da banda desenhada. Boa estadia na cidade de Viriato, de Aquilino Ribeiro, de Grão Vasco e tantos outros heróis da História e da Memória da cidade.

A organização (Gicav) 2011.

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AS CIDADES NAS AVENTURAS DE ALIX

Em 1948, nas páginas da revista Tintin nascia um novo herói do banda desenhada de tema histórico, o rovem Alix Graco filho de Astorix, chefe de uma tribo gaulesa e vendido como escravo no Oriente, no meio do caos dos conflitos bélicos entre impérios, seria libertado e adoptado por um senador romano. Doravante os leitores podiam contar com um herói intrépido, generoso e humanista num mundo onde a tolerância não abundava. Esse mundo, estranho e fascinante, do qual somos também herdeiros, era o Mundo Antigo, na época de Júlio César e do teu rival Pompeu, em pleno século I a.C.

Nas aventuras de Alix, o par de figuras históricas como César e Cleopoara, os leitores convivem com uma rica galeria de personagens imagindas pelo autor, entre as quais se destacam o jovem egípcio Enok, fiel companheiro de jornada de Alix, Calva, oficial romano ao serviço de César e amigo de Alix, ou Arbacés o arqui-inimigo do herói.

Jacques Martin, o criador de Alix, falecido em 2010, é um dos grandes autores do escota franco-belga tendo também sido um dos mais importantes colaboradores de hergé, pai de Tintin. Após 1991 com a vista gravemente afectada por problemas de saúde, continuou a desenvolver as aventuras de Alix, entre outros projectos, com o apoio de diversos cotaborodores. Por vontade do autor, foi garantida a continuidade das aventuras de Alix pela Casterman, com recurso a diversos autores, em Portugal, após o contributo das Edições 70, na década de 80 do século passado, a edição das histórias de Alix, é actualmente assegurada pela Asa.

Fascinado desde tenra idade pela Antiguidade Clássica e apaixonado peia arquitectura, Jacques Martin vai fazer viajar o leitor com Alix através de diferentes culturas, aquém e além fronteiras do poder romano, num mundo onde as cidades são elementos estruturantes da vivência política, social e económica.

Não se poupando o esforços na obtenção da documentação histórica necessária e mestre de traço elegante e da capacidade de encenação, Jacques Martin recriou cidades antigas, reais e imaginadas, de Roma à longínqua China.

Na presente exposição, seguimos alguns desses percursos urbanos nas aventuras de Alix, dos telhados dos edifícios às ruas, dos aquedutos ao sistema de esgotos, dos bairros populares às grandes praças monumentais. E a aventura começa precisamente numa cidade, Khanabad antiga capital do rei assírio Sargão II (722-705 a.C). onde encontramos pela primeira vez o jovem herói, no ano de 53 a.C.

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FÁBULA DE VENEZA

"Acontecem coisas inacreditáveis nesta cidade", diz Corto Maltese sobre Veneza, tão bela e encantada que gera todas as preguiças, deleites e sortilégios. Um desses sortilégios é possibilitar a existência de lugares mágicos, secretos, portas que se abrem a mundos fantásticos e histórias eternas.

As cidades são espaços de memórias , vivências e cenários que fazem delas especiais, eternas. É o caso de Veneza, visitada por Corto Maltese na obra "Fábula de Veneza", e que nesta exposição se pretende revelar em alguns dos seus percursos e ambientes, a partir da obra referida e uma referência no conjunto da obra de Hugo Pratt.


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segunda-feira, 22 de agosto de 2011

JOBAT NO LOULETANO – 9ª ARTE - MEMÓRIAS DA BANDA DESENHADA (IV) – O “ULISSES” DE JOBAT

9ª ARTE
MEMÓRIAS DA BANDA DESENHADA (IV)


NOSTALGIA (4)
NA TRILHA DE "ULISSES

por José Batista

Nos anos 50 a maioria dos desenhadores de histórias aos quadradinhos portugueses privilegiava os temas históricos, acima de qualquer outro. Vários factores contribuiram para essa opção, talvez o principal, a qualidade do desenho que os artistas norte americanos apresentavam nas BD publicados no nosso país. Três dos autores que mais fortemente influenciaram os ilustradores portugueses, foram, a meu ver, Hal Foster, Alex RaImond e Burn Hogarth, respectivamente criadores dos personagens Príncipe Valente e Rip Kirby, e o último, ilustrador das histórias de Tarzan.

A saga histórica passada no tempo do rei Artur, bem assim como as peripécias do homem macaco cativaram sobremaneira os vários aspirantes a ilustradores de BD nacionais. Em Alex Raymond, mais do que no enredo, a qualidade e o apuro no enquadrameno e execução artística eram inexcedíveis, o mesmo acontecendo igualmente a Foster e Hogarth. Outro dos factores da apetência dos desenhadores portugueses pelo género histórico, seria a beleza que os trajos, arquitectura, mobiliário e costumes dão às vinlhetas. Depois, a inexistência de guionistas nacionais, obrigaria os nossos ilustradores a recorrerem a narrativas históricas, temas que com facilidade encontramos na nossa literatura.

Integrado no espírito editorial da época, apresentei em 1955, a Mário de Aguiar, director da Agência Portuguesa de Revistas (A.P.R.), a primeira página ilustrada da história em BD, que hoje se inicia. Sugeri que a mesma saisse na revista Condor mensal, que na altura se publicava. Esta história era baseada no filme "Ulisses", recém estreado em Portugal, o qual fora novelizado – narrado em texto, com algumas fotos – na "Colecção Cinema", edição da APR.

Mário de Aguiar aprovou a ideia e a mesma foi agendada para a referida revista, que a publicou no fascículo n.° 57, do 6o volume, cuja data exacta de saída ignoro.

Creio ter sido a primeira história ilustrada com tal dimensão que desenhei, senão mesmo a que publiquei até essa data. Carlos Alberto, na altura já integrado na redacção, pois fora antes apenas colaborador externo, foi o autor das ilustrações da capa e contra-capa, a qual foi impressa nas oficinas da Bertrand (Irmãos), na travessa Condessa do Rio, junto à Calçada do Combro, empresa há muito extinta. Publicada há perto de cinco décadas notar-se-á nalgumas vinhetas o peso dos anos e, simultaneamente, os primórdios de um estilo que só a prática e os tempo aprimorariam.

Todavia, embora respeitando a inocência artística dessa época, os originais agora publicados beneficiaram de uma revisão tanto na balonagem como no acabamento de modo a valorizar a actual publicação.

Uma boa leitura para as duas gerações a quem esta publicação se destina – os "jovens" leitores de há meio século, e os de hoje.

Capa da colecção Condor, desenhada por Carlos Alberto, onde a história ilustrada "Ulisses", que hoje iniciamos, foi publicada em meados dos anos 50

Capa da revista italiana Cineromanzo Gigante nº1, de Outubro de 1954

 Páginas 186 e 187 da Colecção Cinema com novelização do filme ULISSES - filme realizado por Mario Camerini, com Kirk Douglas, Silvana Mangano e Anthony Quinn, 1954.

Página da fotonovelização do filme ULISSES (da revista original italiana Cineromanzo - Outubro, 1954) 

ULISSES - Original inédito da Página 1 recuperada
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ULISSES, José Batista (Jobat) adaptação do texto e desenho.
Prancha 1


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Imagens enviadas por Jobat, cuja colaboração agradecemos
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domingo, 21 de agosto de 2011

BDpress #284: MORREU JEAN TABARY O CRIADOR DE IZNOGOUD, O VIZIR QUE QUERIA SER CALIFA NO LUGAR DO CALIFA...


Público online, 20, Agosto, 2011

MORREU JEAN TABARY, CRIADOR 
(COM ARGUMENTOS DE GOSCINNY) 
DO ANTI-HERÓI MAIS AMBICIOSO DA BD FRANCESA

Por Hugo Torres

Jean Tabary nasceu em Estocolmo, em 15 de Março de 1930 e faleceu em 18 de Agosto de 2011, 
em Pont-l'Abbé-d'Arnoult.

Os franceses têm uma expressão para a ambição desmedida: “je veux devenir calife à la place du calife”. Foram buscá-la à ardilosa personagem Iznogoud, que recusa conformar-se com o segundo lugar na hierarquia do califado de Bagdade. Jean Tabary, desenhador que criou este anti-herói com René Goscinny, morreu na quinta-feira, aos 81 anos.
Tabary continuou a trabalhar em Iznogoud mesmo após a morte de Goscinny, em 1977 (tal como Albert Uderzo fez com Astérix). Houve uma inflexão nas histórias do vizir, que passaram a ser mais longas, detalhadas e a explorar uma única ideia por álbum, mas tanto Tabary como os seus fãs não deixaram cair Iznogoud, cujo último álbum é de 2004 (La faute de l'ancêtre).

O anti-herói é provavelmente o maior sucesso do desenhador francês, tanto que passou a jogo de computador (1987), série de desenhos animados (1995) e filme em live-action (2005). Mas a história de Tabary (n. Estocolmo, 1930) não começa nem acaba em Iznogoud. Aliás, foi Totoche que tornou o seu trabalho conhecido internacionalmente.

Totoche começou a ser publicado em 1959. É a segunda criação com assinatura de Tabary, que se estreou com Richard et Charlie, em 1955. Iznogoud surgiu em 1962, no mesmo ano em que arrancaram as aventuras de Valentin le vagabond (este também com Goscinny). Corinne et Jeannot, que começou a chegar às bancas em 1966, fecha a lista.

“Ainda é cedo para começarmos a pensar no futuro sem ele, mas é evidente que vamos tentar fazer com que todas as suas criações cheguem de novo ao maior número possível de pessoas, para que se descubra a riqueza de tudo o que fez”, disse à agência EFE a filha do desenhador, Muriel, que gere com os dois irmãos as Editions Tabary.

Jean Tabary será sepultado em Pont-l'Abbé-d'Arnoult, França, onde vivia há mais de 30 anos.
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Edições portuguesas de Iznogoud  Goscinny (arg) Jean Tabary (des), (Edições Asa):







sábado, 20 de agosto de 2011

LUANDA CARTOON #4: BDpress especial - UM SONHO TORNADO REALIDADE. EM ANGOLA, DOIS IRMÃOS COLOCAM DE PÉ UM SONHO DE MUITOS ANOS - João Mascarenhas no blogue d'O Menino Triste


UM SONHO TORNADO REALIDADE. EM ANGOLA, DOIS IRMÃOS COLOCAM DE PÉ UM SONHO DE MUITOS ANOS.

TUDO PELO AMOR À BANDA DESENHADA.
OLINDOMAR ESTÚDIO / LUANDA CARTOON

João Mascarenhas

Quando se fala do Festival Internacional de Banda Desenhada e Animação Luanda Cartoon, tem que se referir obrigatoriamente os nomes de Lindomar e Olímpio de Sousa, e consequentemente o “Estúdio Olindomar”.

É exactamente sobre o Estúdio Olindomar que quero hoje falar. Não vou falar para já do Festival em si, já outros o têm feito e a imprensa tem sido prolífera em bons artigos sobre o mesmo. Vou falar do Estúdio Olindomar e de uma paixão, de uma GRANDE paixão. Ninguém pode imaginar a paixão que os dois irmãos angolanos têm pela Banda Desenhada. Só quem os conhece. Paixão essa que os tem levado a apostar naquilo que amam e acreditam, colocando nela todo o seu viver de cada dia, movendo mundos e fundos para que o Luanda Cartoon seja efectivamente uma referência no mapa da Banda Desenhada.

Legado recebido do artista Henrique Abranches, o amor pela Banda Desenhada e o seu ensino logo se tornou num desejo de criarem um estúdio onde isso mesmo se pudesse concretizar.

Assim nasceu o Estúdio Olindomar, que funcionou durante alguns anos em instalações provisórias. Durante o corrente ano, um espaço independente e próprio tornou-se realidade. Actualmente, o Estúdio Olindomar está localizado numa moradia de dois pisos, na Terra Nova, em Luanda. A moradia é pertença da família Sousa, e no Estúdio existe o ambiente ideal e as condições para que os desejos dos dois irmãos sejam uma realidade. Inclusivamente, existe espaço para uma BeDeteca, que será a primeira em Luanda, e cujo acervo já conta com alguns exemplares interessantes e que irá ser incrementado substancialmente através de acções particulares de que falaremos aqui em futuros posts.
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Acredito que seja difícil perceber, para quem não conhece o Lindomar e o Olímpio, como é que aquela moradia não foi arrendada ou vendida, de forma a realizar dinheiro. Essa poderia ser uma solução muito fácil, numa cidade onde o arrendamento e venda de habitação são muito proveitosos. Mas não, os irmãos Sousa (com a colaboração dos elementos do Estúdio) fizeram obras, pintaram, repararam e agora o Estúdio Olindomar é uma REALIDADE!

Faço votos para que o Estúdio Olindomar possa ter o sucesso e os apoios que merece, pois a Banda Desenhada (e a animação) angolana só têm a ganhar com esse êxito. Este é um bom exemplo em como os sonhos se podem tornar realidade!




João Mascarenhas, pela segunda vez consecutiva presente no Luanda Cartoon
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Imagens da responsabilidade do Kuentro, sacadas, com a devida vénia em 
João Mascarenhas Facebook
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