sábado, 27 de abril de 2019

TEX – OS PREDADORES DO DESERTO – DE CLAUDIO NIZZI e BRUNO BRINDISI – LANÇAMENTO DA POLVO


TEX
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OS PREDADORES DO DESERTO
DE CLAUDIO NIZZI e BRUNO BRINDISI

LANÇAMENTO DA POLVO - HOJE NA ANADIA
"VI MOSTRA DO CLUBE TEX PORTUGAL"


Rui Brito (Polvo) e Bruno Brindisi

O LIVRO 

Não é propriamente uma mensagem de amor e paz, aquela que é transmitida pelos homens às ordens do Pregador. Disfarçados de soldados, cometem assaltos sangrentos, sem mostrar qualquer indício de piedade pelos infelizes que se cruzam no seu caminho. Mas tais actos não se irão prolongar por muito tempo, pois o comandante do Fort Defiance encarregou Tex e Carson de partirem na peugada do bando. O início do fim, para o grupo do Pregador, chegou com o inesperado sequestro do filho de Tex!

DA INTRODUÇÃO 
(de Pedro Cleto) 

Publicado inicialmente em Junho de 2002, em Itália, “Os Predadores do Deserto” é um álbum diferente de Tex.”São todos diferentes”, dirão alguns, mas este destaca-se pela sua construção narrativa.

Escrito por Claudio Nizzi, segue de perto e de forma assumida a estrutura narrativa de “A Balada do Mar Salgado”, a mítica aventura de 1967 que assinala a estreia de Corto Maltese, o alter-ego de Hugo Pratt, numa obra que é claramente uma homenagem a este autor.

Nizzi aproveitou para dividir o protagonismo deste relato pelos quatro pards habituais, sozinhos e/ou em grupo reduzido, enquanto Brindisi recriou com bastante credibilidade as vastidões do deserto e, com bastante distinção, ultrapassou aquele que é recorrentemente um dos maiores obstáculos para quem se inicia em Tex: o desenho dos cavalos.

Desta forma os autores oferecem aos leitores um western consistente, na linha das grandes produções cinematográficas e das míticas séries de Banda Desenhada que fizeram deste um género de eleição.

OS AUTORES 

Claudio Nizzi (1938, Setif – Argélia) é provavelmente o mais prolífico argumentista do “fumetto” italiano. Em 50 anos de carreira, foi um dos estandartes das revistas para jovens como “Il Vittorioso” e “Il Giornalino”, em cujas páginas teve oportunidade de criar séries e personagens como “Safari”, “Larry Yuma”, “Capitan Erik”, “Coonnello Caster Bum”, “Nico e Pepo”, “Tenente Marlo” e “Rosco & Sonny”. Começa a colaborar com a Sergio Bonelli Editore em 1981, escrevendo duas aventuras para “Mister No”, antes de passar para “Tex” (anonimamente nos primeiros anos) e, mais tarde, criar “Nick Raider” e “Leo Pulp”. A sua estreia em “Tex” acontece em 1983 com a aventura “La valanga d’acqua”, desenhada por Enio Nicolò, na realidade a segunda história escrita por Nizzi, uma vez que a primeira, “Il ritorno del carnicero”, só foi publicada posteriormente. Nas suas histórias, Tex é absolutamente a figura central, o protagonista indiscutível, tudo gira em seu redor, assumindo-se como a base de toda a narração. Escreveu ininterruptamente até 2008 e, depois de mais de 150 histórias com o “ranger”, Nizzi deixa a série e dedica-se à escrita de romances, até regressar surpreendentemente em 2017, com a aventura “Dal tramonto all’alba”, desenhada por Roberto Zaghi. A sua carreira conta com prémios como o “Yellow Kid” em 1995, ou o “Inca Winter” em 1997.

Bruno Brindisi (Salerno, 1964) cresceu no seio de uma família de artistas. Autodidacta, com apenas 19 anos fundou a chamada “Scuola Salernitana” com Roberto De Angelis e Luigi Siniscalchi, publicando a revista amadora “Trumoon”. A sua carreira profissional começa em 1986, desenhando histórias eróticas para a Blue Press e para a Ediperiodici e, mais tarde, para as Edizioni Cioé e Edizioni ACME. Em 1990, aos 25 anos, entra na Sergio Bonelli Editore, debutando em alguns episódios de “Nick Raider”, até entrar na equipa de “Dylan Dog”. Em 2002 começa a trabalhar em “Tex”, desenhando “I predatori del deserto”, sob argumento de Claudio Nizzi. Termina “Muddy Creek”, na série mensal, uma aventura que Vincenzo Monti deixara incompleta devido ao seu falecimento, e inaugura o Color Tex com a história “E vienne il giorno”. Em 2012 desenha “Il segreto di Diabolik”, por ocasião dos 50 anos desta série. Ainda na Bonelli desenha “La rivolta dei Sepoy”, um episódio de Le Storie escrito por Giuseppe De Nardo, e o primeiro número de “Brad Barron”, mini-série de Tito Faraci. Ao mesmo tempo, trabalha para o mercado francófono com a Humanoides Associés na série “Novikov”. Em 2015, foi galardoado com o prémio “Romics d’Oro”, mas antes, entre 1993 e 2012, já tinha vencido inúmeros prémios pelo seu trabalho, entre os quais o “Comicon” 2003.


FICHA TÉCNICA

Os predadores do deserto
Argumento: Claudio Nizzi
Desenho: Bruno Brindisi
Tradução: José Carlos Francisco
Texto introdutório: Pedro Cleto
Legendagem: Hugo Jesus
232 pág., p/b, brochado com badanas
24,5 x 18,5 cm, €16,99 (IVA inc.)
Colecção “Tex – Romance Gráfico”, nº 6
ISBN 978-989-8513-98-4
Polvo, Abril 2019







quinta-feira, 25 de abril de 2019

6ª MOSTRA DO CLUBE TEX PORTUGAL NESTE FIM DE SEMANA NA ANADIA

6ª MOSTRA DO CLUBE TEX PORTUGAL 
NESTE FIM DE SEMANA NA ANADIA 
26 E 27 DE ABRIL 

PRESENÇA DOS DESENHADORES TEXIANOS 
BRUNI BRINDISI e ROBERTO DE ANGELIS 

Cartaz de Roberto De Angelis 

Cartaz de Bruno Brindisi 

Pelo sexto ano consecutivo, vai acontecer no Museu do Vinho da Bairrada, na Anadia, a Mostra do Clube Tex Portugal. A horda de texianos, que me parece ter apenas um elemento que monta a cavalo e vestirá, de certeza, mais uma vez a “farda” do Tex, vai reunir-se de novo, para ver uma exposição de originais da célebre personagem italiana do oeste americano e confraternizar, com um copo do célebre vinho na mão.

O cartaz do encontro tem dois convidados de peso, os desenhadores desta popular série de banda desenhada italiana, Bruno Brindisi e Roberto De Angelis. A direcção do clube, que é como quem diz, os nossos amigos José Carlos Francisco e Mário João Marques, recolheram para exposição nesta mostra, originais de cada um dos autores convidados, numa visão geral das colaborações recentes destes ilustradores com a Sergio Bonelli Editore. Montaram também uma outra exposição para celebrar os setenta e um anos de publicação das aventuras de Tex Willer, composta por setenta e um rostos desenhados por setenta e um autores, que até agora desenharam aventuras do famoso ranger da Casa Bonelli.


Roberto De Angelis - Biografia: Napolitano de nascimento (16 dezembro 1959), salerlitano de adoção, Roberto De Angelis inicia a sua carreira em 1983, quando se junta a um grupo de jovens autores que vão criar o fanzine Trumoon. Nas suas páginas será publicado L’Uomo di Lisa, o que lhe vai valer um contrato com o estúdio de Dino Leonetti que comissiona algumas histórias para as Edizioni Cioè. Na segunda metade dos anos 1980, De Angelis, Brindisi, Coppola e Siniscalchi dividem um apartamento, onde vão criar o Trumoon Studio. Em 1987, De Angelis encontra Ade Capone, com quem realizará Kor One, quase um prelúdio de Nathan Never. Ao mesmo tempo, colabora com o Studio Leonetti e realiza histórias para Tilt e Boy Comics. Entretanto, as Edizioni ACME procuram novos talentos e o Trumoon Studio é contratado em bloco. São tempos de fervor criativo que vão acabar por levar De Angelis a ser admitido na Sergio Bonelli Editore, onde vai trabalhar em Nathan Never e revelar-se como um dos desenhadores de ponta da série de Serra, Medda e Vigna, cabendo-lhe a honra de ser o autor do número promocional (zero) e dos primeiros Speciale Nathan Never, Almanacco della Fatascienza e Nathan Never Gigante, assim como se torna capista da série a partir do #60 até ao #249. Na SBE desenha também Legs Weaver, Caravan e uma história para o Dylan Dog Color Fest. Estreia-se em Tex em 2004, desenhando o álbum gigante Ombre nella notte, um registo em tudo diferente de Nathan Never, e que acabará por ficar atravessado na garganta do autor, que o considera mesmo um fracasso, nunca escondendo o desejo de poder redimir-se. A ocasião surge em 2015, durante o Festival de Lucca, quando se encontra com Mauro Boselli e lhe pede para desenhar uma história curta de Tex, o que acabará por se concretizar em 2016, quando vai receber um argumento de 248 páginas para a nova coleção Tex Willer, centrada na juventude do herói.
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Bruno Brindisi - Biografia: Oriundo de uma família de artistas, Bruno Brindisi nasceu em Salerno em 1964, comuna italiana onde ainda reside. Autodidata, com apenas dezanove anos fundou em 1983 a chamada Scuola Salernitana com Roberto De Angelis e Luigi Siniscalchi, com quem publicou a revista amadora Trumoon. A sua carreira profissional começa em 1986, desenhando histórias eróticas para a Blue Press e a Ediperiodici e, mais tarde, para as Edizioni Cioé e Edizioni ACME. Em 1990, com apenas vinte cinco anos, entra na Sergio Bonelli Editore, desenhando alguns episódios de Nick Raider, até entrar na equipa de Dylan Dog, série onde se vai estrear com a aventura Il Male, escrita por Tiziano Sclavi. Em 2002 começa a trabalhar em Tex, desenhando o Texone I predatori del deserto, termina na série mensal Muddy Creek, uma aventura que Vincenzo Monti deixara incompleta devido ao seu falecimento, e inaugura o Color Tex com a história E vienne il giorno. Em 2012, desenha Il segreto di Diabolik, por ocasião dos cinquenta anos desta série. Ainda na Bonelli desenha La rivolta dei Sepoy, um episódio de Le Storie escrito por Giuseppe De Nardo, e o primeiro número de Brad Barron, mini série de Tito Faraci. Ao mesmo tempo, trabalha para o mercado francófono com a Humanoides Associés na série Novikov. Em 2015, foi galardoado com o prémio Romics d’Oro, mas antes, entre 1993 e 2012, já tinha vencido inúmeros prémios e reconhecimentos pelo seu trabalho, nomeadamente o Comicon 2003, onde foi classificado como “… um jovem de qualidades técnicas e artísticas de elevado nível. Pela sua capacidade de descrever e evocar pesadelos e sonhos, paisagens reais e fantásticas, colocando o seu estilo ao serviço da aventura e da diversão”.



domingo, 21 de abril de 2019

DRUUNA MANDRÁGORA – APHRODÍSIA Argumento e Desenho: Paolo E. Serpieri


DRUUNA 
MANDRÁGORA – APHRODÍSIA 

Argumento e Desenho: Paolo E. Serpieri 

Edição: Cartonada 
Número de páginas: 144 
Impressão:cores 
Formato: 21 x 28,5 cm 
Editor: Arte de Autor 
ISBN: 978-989-54326-3-9 
PVP: 22,00€ 

ÁLBUM DUPLO que contem as histórias Mandrágora e Aphrodisia, e um dossier com ilustrações inéditas.

Saída de um estranho sonho em companhia do seu amante Shastar, Druuna é convocada pelo comandante da nave. O«mal» existe a bordo, e é ela que tem de encontrar a fórmula dos oro capaz de conter o flagelo. Druuna parte então para uma nova viagem cerebral ao coração da cidade de onde é originária. Aí reencontrará sem dúvida Shastar, mas também o seu gnomo salvador e o doutor Ottonegger, que lhe revelará o ingrediente necessário ao remédio que ela procura, uma flor misteriosa: a Mandrágora...

Druuna, série de referência da banda desenhada erótica dos anos 1980, é reeditada na Arte de Autor! Este terceiro álbum reúne Mandrágora e Aphrodisia, os episódios 5 e 6 da saga. Cada álbum desta nova edição é enriquecido por um caderno gráfico.


 







A publicar: 

Druuna4 – O planeta esquecido | Clone 
Druuna5 – A que vem do vento – INÉDITO



sexta-feira, 19 de abril de 2019

PRÍNCIPE VALENTE NOS TEMPOS DO REI ARTUR DE HAROLD FOSTER


PRÍNCIPE VALENTE 
NOS TEMPOS DO REI ARTUR 
DE HAROLD FOSTER

COLECÇÃO LANÇADA PELA PLANETA DE AGOSTINI JÁ À VENDA EM PORTUGAL

Príncipe Valente nos tempos do Rei Arthur, título completo desta colecção, é uma história em banda desenhada criada em 1937 pelo canadiano Harold Rudolf Foster (1892- 1982) para a King Features Syndicate. O autor era responsável tanto pela criação das imagens como pelo argumento, textos e diálogos. O seu brilhantismo, tanto para ilustrar como na narração, deu à colecção uma unidade dificilmente alcançada.

Foster desenhou a sua primeira página de Príncipe Valente em 1934. Ele estava decidido a não seguir o caminho traçado por Flash Gordon ou Buck Rogers – os super-heróis com poderes e as bandas desenhdas futuristas não o inspiravam. Ele queria mais: um homem de carne e osso e, por isso, menos heróico. Voltar ao passado era a solução, e ele imaginou um príncipe medieval nos dias do Rei Arthur, um cavaleiro da Távola Redonda. Rasgou esboços feitos em 1934 porque achou que lhes faltava credibilidade histórica, e antes de voltar à prancheta dedicou-se a estudar a Idade Média, ler inúmeras novelas de cavalaria, investigar os mitos e lendas da literatura inglesa e visitar exaustivamente o Field Museum de Chicago.

A história foi tomando forma: narraria a vida do Príncipe de Thule, uma cidade entre a realidade e a lenda localizada no Fiorde de Trondheim. Nessas tiras, ele recriou os mapas geográfico e político-social da Idade Média europeia, com as suas cidades, povos, batalhas e outros acontecimentos históricos reais. Considerou todos os pontos de vista, da fidelidade histórica ao entretenimento do leitor, e decidiu aceitar os anacronismos que enriqueciam o resultado visual ou davam mais suspense narrativo, ampliando as possibilidades de viagens e aventuras do protagonista, inserindo-os na trama de forma tão subtil que muitos deles passaram despercebidos.

O leitor nunca fica perdido ou incomodado, apesar de num quadro o cenário ser Camelot e, no outro, uma viagem ao Novo Mundo. Foster funde história, mito e lenda como um perfeito malabarista. Outro grande acerto, característico de algumas novelas históricas como as de Cecelia Holland, foi não dar demasiada importância a datas e lugares, renunciando ao rigor histórico que tinha tirado da banda desenhada a sua leveza e fantasia. Uma vez situada no amplo século V d .C. , Foster despejou na sua grande obra tudo o que pôde, tanto das suas leituras como das suas próprias experiências.

Valente é um príncipe que representa o ideal triunfante do cavaleiro medieval. Como Dom Quixote, percorre caminhos em busca de aventuras, pára e ajuda quem precisa, socorre a todas as damas em apuros, resolve qualquer injustiça, descobre mistérios e enigmas, vence a bruxaria e o mal; mas, diferente de Quixote, Valente vê moinhos onde aquele vê gigantes e, com o seu racionalismo e valor, vence sempre. Como a genial novela de Cervantes, as bandas desenhadas de Príncipe Valente são uma mistura de contos e pequenas digressões. O protagonista tem uma missão que consiste, por exemplo, em ir da Britânia a Roma.

No caminho, surgirão imprevistos e mudanças de planos que enriquecem muito a vida dos personagens, tornando a leitura divertida. Uma viagem ou uma missão nunca serão uma linha recta entre dois pontos. A prova do talento narrativo do autor é que mesmo com o labirinto de histórias dentro da história, nem o protagonista nem o leitor perdem o rumo. Pode haver um parêntesis maior ou menor, porque o corajoso jovem deve resolver um ou vários assuntos inesperados, mas Foster encarrega-se de lembrar o objectivo final da aventura em questão.


Príncipe Valente começou a ser publicado em oito jornais num sábado, 13 de fevereiro de 1937, e continuou a ser lançado todos os sábados até 15 de maio de 1938, quando passou para os domingos. Ocupava uma página completa, com uma média de cinco a 12 quadros por prancha. Na parte superior e, posteriormente, à esquerda do primeiro quadro, aparecia o título e o nome do autor, além de, muitas vezes, uma sinopse da história publicada anteriormente. Foster tinha pensado como títulos "Derek, filho de Thane" ou "Príncipe Arn", mas os editores impuseram o nome de Valente para o protagonista – Val, para os íntimos –, uma ideia que parecia demasiado simplista a Foster, mas que ele acabou por abraçar.

Publicar numa tira dominical permitia atingir um grande número de leitores, mas também exigia uma narrativa para todos os públicos, estimulante, cheia de vida e aventura, com pouca violência e obscuridade. Foster criou, sobre esses pilares, uma história que sobreviveu a décadas, à mudança de século e, sobretudo, às transformações do mundo ocidental e de sua mentalidade.

À surpreendente capacidade de perdurar, unem-se algumas outras qualidades que transformaram Foster no pai da banda desenhada de aventuras e num dos grandes mestres da BD. Príncipe Valente foi um marco na evolução desse género, em parte por algumas decisões de Foster, que foi contra as modas em voga na época. Uma de suas atitudes mais surpreendentes foi localizar os textos sob os desenhos, nunca em balões. O autor defendia, assim, a importância da imagem frente ao diálogo ou à narrativa, não porque fosse mais importante, mas porque gostaria que a qualidade de seus desenhos fosse devidamente apreciada. E, de facto, as ilustrações surpreendem pela sua estética, as suas cores e a riqueza de detalhes com os quais descrevem a vida quotidiana, as lutas, todo tipo de objectos – desde os utensílios para alimentos até às armas –, o aspecto físico dos personagens, a sua condição social e até a expressão dos seus rostos.


  


Durante a primeira década, foram criados os fundamentos da saga. É a etapa com mais elementos arturianos e com mais situações que escapam do racional devido à presença de seres fantásticos . A história começa com o exílio da família de Valente, que abandonou a sua região de origem e se estabeleceu nos pântanos da Britânia. Nas primeiras pranchas, vemos um Valente criança e depois adolescente. É um jovem apaixonado e inexperiente, que demonstra modos de um futuro cavaleiro da Távola Redonda. A mãe de Valente morre, mas o seu pai consegue retornar ao trono de Thule. Nas décadas seguintes, os protagonistas amadurecem, Valente conhece e casa-se com Aleta, com quem começa uma família. Foster amplia os horizontes da banda desenhada na época, tanto geograficamente como dos personagens secundários, e dá a impressão de que sua imaginação e as possibilidades da colecção são infinitas.

Este príncipe medieval que vemos amadurecer através dos anos lembra um filósofo do Iluminismo, ponderado e audaz, aliando perfeitamente razão e paixão. Valente quase pode ser considerado um homem da ciência do Século das Luzes, que explica com a razão tudo aquilo que aparentemente é sobrenatural ou qualquer superstição.

Com isso, Foster desenha um herói com as melhores qualidades de cada época: o cavalheirismo medieval, a audácia do homem renascentista, o racionalismo do Século das Luzes e a paixão e individualidade do Romantismo. Um ser muito iluminado, que deixa o leitor com um bom sentimento.

Como se isso fosse pouco, um elenco de familiares e amigos fascinantes acompanha o protagonista, a maioria deles tão estimulante quanto Valente. O seu grande amor, sua esposa e alter ego Aleta, por sua vez, rompe com todos os clichés do personagem feminino da BD até então. Ela não é uma mulher frágil que precisa ser socorrida, nem a típica sedutora que prejudica quem a deseja: Aleta é bela, inteligente, tenaz, bondosa, maternal, uma excepcional amazona e incrível companheira. Os comentários sarcásticos sobre ela e sobre as mulheres em geral que o autor coloca na boca dos seus personagens masculinos são um anacronismo dos mais simpáticos. Remetem-nos à própria biografia do autor e ao século XX: os homens queixam-se de que as mulheres mandam neles ou que são intrometidas, mas reconhecem quando elas tiram as castanhas do fogo... ou quando os ajudam em batalhas perdidas.

Foster atreve-se a algo inédito: Aleta traça estratégias de guerra e realiza acções diplomáticas para convencer as esposas de outros reis e príncipes com acordos de paz, em vez da guerra. As mulheres impõem o senso comum e o amor à vida, evitando muitos derramamentos de sangue. Definitivamente, o desenho dos personagens é tão fascinante que, por si só, tornaria essa história em banda desenhada um clássico sem precedentes.

Em 16 de maio de 1971, publicou-se a prancha 1.788, a última escrita e ilustrada por Harold Foster; nesse mesmo ano, o autor e a sua esposa mudaram-se para a Flórida. Apenas a idade e alguns problemas de saúde conseguiram afastá-lo de seu querido Valente. Apesar disso, o canadiano continuou a enviar semanalmente, durante mais nove anos, o roteiro e um rascunho a lápis para John Cullen Murph, o continuador da obra. Foster havia-o aceitado como assistente desde 1968, o que o converteria no perfeito continuador, mas ainda assim, testou outros ilustradores, como Gray Morrow e Wally Wood. Finalmente, decidiu-se por Murphy, que não seria o último ilustrador da coleção. Continuaram a história três mestres da banda desenhada (comics): Mark Schultz (Filadelfia, 1955), Gary Gianni (Chicago, 1954) e Thomas Yeates (Sacramento, 1955).

Príncipe Valente nos dias do Rei Arthur foi publicado no Brasil pela primeira vez no Suplemento Juvenil, em 1937, saindo depois no jornal O Globo, na década de 1970, e na mesma década, em revistas periódicas de diversas editoras, como RGE e GEA, sendo reeditados desde então.

A leitura da saga criada por Foster é, há mais de 80 anos, uma das histórias em banda desenhada preferidas por gerações de crianças, adolescentes e adultos. O seu êxito foi tal que a imprensa norte-americana anunciou o nascimento do primogénito de Valente e Aleta, o príncipe Arn, na relação de nascimentos. Desde então, até hoje, os leitores identificam-se com essa família lutadora e de grande coração.

Seria Príncipe Valente uma mágica e inigualável história sem fim?

Beatriz C. Montes
Doutora pela Universidade de Tours
Professora da Universidade de La Rioja

Adaptação do texto ao português europeu, por Jorge Machado-Dias

Em Portugal o Príncipe Valente de Foster, começou por ser publicado a partir do nº 46 do Jornal do Cuto, entre 1937 e 1938, como se pode ver aqui: http://bedetecaportugal.weebly.com/principe-valente.html







quinta-feira, 18 de abril de 2019

SABRINA de Nick Drnaso A CRÓNICA DE UMA IMENSA SOLIDÃO

Recorte do suplemento Ypsilon, de jornal Público, de 12 de Abril de 2019
SABRINA
De Nick Drnaso

A CRÓNICA DE UMA IMENSA SOLIDÃO 
OU COMO VIVER A DOR PRIVADA 
NA ERA DA INTERNET 

SABRINA
Nick Drnaso (Trad. José Lima), Porto Editora 

Nick Drnaso cresceu em Paios Hills, subúrbio de Chicago.

Um solitário na adolescência, só muito depois seria capaz de falar do que lhe aconteceu, os abusos sexuais a que foi sujeito por um vizinho, a depressão que se instalou, a paranóia

Sabrina tornou-se a primeira novela gráfica a Integrar a shortlist do Man Booker Prize (2018) e recebeu elogios da crítica. Nick quase treme ao dizer que talvez tenha sido apenas sorte ...

"Entendo que [o livro] possa ser lido como um comentário político, mas é difícil explicar de onde vem isso. Foi feito na boina de isolamento em que as personagens vivem, que é o modo como me sinto viver. Isolado, sem entender muito o que se passa e sem ter muito controlo do que se passa”

“É um medo permanente. Quando se trabalha num estado de isolamento durante tantos anos é como se perdesse todos os contactos com alguém que pudesse ler o que estamos a fazer. Alguma coisa se perde quando simplesmente se trabalha isoladamente"







ESTA É A NOSSA PARANÓIA

Crónica angustiante da actualidade a partir do misterioso desaparecimento de uma mulher. Há trauma, obsessão, paranóia e uma estranha normalidade reconhecível: este tempo.

Sandra, Teddy e Calvin estão unidos depois do misterioso desaparecimento de Sabrina. É uma união involuntária, com - pouco de consolador e ineficaz para mitigar a perda. Sandra desespera por não saber da irmã, Teddy cai numa depressão silenciosa por não ter explicação para o sumiço da namorada e Calvin, ao acolher em casa o amigo Teddy, fica refém de um sofrimento que não é o dele e o faz resvalar para um lugar ainda mais fundo da sua existência já afectivamente precária.

São três solidões e o isolamento de cada uma alimenta a teia de medo, paranóia e especulação que torna Sabrina um dos mais inquietantes retratos literários da actualidade e o fez ser a primeira novela gráfica a integrar a shortlist do Man Booker Prize. Não ganhou; mas terá sido o titulo mais comentado da edição de 2018.

O seu autor chama-se Nick Drnaso, tem 30 anos; nasceu nos subúrbios de Chicago e partiu da sua biografia para construir um livro acerca do trauma. Quando a primeira namorada o deixou, Nick ruiu arrastado pelo abandono e algum tempo depois estava a desenhar, com grande economia de traços, Sandra, Teddy e Calvin, e ainda Sabrina. Acrescentou personagens satélite e escreveu um enredo onde todos se movimentam de modo a ampliar a tensão necessária a um clima de suspeição que se instala e se adensa após o desaparecimento de Sabrina.

A acção inicial desenrola-se em – Chicago. Há uma conversa entre as duas irmãs. Sabrina foi passar o fim-de-semana a casa dos pais que estão fora e a irmã encontra-a a tomar cónta da gata. Conversam sobre a necessidade de Sabrina encontrar emprego; recordam a infância e, antes de sair para uma festa, Sandra tenta convencê-la a ir com ela numa viagem de bicicleta pela região dos Grandes Lagos. No plano seguinte, Teddy está sozinho.

Pediu a um amigo que não vê há anos para o acolher por uns tempos. Ninguém sabe de Sabrina e ele não sabe lidar com a ausência. Foge de Chicago e vai para Colorado Springs. Calvin, um militar que trabalha com informação secreta no Departamento de Defesa da Força Aérea, recebe-o. Vive sozinho depois de a mulher e a filha terem ido para a Flórida e sente-se divido entre a vontade de se juntar a elas e a promoção para um cargo que implica ainda mais isolamento.

Há um mistério, mas o livro não é construído na ilusão de que poderá ser resolvido. Onde está Sabrina? é um eco em todo o livro, mas secundário no sentido em· que Drnaso parece centrar-se antes no impacto desse desaparecimento na vida de Teddy, Calvin e Sandra; no modo como a ausência de informação alimenta a monstruosa máquina especulativa constituída por redes sociais, meios de informação tradicionais, extremistas que cavalgam a sua ideologia política ou religiosa em teorias-da conspiração, e o isolamento em que vivem os desesperados.

"Alguém tem culpa. Alguém anda a capitalizar em grande. Desenredar os fios, ir ao fundo da questão e denunciar os conspiradores como os ladrões assassinos que eles são: é essa a minha vocação. A tarefa da minha vida", diz a voz da rádio que vai alimentado os dias de Teddy, urna espécie de salvador de um fim catastrófico que se anuncia – e que ele anuncia – e no qual integra o mistério de Sabrina. O monstro que vive no interior de Teddy agiganta-se diante da impotência de Calvin. E, na mesma casa, Calvin e Teddy descobrem a sua incapacidade de partilhar sentimentos. Estão sozinhos no silêncio do sofá, nas refeições rápidas que Calvin leva para casa, na confusão de roupa espalhada, no refúgio em jogos de estratégia ou nas estações de rádio, um maná para múltiplas obsessões e para a diluição de fronteiras entre verdade e mentira, sonho e realidade, mundo virtual e quotidiano.

O conjunto, desenho e texto, onde se alicerça Sabrina é compulsivo. Parece próximo do cinema no modo como gere os momentos de diálogo, manipula emoções com grandes planos de rosto e cenários despojados de tudo a não ser de elementos essenciais à trama, ou alterna grandes doses de informação com o silêncio prolongado a sublinhar o vazio e a claustrofobia em que as personagens se vão afundando. E, em tudo, a inquietante certeza de que este livro, que há três ou quatro anos poderia ser lido como uma distopia, se passa no nosso tempo.




 
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