domingo, 31 de março de 2013

GAZETA DA BANDA DESENHADA (1) - NA GAZETA DAS CALDAS - À VOLTA DA PICARESCA VIAGEM DE RAPHAEL BORDALLO PINHEIRO


GAZETA DA BANDA DESENHADA (1)
NA GAZETA DAS CALDAS

Gazeta das Caldas, 29 de Março de 2013

Iniciamos esta nova rubrica da "Gazeta das Caldas" com um tema que nos remete para os primórdios da BD portuguesa e a Raphael Bordallo Pinheiro.

O texto que se reproduz abaixo é da autoria conjunta do Dr. António Dias de Deus e do Arq. Leonardo De Sá, publicado originalmente por ocasião da exposição que comissariaram, "Raphael Bordallo Pinheiro: Aos Quadradinhos", comemorando os 150 anos do nascimento do autor, apresentada entre Dezembro de 1996 e Março de 1997 na Bedeteca de Lisboa, tendo vindo parte dela a ser também mostrada no Museu de José Malhoa, em Caldas da Rainha, em Abril e Maio de 1997.

A razão da escolha deste texto deve-se ao facto de nele se explicarem as razões que levaram a considerar Apontamentos Sobre a Picaresca Viagem do Imperador de Rasilb pela Europa como sendo a primeira banda desenhada portuguesa. Foi publicado na reedição fac-similada das três edições do álbum de 1872.

A republicação deste texto deve-se também ao facto de ter sido Raphael Bordallo Pinheiro, não só um prolifero autor gráfico, mas igualmente um criador originalíssimo na área da cerâmica, adoptando Caldas da Rainha como sua “base operativa” a partir de determinada altura da sua não muito longa vida – tendo-se tornado a sua memória numa presença constante e relevante na vida desta cidade.

No entanto, a produção de Bordallo Pinheiro na banda desenhada – ou histórias aos quadradinhos, como se designava este meio da cultura popular em Portugal, antes da adopção daquela expressão, de origem francesa – não ficaria por aqui. Um outro texto dos mesmos autores, Uma Obra Esquartejada, incluído no catálogo dessa mesma exposição, será sequência lógica nesta rubrica – a apresentar aqui oportunamente – onde os leitores poderão perceber como foi também profícuo nesta área o trabalho de Bordallo.

Jorge Machado-Dias - Director do BDjornal
__________________________________________________________

À Volta d'A Picaresca Viagem 
de Raphael Bordallo Pinheiro 

António Dias de Deus e Leonardo De Sá 

Quando considerámos Apontamentos Sobre a Picaresca Viagem do Imperador de Rasilb Pela Europa, de Raphael Bordallo Pinheiro, como a primeira história aos quadradinhos portuguesa, vários factores nos levaram a tomar tal decisão.

É certo que a sequência narrativa já tinha entrado em Portugal, com as “Aventuras Sentimentais e Dramáticas do Senhor Simplício Baptista” publicadas em páginas mais ou menos contínuas da “Revista Popular”, em 1850. Porém, temos hoje a certeza que eram apenas cópias (e más cópias) de originais franceses, estando os desenhos assinados por Flora — exclusivamente gravador da versão simplificada e amputada. Em relação a Nogueira da Silva, que publicou quatro ou cinco exemplos de ilustrações sequenciais em 1856 n’”O Asmodeu” e em 1857 no “Jornal Para Rir”, o texto sobrecarregava sempre a imagem, que raramente era explícita. Manuel de Macedo tem alguns exemplos de histórias desenhadas no jornal “As Notícias” de 1866. Porém, as melhores foram pilhadas a autores estrangeiros. A única incidência nacional que lhe descobrimos não é mais do que um cartoon desdobrado em duas vinhetas.

Falta-nos falar do próprio Raphael. Admitindo que no nº 3 de “O Binóculo” (1870) haja repetição de figurantes teatrais, acontece que a relação entre os quadros não é suficientemente nítida para contar de maneira inteiramente compreensível uma história. Nas duas primeiras e na última prancha das sete folhas de “A Berlinda”, de 1870-71, admitimos que se possa encontrar alguma sequência narrativa. Todavia falta-lhe o herói, a trama consequente e até o princípio, meio e fim do acontecimento. Ainda por cima, o trabalho está meticulosamente executado, o que dificulta a articulação entre as vinhetas. Quando o crítico José-Augusto França valorizou a 7ª folha de “A Berlinda” e desvalorizou o esquematismo gráfico d'A Picaresca Viagem nós chegámos à conclusão exactamente oposta, porque uma história aos quadradinhos implica mais continuidade do que minúcia no traço.

Deste modo, decidimos a aceitar A Picaresca Viagem como o exemplo real da primeira BD portuguesa, até porque a intenção era visivelmente de contar uma história inteira, o que determinou a edição num álbum de 16 páginas. Esta história é um todo homogéneo. Raphael Bordallo Pinheiro tinha achado a forma, a fórmula e o feitio.

A importância desta história como génese da banda desenhada portuguesa é bem explícita na explosão criativa posterior — quer em Raphael, quer nos seus seguidores e imitadores.
_________________________________________________

Por duas vezes D. Pedro II, último Imperador do Brasil, visitou a Europa. Da primeira vez, em 1871 (registada n'A Picaresca Viagem, pois Rasilb é evidentemente um anagrama), deslocou-se a Vale de Lobos para cumprimentar o “azeiteiro” Alexandre Herculano. Prosseguiria depois pelo resto do continente, ao encontro dos Imperadores que ainda havia e das sociedades científicas (era um fraquinho que tinha...). Quando veio outra vez à Europa, Alexandre Herculano, comovido pela visita anterior, deslocou-se expressamente a Lisboa. A estadia do historiador na capital saiu-lhe mal: arranjou uma pneumonia que o levou desta para melhor...

No álbum, Portugal dá pelo nome de Vale de Andorra Júnior (“país onde a democracia e as laranjas são originárias da China”) e o Imperador-democrata quase sempre anda com chinelos, xaile e joalheiras rotas — apesar de ser rico na vida real. Os que ficam mais ridicularizados são as academias filarmónicas, ministérios, etc.; farto deste país, safa-se para meio dos alemães, onde despreza a França, e depois vai conviver com os franceses, onde menospreza a Alemanha (a guerra entre as duas potências acabara há pouco). Aprende a dançar o “French cancan”. Salta para Inglaterra, onde vai à ópera do Covent Garden, mas não tem trajos de pompa e circunstância, pelo que é posto na rua a pontapés. Visita de bicicleta rapidamente a Itália, a Grécia, o Egipto, a Palestina, a Ásia Maior, a Menor e as outras.

De volta ao Vale de Andorra Júnior, após uma passagem pela cavalheira Espanha, a sabujice dos habitantes faz substituir por um papagaio — símbolo da sapiência imperial — a estátua de D. José, e a de Gil Vicente no Teatro Nacional D. Maria II é trocada pela figura do próprio Imperador de Rasilb, vestida folcloricamente de cacique índio (com todos os preparativos contados dentro dum grande parêntesis). A recepção pública foi imponente: as iluminações festivas eram deslumbrantes — representadas como uma grande mancha preta com umas pintinhas de branco! E continuaram do mesmo jeito por várias noitadas...

O Imperador vai ainda a Tróia de Vale de Andorra Júnior (Porto, a rival da cidade fundada por Ulisses), onde consome uma grande quantidade de tripas à moda da terra. De novo na capital, lava-se no chafariz de Fora, come iscas, peixe frito (na zona das Hortas), e recebe as últimas láureas. Regressado às suas terras, escreve e ilustra o seu diário. E ao mundo de relembrar e admirar os maiores homens da história: as térmitas prussianas, o Imperador da Alemanha e o chanceler Bismarck metamorfoseado em caracol e, enfim, o próprio soberano de Rasilb...
____________________________________________________

Em suma, esta narrativa lê-se em continuidade, porque Raphael — então apenas com 26 anos — ainda só estava a afiar o gume da sua veia satírica, e não há cartoons destacados no meio desta autêntica história aos quadradinhos. O álbum teve uma “segunda edicção” quase inteiramente redesenhada — exceptuando as páginas 14 e 15, idênticas à 1ª edição — e com a composição ligeiramente alterada. Raphael teria talvez pretendido melhorar a versão inicial, visto o seu evidente sucesso; ou, de forma mais simples, as chapas litográficas originais estariam possivelmente inutilizáveis. Houve ainda uma “terceira edicção” definitiva, apenas com algumas correcções no texto tipográfico (mantendo a menção “2ª edicção” no cabeçalho da página 2). Todas as versões datam do mesmo ano de 1872.

De notar que D. Pedro II nunca se ofendeu com Raphael Bordallo Pinheiro, decorrendo parte da carreira deste no Brasil, a partir de 1875. Tudo acabou em bem, porque todos eram boas pessoas.



____________________________________________________

No próximo texto da Gazeta da BD, abordaremos a Tertúlia da Banda Desenhada de Lisboa, organizada por Geraldes Lino e que vai fazer 28 anos em Junho próximo. A TBDL regista 344 Encontros desde Junho de 1985 a Fevereiro de 2013, sempre com um Encontro mensal – na primeira terça-feira de cada mês –, contando invariavelmente com cerca de 35 a 40 participantes.

É a história deste Encontro mensal dos bedéfilos portugueses – autores, pesquisadores, historiadores da BD, jornalistas, editores, ou simplesmente leitores deste meio da cultura popular – que iremos debitar aqui.

Alguns dos participantes que vão à Tertúlia actualmente, ainda não eram nascidos quando ela se iniciou, o que mostra a grande capacidade de renovação de gerações que a Banda Desenhada proporciona.

Geraldes Lino edita regularmente um fanzine para estes Encontros, o “Tertúlia BDzine” – que vai no nº 175, em 5 de Fevereiro de 2013 – oferecido a todos os tertulianos. Aqui fica a imagem da capa do “TBDzine” nº 93, de Junho de 2005, no 20º aniversário da TBDL, com uma BD de Andreia Rechena.


____________________________________________________


sábado, 30 de março de 2013

MORREU JOBAT - JOSÉ BAPTISTA (1935-2013)


João José André Baptista "Jobat" (18/12/1935 - 29/03/2013)

MORREU JOBAT - JOSÉ BAPTISTA 
(1935-2013)

Recebemos hoje um comentário, para ser publicado no primeiro post de Jobat no Louletano de 31 de Julho de 2011, que informava:

Morreu ontem às 7:00h no hospital de Faro vítima de um tumor nos intestinos e posterior infeção João José André Batista "Jobat".
____________________________________________________

João José André Baptista nasceu em Loulé, a 18 de Dezembro de 1935, e frequentou o curso de Desenhador-Litógrafo na Escola de Artes Decorativas António Arroio em Lisboa, a cargo dos mestres Mendes e Rodrigues Alves.

Com 18 anos, entrou para a Agência Portuguesa de Revistas, como paginador e retocador de revistas de quadradinhos, desenhando durante duas décadas grande quantidade de "bonecos" para as várias publicações da editora. Fez poucas histórias aos quadradinhos, começando com uma adaptação de "Ulisses", para a Colecção Condor, em 1956. Na Colecção Audácia realizou "A Conquista de Santarém" e para o Mundo de Aventuras (2ª série) nos 437 e 452 produziu "O Voto de Afonso Domingues" e "Luís Vilar", em 1958, assim como outro episódio desta última série detectivesca ainda nesse ano no Condor Popular.

José Baptista e Carlos Alberto em 1958

 Na Agência Portuguesa de Revistas, 1956

Na Agência Portuguesa de Revistas, 30/11/1963

Primeira página do ULISSES, de Jobat. Integralmente republicado no Kuentro.

Durante a década seguinte dedicar-se-ia à ilustração de capas e de livros, à legendagem e à remontagem de material estrangeiro para publicação nas revistas da APR.

Executou diversas colecções de cromos, nomeadamente uma adaptação de A Morgadinha dos Canaviais. Trabalhando sempre para a APR, começou a colaborar com Roussado Pinto desde o início do Jornal do Cuto, em 1971, ilustrando poemas de Raúl Correia. No n° 49 dessa revista publicou a curta história "Trinca-Fortes", assinando "Jobat", experiência que o encorajou a realizar uma maior adaptação de "A Vida Apaixonada e Apaixonante de Camões", com argumento de Michel Gérac, em quarenta pranchas publicadas no Diário Popular, entre Setembro e Novembro de 1972, e posteriormente em álbum em língua francesa (!), publicado pela SEIT. Nesse ano, contactou a IPC Magazines (Fleetway), desenhando para a editora britânica vários comics com temas inspirados na Segunda Guerra Mundial, inéditos em Portugal.


Em 1973, passou a chefiar a redacção do Jornal do Cuto, coordenando também outras edições da Portugal Press, até à primeira suspensão da revista, em Abril de 1974.

Em Abril e Maio de 1975 realizou no jornal Diário Popular a série "25 de Abril: Requiem para uma Ditadura", que ficaria inacabada apesar de tentativas para a completar para o semanário Uniluta. Em 1976, regressou a Loulé, dedicando-se agora à cerâmica decorativa e outras actividades ligadas às artes gráficas, à decoração para os desfiles do Carnaval, ao ensino de Educação Visual nas escolas, sendo responsável gráfico pela revista anual Al’UIyã e pela Agenda Cultural daquele município, e escrevendo ainda alguns artigos sobre banda desenhada. 

Leonardo De Sá in Dicionário dos Autores de Banda Desenhada e Cartoon em Portugal, de Leonardo De Sá e António Dias de Deus, Edições Época de Ouro, 1999
_____________________________________________

A partir de 30 de Março de 2004, José Baptista iniciou, como coordenador, a rubrica de banda desenhada “9.ª Arte - Memórias da Banda Desenhada”, no semanário O Louletano (tendo anteriormente publicado a reedição da sua versão em banda desenhada de Camões).

Foi homenageado pelo conjunto da sua obra no Moura BD 2005, tendo-lhe sido outorgado o Troféu "Balanito de Honra". 


José Baptista durante um jantar no decorrer do Salão de Moura de 2005 - desafiaram-no a desenhar e Jobat, mesmo dizendo que já não tinha "mão", lá desenhou um duelo no farwest.



_____________________________________________

O Kuentro começou a republicar as páginas da rubrica “9.ª Arte - Memórias da Banda Desenhada”, a partir do seu primeiro número, no post de 31 de Julho de 2011, tendo prosseguido a republicação até à página originalmente publicada a 16 de Julho de 2007, nesta última semana (dia 2 de Abril), faltando republicar apenas três das que Jobat nos enviou. As seguintes já nos foram prometidas por outros amigos. Ver AQUI o primeiro post.

________________________________________________________


sexta-feira, 29 de março de 2013

NOVO LIVRO DE TOPEDRO NA LIVRARIA PEDRANOCHARCO ONLINE



NOVO LIVRO DE TOPEDRO 
NA LIVRARIA PEDRANOCHARCO ONLINE

Prosseguindo a sua produção em edição de autor, Topedro editou um novo volume autobiográfico, que já está na livraria Pedranocharco online.

Aqui ficam todos os livros de Topedro - à venda AQUI na livraria online (excepto O Nome do Pai). Entretanto aproveito para informar que os livros de Manara e Crepax, colocados na quarta-feira na loja, já foram vendidos.

A MINHA AVÓ CONCEIÇÃO
2013 
Formato 14,4 x 21 cm, 50 págs. a preto e branco. 
Preço: 8 € 



O PEQUENO OUTRO (BIOGRA FRIA) 
2012
Formato: 15 x 21 cm - 100 págs.  
Preço: 10 € 




Tópedro surpreende-nos com esta nova edição de O NOME DO PAI (Auto Grafia) 2012, agora com mais 40 páginas e reintitulado O PEQUENO OUTRO (Biogra Fria) 2012.


O NOME DO PAI (AUTO-GRAFIA) 
Formato 15 x 23 cm, 60 págs., preto e branco 
2012 
Ler texto sobre este livro, por Pedro Cleto em As Leituras do Pedro 

FRAGMENTOS (ensaio gráfico)
2012 
40 págs., 21 x 21 cms, a cores 
Preço: 12 € 


Cada página apresenta apenas um desenho: numa primeira fase, representam-se cenas da vida quotidiana: levantar-se, tomar o pequeno-almoço, alguns afazeres caseiros de trabalho, a higiene, sair de casa. Um interregno desse ritual é interrompido por um rol de filósofos e pensadores (Schopenhauer, Derrida, Wittgenstein, Freud), com curtas frases jocosas reduzindo ad absurdum as suas respectivas Weltanschauungen. E um terceiro e último ciclo multiplica-se em cenas de um quotidiano nacional que ausculta as tensões sociais e económicas, as estratégias políticas e financeiras, e que tanto revelam de realista como de generalista.

Pedro Moura em LerBD

MORES ET ALL 
2011 
34 págs. A P&B – Formato 14,5 x 21 cm - Edição 2011 
Preço: 5 € 



Estas histórias mergulham, então, em discursos abstractos, filosóficos, mas sempre procurando que ligações são possíveis de lhes dar um peso ou uma gravidade terrena, à escala humana. Procura-se menos uma transcendência absoluta e poética do que a beleza da imanência humana. Isso está reforçado no que se poderia chamar de segunda parte do livro, de um tom mais autobiográfico e mais contextualizado de forma concreta.

Pedro Moura em LerBD

O CÉU É MEU É MEU O MAR 
de Topedro e Stefana 
2011 
44 págs a cores – Formato 23 x 17,5 cm 
Versões em português e inglês (The Sky is mine mine is The Sea) 
Adaptação de The Daughter of Time, de Stefana Serafina (2008)  
Preço: 12 € 



Este pequeno livro, oblongo, tem duas partes, separáveis e identificáveis fisicamente. Uma a que daremos o nome de “ficção”. A outra a que chamaremos de “explicação”. A primeira é-nos narrada por um narrador, tal qual, a segunda, pelo autor. A primeira pauta-se pelos contornos da ficção, a segunda tenta apresentar elos à realidade. A parte da ficção revela-se ser uma adaptação de um texto de Stefana Serafina, “The Daughter of Time”. Pequeno melodrama entre um professor de artes visuais norte-americano a dar aulas na FBAUL e uma das suas alunas, que se apaixona por ele, aventuras e fuga para a Zambujeira. A parte “explicativa” revela-se como diário do autor (António Pedro Monteiro Ribeiro, assinando Topedro), em que se explora um momento fugaz de férias na Zambujeira, quando o autor se cruza com uma vizinhas de arrendamento, búlgaras (uma delas, Stefana Serafina), e estas lhe enviam mais tarde, como forma de agradecimento e resposta a um breve desentendimento, “um argumento para um filme inspirado na minha figura”. Apesar do autor terminar com uma nota auto-derisória (“vanitas vanitatum…”), o jogo de reflexos entre as pessoas envolvidas é por demais claro. Retornos e devoluções de vários actos criativos cruzados, da realidade para a ficção e de regresso à realidade (ou vice-versa, o que não é a mesma coisa).

Pedro Moura em LerBD

__________________________________________________

quinta-feira, 28 de março de 2013

BDpress #357: BANDA DESENHADA SOBRE ERRO MÉDICO ESTREIA-SE NUMA PRESTIGIADA REVISTA CLÍNICA



BANDA DESENHADA 
SOBRE ERRO MÉDICO 
ESTREIA-SE NUMA PRESTIGIADA REVISTA CLÍNICA

Público online, 20/03/2013 

Ana Gerschenfeld 

Um médico e um ilustrador publicaram um "artigo" aos quadradinhos numa revista clínica. Vai haver novelas gráficas nas publicações médicas e científicas? 


A história intitula-se Missed It (algo como "passou-me ao lado") e foi publicada na penúltima edição da revista Annals of Internal Medicine. Foi a primeira vez que esta prestigiada publicação do American College of Physicians - a quarta no ranking mundial das revistas médicas segundo dados oficiais de 2011 - dedicou cinco páginas da sua edição a um artigo diferente de todos os outros. Um artigo que, em vez de muito texto indigesto pespontado por algumas imagens igualmente técnicas, como é habitual nas publicações especializadas, tem muitos bonecos e parcos diálogos. Uma banda desenhada, a preto e branco, num estilo que lembra os clássicos comics.

Todavia, a sua publicação foi tudo menos irrelevante. Como explica a revista médica no editorial da sua edição de 5 de Março, "recebemos [o] primeiro manuscrito neste formato enquanto estávamos a começar a rever os manuscritos para um suplemento sobre a segurança dos doentes" (suplemento, esse, que foi publicado na referida edição).

"Por um feliz acaso, a novela gráfica contava a história de um erro de diagnóstico que iria assombrar um médico ao longo de toda a sua vida profissional", lê-se ainda no editorial. "E como vários artigos do suplemento abordavam estratégias para evitar o tipo de erro clínico descrito com tanto realismo neste singular artigo "gráfico", achamos adequado publicá-lo."

A história aos quadradinhos foi escrita por Michael Green, professor de medicina da Universidade Estadual da Pensilvânia (EUA) - e desenhada por Ray Rieck, ilustrador freelance e colega de Green naquela universidade. E aborda um tema que provavelmente todos os clínicos receiam (ou recearam) viver em carne própria. E que Green, de facto, viveu. "A história é autobiográfica. Aconteceu há cerca de 20 anos, quando estava a fazer a minha formação médica", disse Green ao PÚBLICO.

É a primeira vez que um artigo deste tipo é publicado numa revista como esta? "Tanto quanto sei", responde-nos o autor - que lecciona, em particular, aulas sobre medicina e banda desenhada aos estudantes de medicina -,"é de facto a primeira vez que uma banda desenhada é publicada numa revista médica de cariz clínico".

Sem revelar demasiados pormenores: um jovem médico está de banco no hospital, à espera de conseguir dormir umas horas nessa noite, quando recebe um telefonema a dizer que tem de ir examinar um doente que acabou de dar entrada na urgência. Ao longo da noite, o doente, que sofre aparentemente de um problema pulmonar, piora apesar dos tratamentos que lhe vão sendo administrados. E acaba por morrer. A seguir, quando o médico recebe o resultado da autópsia, percebe que não soube ver um sintoma-chave do doente (um sopro cardíaco), apesar de ter estado, literalmente, à frente do seu nariz. Fez um diagnóstico errado - um erro fatal.


Por enquanto, Green não sabe se vai escrever novos episódios - e os Annals of Internal Medicine também não sabem se "esta será a primeira ou se será a única novela gráfica a ser publicada" na revista. Isso dependerá, em parte, da reacção dos leitores a esta inovação.

"Há muito tempo que sentia que a banda desenhada é uma forma ideal de contar histórias que têm um impacto emocional", confiou entretanto Green à revista Science. "Os médicos estão habituados a contar e a ouvir histórias e pensei que tinha chegado a altura de experimentar novas maneiras de contar essas histórias."

E ao PÚBLICO, salienta: "Acho que os comics são uma excelente ferramenta pedagógica - e que têm lugar na sala de aula. E não me surpreenderia nada que começássemos a ver surgir mais histórias em formato de banda desenhada a descrever a experiência de uma doença, de um médico ou outras coisas do género."

A BD está acessível na íntegra, mediante pagamento, em http://annals.org/article.aspx?articleid=1656688 (é contudo possível visualizar gratuitamente a totalidade da primeira página). E daqui a seis meses, informou-nos uma porta-voz da revista, ficará no domínio público.





____________________________________________________

quarta-feira, 27 de março de 2013

NOVOS LIVROS NA LIVRARIA PEDRANOCHARCO ONLINE - O EROTISMO DE GUIDO CREPAX E MILO MANARA



NOVOS LIVROS NA LIVRARIA PEDRANOCHARCO ONLINE
O EROTISMO 
DE GUIDO CREPAX E MILO MANARA

Foram agora colocados à venda AQUI na livraria Pedranocharco online dois livros “usados” (ou seja, comprados em duplicado, por isso estão novos), de Milo Manara: O Pintor e a Modelo e HP & Giuseppe Bergman, tomo 1 - O Mestre de Veneza , editados em 2003 e 2006, espectivamente pelas edições Asa. Juntamos estes dois livros a Emmanuelle, de Guido Crepax, editado em francês pela Delcourt, em 2009, formando um trio de livros de BD erótica que temos à disposição na livraria online.

A constatação de que tínhamos aqueles dois livros de Manara em duplicado, deve-se ao facto de estarmos a tentar fazer a lista de todos os livros do autor editados em Portugal (ou em português - incluindo edições brasileiras) e havermos constatado que grande maioria das suas obras nunca chegou à edição portuguesa.
___________________________________________________

O PINTOR E A MODELO
de Milo Manara 


Álbum cartonado, formato 24 x 31 cm, 122 págs., a cores. 
Edições Asa, 2003 - USADO (como novo) 

PRÓLOGO
(de O Pintor e a Modelo - de Milo Manara) 

Recordo-me, quando era ainda jovem, da modelo da minha turma no liceu artístico.
Chamava-se Suzy.

Recordo-a com afectuosa gratidão, pelas longas horas que permanecia imóvel junto ao grande forno de cerâmica. Nessa época, quando nos referíamos a uma modelo, não era uma top-model que nos ocorria.

Hoje, as modelos são essas jovens de extrema beleza que desfilam com porte altivo e a mesma passada sinuosa, qualquer que seja a extravagância que envergam; heroínas de um mundo fabuloso de luxo, de riqueza, de transgressão e de celebridade, sempre suspenso algures entre dois aviões. Nessa época, contudo, as modelos eram raparigas "não íntegras", que se dispunham a posar nuas a troco de quase nada e que eram consideradas mais próximas do mundo da prostituição do que do da arte. Na verdade, a história das modelos está indissociavelmente ligada à história da arte e o seu papel assume uma importância capital para a nossa civilização. Quantas obras-primas fundamentais não lhes são devidas! Sempre dispostas a cumular os artistas de honras e tributos, todos nós, no entanto, nos parecemos esquecer delas.

Assim, esta minha obra pretende ser uma modesta tentativa de reconhecimento. Tentei passar em revista a história da arte através das suas modelos, do seu nome, da sua história pessoal, para demonstrar que todas possuíam algo mais do que um mero corpo e até que ponto, num dado momento, cada uma delas constituiu uma genuína fonte de inspiração para cada artista. A vasta quantidade de elementos obrigou-me a limitar esta pesquisa a alguns exemplos. Optei por escolher os mais emblemáticos.

Como a mítica Frinéia, musa de Praxíteles. Ou Artemísia Gentileschi, que foi modelo de si própria. Ou o caso, ainda mais comovente, da Morte da Virgem, de Caravaggio: a modelo foi recolhida do Tibre onde se tinha afogado e foi retratada assim, com o ventre inchado pela água, mas preservando ainda uma beleza intensa capaz de, até na morte, inspirar o artista.

Modelo até ao fim. Chamava-se Phyllis.

Esta obra é-lhe dedicada.

Milo Manara



___________________________________________________

HP & GIUSEPPE BERGMAN, TOMO 1
O MESTRE DE VENEZA
de Milo Manara 


página da edição americana

Álbum cartonado, formato 24 x 31,5 cm, 48 págs., a preto e branco. 
Edições Asa, 2006 - USADO (como novo) 
HP & Giuseppe Bergman começou a ser publicado na revista (A Suivre) nº 9, de 1978. 


___________________________________________________

EMMANUELLE
de Guido Crepax 



Adaptação em banda desenhada criada por Emmanuelle Arsan no livro The Joys of a Woman, e desenhada por Guido Crepax 

Álbum cartonado NOVO, formato 22,50 x 30 cm – 136 págs. a preto e branco 
Edição Delcourt, 2009, Bélgica – em francês 

Guido Crepax 

Guido Crepax nasceu no ano de 1933, em Milão, onde viveu, trabalhou e morreu, em 31 de Julho de 2003.
Era arquitecto mas nunca exerceu a profissão, tendo-se dedicado, ainda estudante, às artes gráficas publicitárias e à ilustração.

Em 1965 escreveu e desenhou a sua primeira história em banda desenhada, com a personagem Valentina, ainda hoje protagonista de várias aventuras, recolhidas em 16 álbuns.

Crepax inventou, mais tarde, outras heroínas de banda desenhada: Bianca, Anita, Giulietta, Belinda e Francesca, e desenhou também adaptações de livros de ouros autores como História de O, Emmanuelle, Drácula, Dr. Jeckyll e Mr. Hyde, entre outros.

Veio ainda a publicar histórias baseadas na Nova Justina, de Sade, na Vénus das Peles , de Leopold von Sacher-Masoch e um episódio das Memórias de Casanova.

No campo das artes plásticas propriamente ditas, Crepax assinou uma centena de obras, entre litografias e serigrafias.

_______________________________________________________

  

terça-feira, 26 de março de 2013

JOBAT NO LOULETANO — 9ª ARTE — MEMÓRIAS DA BANDA DESENHADA (XCVIII e XCIX) — JOSÉ RUY SOBRE EDUARDO TEIXEIRA COELHO (19 e 20)





NONA ARTE 
MEMÓRIAS DA BANDA DESENHADA 
(XCVIII - XCVIX) 

O Louletano, 9 de Julho de 2007 

O ARTISTA, O MESTRE, O COMPANHEIRO, O AMIGO - 19
Recordações de Tertúlia confidenciadas por José Ruy 

» Por volta de 1953 quando estavam em publicação os jornais infantis «O Mosquito», «O Cavaleiro Andante» e o «Mundo de Aventuras», saiu uma lei que obrigava as publicações do género a incluírem o mínimo de 70% de colaboração portuguesa. O normal era a inclusão de 90% de material estrangeiro. Os directores destes jornais foram logo a quem de direito expor que não era possível cumprir a lei, por falta de artistas portugueses com nível para tal proporção de trabalho. No «Mosquito» estava o Eduardo T. Coelho; no «Cavaleiro Andante» o Fernando Bento e no «Mundo de Aventuras» o Victor Peon. E pronto! Não havia mais ninguém. Foi-nos contado isto por um amigo que estivera nessa reunião, e como é natural, ficámos fulos com esta maneira simplicista de resolver o problema. E começámos a reunir «peças». Desenhadores já com um certo nível, naturalmente que havia. Para escrever argumentos também. E a partir daí, começámos a pensar em fazer um jornal infanto-juvenil só com colaboração portuguesa, e com nível.

A oficina que tinha sido do «Mosquito» na Travessa de S. Pedro, encontrava-se parada, pois estava alugada à redacção do «Camarada», publicação suspensa na altura. O jornal «O Mosquito» com a partida do Cardoso Lopes para o Brasil estava a fazer-se noutra oficina, dirigido só pelo Raul Correia, na Editorial Organizações.

Pensámos pôr essa antiga oficina do «Mosquito» a funcionar de novo... As cores continuariam a meu cargo, executadas nas chapas de offset pelo sistema litográfico. Como colaboradores literários dispúnhamos do Padinha, do Orlando Marques e do Lúcio Cardador. Para a parte artística contávamos com uma boa equipa que já estava a dar mostras de um bom nível: Fernando Bento, Victor Peon, Fernandes Silva, Victor Silva, José Garces, Artur Correia, o Coelho e eu. Claro que à partida não tínhamos contactado com outros elementos literários, devido à sua vinculação em publicações no activo, como Roussado Pinto, Simões Muler, Raul Correia, Artur Varatojo... 

Como não tínhamos dinheiro, fomos à redacção do «Camarada» expor a ideia. »»

"Peregrinação de Fernão Mendes Pinto". Tira da história inédita, desenhada por Eduardo Teixeira Coelho especialmente para a 1ª exposição portuguesa de histórias aos quadradinhos e ilustração infantil, em 1952.

____________________________________________________

O Louletano, 16 de Julho de 2007 

O ARTISTA, O MESTRE, O COMPANHEIRO, O AMIGO - 20
Recordações de Tertúlia confidenciadas por José Ruy 

» Fomos bem recebidos na redacção do «Camarada», tanto mais que nos propúnhamos anular o prejuízo que a oficina causava estando parada. O E.T. Coelho mostrou os originais das ilustrações para os contos de Eça de Queiroz que maravilharam os responsáveis, que como não liam «O Mosquito» não conheciam ainda o trabalho. Discutiu-se o nome do jornal, e ficou assente que se chamaria «O Li­dador». Diziam eles que seria uma réplica ao «Cavaleiro Andante».

Concordámos, pois era um nome que soava bem. Umas semanas mais tarde mudaram de opinião, e resolveram sair com a 2ª série do «Camarada» nuns moldes idênticos aos da 1ª série.

capa do nº 1 - 2ª série - do "Camarada"

Quantas vezes tenho pensado como este «Lidador» teria alterado a posição das publicações infanto-infantis em Portugal... se tivesse chegado a sair. Nós pensámos criar uma espécie de coo­perativa. Os lucros que a publicação tivesse, a partir de pagas as despesas, seriam equitativamente distribuídos por todos os colaboradores. Isto dava um enorme incentivo para que cada um se aperfeiçoasse o mais possível no seu trabalho, pois estávamos directamente interessados no êxito da revista.

Poucos meses passados, e porque «O Mosquito» já tinha também suspendido a sua publicação, ten­támos ressuscitá-lo pela mesma forma. Agora, seria um jornal mais modesto em formato e número de páginas: 15x21 cm., a três co­res, trabalho manual, com oito páginas, custando uma moeda de 50 centavos, moe­da mágica que tinha sido, uma dezena de anos antes, utilizada pelo Cardoso Lopes... Nesta altura, o E. T. Coelho estava a decidir o seu futuro nesta terra. Para esta iniciativa, chegou a criar desenhos que se têm mantido inéditos até hoje. Uma pequena história d'O Mosquito a dar uma lição a um urso lambareiro, no seu estilo cómico tão fresco e cheio de movimento expressivo. Também para esse «Mosquito», ele concebeu e realizou «Marina e o Papagaio» mais tarde publicada pelo nosso amigo Roussado Pinto no Fomento de Publicações, em álbum.

Mais uma vez esta tentativa se gorou. E o E. T. Coelho partiu...

Esta pequena história inédita de E.T.C, destinava-se a meia página e os textos eram os seguintes: Títu­lo - «Para quem gosta de coisas doces». 1 - «Terás um bolo enorme e doce como tu nunca provaste!». 2 - «Têm amêndoas, passas, chocolates, cremes...». 3 - «Supõe-te a comer grandes fatias, doces como mel e até me sinto mal ao contar-te isto!» 4 - «Mas para isso tens que comer a sopa primeiro e comê-la toda!»

____________________________________________________

25 e 26

Baseado no conto de Eça de Queiroz 
Desenhos de Eduardo Teixeira Coelho



____________________________________________________

 
Locations of visitors to this page