domingo, 6 de outubro de 2013

COM O ZÉ DAS PAPAS (de Bordallo Pinheiro) 33 – SOPAS E CREMES

O Zé das  papas, de Raphael Bordallo Pinheiro

ZÉ DAS PAPAS - 33

SOPAS E CREMES

in Gazeta das Caldas 4 de Outubro de 2013

As sopas, a que a dieta medi­terrânica devolveu ao seu legítimo papel "regulador", constituíram, durante muito tempo, a única refei­ção nocturna.

São usualmente divididas em vários grupos, a saber: claras/consommés, espessas/aveludadas ou cremes/natas/purés, de verduras, especiais e nacionais.

A primeira colherada é nas sopas claras, caldos (carne, galinha, peixe e mariscos), consommés, servidos com alguma decoração. Os ingre­dientes básicos são ossos bovinos, carne de vitela, aves, caça, espinhas de peixes ou verduras como por exemplo cebola dourada, cortada ao melo e com uma casca para dar cor e condimento. O nome do caldo depende dos seus ingredientes, daí os caldo de carne, galinha, peixe e marisco.

Nos consommés temos o consommé de aves, o de caça e o consommé de peixes.

Refiro alguns dos derivados: o aurora, com puré de tomate e aipo, o brunesa, cujo nome advém do tipo de corte dos legumes, o alho porro, a cenoura e o aipo, colocando como decoração cerefólio, o cármen colori­do, com puré de tomate, adicionando pedaços de tomate, em cubos, tiras de pimento verde, arroz e folhas de salsa, o celestine com tiras de pan­quecas. Dos consommés derivados há-os com história, como o consom­mé Du Barry, preferido da condessa do mesmo nome, favorita de Luis XV de França, que leva flores de couve-flor e é aveludado com natas.

Consom­mé Du Barry

Metemos, agora, a colher nas sopas espessas/aveludados ou cre­mes/purés.

Pertencem a esta categoria todas as sopas engrossadas com verduras, arroz, farinha e grãos de cereais ou batata. Em algumas ocasiões utilizam-se natas, manteiga ou ovos para realçar o sabor da sopa.

Os aveludados são preparados com um roux (mistura de farinha e manteiga em partes iguais, mais ou menos escura conforme o tempo de cozedura) e refinam-se com uma ligação de natas, gema de ovo e leite.

Tendo como base os aveludados, podem confeccionar-se, também, os seguintes derivados: Velouté Agnes Sorel (favorita de Carlos VII, de França) - com cogumelos, tiras de língua de vaca cozidas e tiras de peito de frango, Velouté Argenteuil (localidade do Val d'Oise conhecida pelo cultivo de espargos), que leva pontas de espargos e folhas de ce­refólio como complemento, Velouté Hamilton (de cevada com curry e brunesa de verduras), velouté de Cogumelos, com cogumelos cortados finos e guisados, velouté de Marisco, com bisque (caldo de marisco).

Velouté Agnes Sorel - em cima, início da preparação - em baixo, o resultado final

Velouté Argenteuil

Escolhi uma sopa emblemática para fecho de crónica.

Tive em atenção o papel da França no panorama gastronómico interna­cional. Tive, igualmente, em conta a nome de Paul Bocuse, considerado a alma da "nouvelle cuisine"!

Descendente de uma linhagem de restauradores e cozinheiros, que viveram nas margens do Saône a partir de 1765, Paul Bocuse criou, por ocasião da entrega da Legião de Honra que lhe foi atribuída, pelo Pre­sidente da República francesa Valéry Giscard d'Estaing, e pela primeira vez a um cozinheiro, a sopa Eliseé, nome da residência oficial. A sua história é simples: numa jornada de caça na Alsácia, inspirado na empada de frango inglesa, outro cozinheiro, Paul Haeberlin, serviu a Paul Bocuse uma trufa coberta por um folhado ligeiro. Bocuse também não esqueceu o caldo de frango e de vaca que provara com camponeses de Ardêche que a acompanhavam de trufas raladas. "Apenas misturei as duas receitas", disse a Valéry Giscard d'Estaing quando lhe contou a história.

Soupe Elisée de trufas negras

João Reboredo
joaoreboredo@gmail.com

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