O Zé das papas, de Raphael Bordallo Pinheiro
ZÉ DAS PAPAS - 33
SOPAS E CREMES
in Gazeta das Caldas 4 de Outubro de 2013
As sopas, a que a dieta mediterrânica devolveu ao seu legítimo papel "regulador", constituíram, durante muito tempo, a única refeição nocturna.
São usualmente divididas em vários grupos, a saber: claras/consommés, espessas/aveludadas ou cremes/natas/purés, de verduras, especiais e nacionais.
A primeira colherada é nas sopas claras, caldos (carne, galinha, peixe e mariscos), consommés, servidos com alguma decoração. Os ingredientes básicos são ossos bovinos, carne de vitela, aves, caça, espinhas de peixes ou verduras como por exemplo cebola dourada, cortada ao melo e com uma casca para dar cor e condimento. O nome do caldo depende dos seus ingredientes, daí os caldo de carne, galinha, peixe e marisco.
Nos consommés temos o consommé de aves, o de caça e o consommé de peixes.
Refiro alguns dos derivados: o aurora, com puré de tomate e aipo, o brunesa, cujo nome advém do tipo de corte dos legumes, o alho porro, a cenoura e o aipo, colocando como decoração cerefólio, o cármen colorido, com puré de tomate, adicionando pedaços de tomate, em cubos, tiras de pimento verde, arroz e folhas de salsa, o celestine com tiras de panquecas. Dos consommés derivados há-os com história, como o consommé Du Barry, preferido da condessa do mesmo nome, favorita de Luis XV de França, que leva flores de couve-flor e é aveludado com natas.
Consommé Du Barry
Pertencem a esta categoria todas as sopas engrossadas com verduras, arroz, farinha e grãos de cereais ou batata. Em algumas ocasiões utilizam-se natas, manteiga ou ovos para realçar o sabor da sopa.
Os aveludados são preparados com um roux (mistura de farinha e manteiga em partes iguais, mais ou menos escura conforme o tempo de cozedura) e refinam-se com uma ligação de natas, gema de ovo e leite.
Tendo como base os aveludados, podem confeccionar-se, também, os seguintes derivados: Velouté Agnes Sorel (favorita de Carlos VII, de França) - com cogumelos, tiras de língua de vaca cozidas e tiras de peito de frango, Velouté Argenteuil (localidade do Val d'Oise conhecida pelo cultivo de espargos), que leva pontas de espargos e folhas de cerefólio como complemento, Velouté Hamilton (de cevada com curry e brunesa de verduras), velouté de Cogumelos, com cogumelos cortados finos e guisados, velouté de Marisco, com bisque (caldo de marisco).
Velouté Agnes Sorel - em cima, início da preparação - em baixo, o resultado final
Velouté Argenteuil
Tive em atenção o papel da França no panorama gastronómico internacional. Tive, igualmente, em conta a nome de Paul Bocuse, considerado a alma da "nouvelle cuisine"!
Descendente de uma linhagem de restauradores e cozinheiros, que viveram nas margens do Saône a partir de 1765, Paul Bocuse criou, por ocasião da entrega da Legião de Honra que lhe foi atribuída, pelo Presidente da República francesa Valéry Giscard d'Estaing, e pela primeira vez a um cozinheiro, a sopa Eliseé, nome da residência oficial. A sua história é simples: numa jornada de caça na Alsácia, inspirado na empada de frango inglesa, outro cozinheiro, Paul Haeberlin, serviu a Paul Bocuse uma trufa coberta por um folhado ligeiro. Bocuse também não esqueceu o caldo de frango e de vaca que provara com camponeses de Ardêche que a acompanhavam de trufas raladas. "Apenas misturei as duas receitas", disse a Valéry Giscard d'Estaing quando lhe contou a história.
Soupe Elisée de trufas negras
João Reboredo
joaoreboredo@gmail.com
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