JOKER
O HOMEM QUE RI
Já dizia Hitchcock que o sucesso de um filme dependia muito do carisma do vilão. E, na galeria de inimigos do Batman, não há vilão mais carismático do que o Joker. O imprevisível arlequim tem sido o principal antagonista do Batman ao longo de quase oitenta anos, e nas duas histórias que compõem este volume, o protagonismo é todo dele como personagem principal, eclipsando o Cavaleiro das Trevas com o brilho da sua loucura. São duas histórias que a DC celebra com o lançamento de uma edição nova de Joker (uma Tenth Anniversary Edition), numa edição de luxo, e já sob a marca do seu selo Black Label, onde serão incluídas histórias que sejam, por um lado, importantes e marcantes na história das suas personagens, e possíveis de serem lidas sem grande conhecimento da sua vasta cronologia, e por outro lado, histórias algo mais adultas, para um público mais maduro e conhecedor (ver p.ex. o excepcional Cavaleiro Branco já lançado neste mesmo selo em português). Joker é sem dúvida tudo isso, e aproveitando esse décimo aniversário, a Levoir relança a história, numa edição que acreditamos ser uma das melhores em todo o mundo, já que junta essa história magnifica a Piada Mortal, uma das mais importantes histórias de sempre da DC, compondo um volume de "Joker absoluto"! Piada Mortal que entrará em breve para o selo Black Label nos EUA, mas que nós aqui estreamos com a magnifica capa nova que abre este livro.
Surgido em 1940, pelas mãos de Bob Kane e Jerry Robinson no desenho, e de Bill Finger no argumento, o Joker foi o antagonista do Batman no primeiro número da revista deste a solo, Batman #1, numa história que os leitores já puderam ler em volume editado pela Levoir, na colecção No Coração das Trevas da DC. Presença constante nas aventuras do Batman ao longo de décadas, o Joker chegou a ter direito à sua própria série, em meados dos anos 70. foi também nessa década que o Joker voltou às origens em termos de comportamento, deixando de ser apenas um comic relief, para se transformar numa personagem ameaçadora e mortlfera, nas histórias de Denny O'Neil e Neal Adams. Autores que depois dos delírios kitsch dos anos 50 e 60, trouxeram o Batman e os seus adversários para um caminho mais realista, que possibilitou histórias como as assinadas por Frank Miller na década de 80, ou Piada Mortal, a novela gráfica de Alan Moore e Brian Bolland que abre este volume.
Alan Moore escreveu Piada Mortal em 1988, uma história que é descrita modestamente por Moore, como "apenas uma história de Batman", mas os leitores sabem que não é bem assim. Piada Mortal é uma das mais importantes histórias do Batman de sempre. Exemplo perfeito da articulação harmoniosa entre texto e imagem, com Brian Bolland a brilhar no seu último trabalho de grande fôlego como desenhador de histórias completas, Piada Mortal explora a relação entre Batman e o Joker, e a forma como funcionam como reflexo um do outro, dando-nos a conhecer os acontecimentos que levaram o Joker à loucura. Numa sequência de flashbacks magistralmente executados, Moore dá-nos a sua versão da origem do Joker, apresentado como um comediante falhado que se envolve com um grupo de criminosos para ganhar dinheiro que lhe permita sustentar a mulher e o filho prestes a nascer, e que perde a sanidade, na sequência de um dia que lhe corre extremamente mal. Um dia que o deixa viúvo, sem filho e deformado. Mas o próprio Joker não sabe se essa memória é real, pois, como ele refere: "As minhas memórias nem sempre são as mesmas... Já que tenho de ter um passado, que seja de escolha múltipla!"
Embora a imagem do Joker derive da carta do baralho que lhe dá o nome, não podemos esquecer o contributo decisivo de uma fotografia do actor Conrad Veidt no filme The Man Who Laughs,de 1928, baseado no romance de Victor Hugo, para o sorriso que torna o Joker imediatamente reconhecível. Uma marca de felicidade forçada que esconde um destino trágico. Um sorriso (literalmente) rasgado, com que o Joker desafia o leitor nas capas das duas histórias que compõem este volume. Separadas por exactamente 20 anos, as duas histórias têm em comum o facto de atribuírem o protagonismo ao Joker, que surge sorridente em ambas as capas, capas essas em que o Batman prima pela ausência. Mas a principal diferença entre Piada Mortal e Joker, de Brian Azzarello e Lee Bermejo, é a do ponto de vista do narrador. Enquanto Moore nos dava a conhecer as recordações do Joker, o que nos permitia perceber as suas motivações, já Azzarello opta por ter como narrador um criminoso, Jonny Frost, que vai servir como motorista do alucinado vilão, transmitindo por isso uma perspectiva externa, mais próxima da do leitor.
Terceira colaboração entre o escritor Brian Azzarello e o desenhador Lee Bermejo, depois do sucesso de Lex Luthor: Preconceito e Orgulho (já editado também pela Levoir), Joker volta a ter um vilão como protagonista, o que Azzarello justifica com uma maior facilidade em identificar-se com os vilões do que com os heróis. Depois da mini-série Cidade Destroçada, já publicada em Portugal pela Levoir no volume Batman Noir, este Joker assinalou o regresso de Azzarello a Gotham City e ao universo do Batman. Desta vez, Batman está muito menos presente (embora a sua sombra paire por todo o livro) mas mantém-se a aproximação realista, mais próxima do filme noir do que das histórias de super-heróis, que faz do Croc não um mutante com genes de crocodilo, mas apenas um brutamontes com um sério problema de pele. Do mesmo modo, Harley Quinn surge aqui numa versão muito realista e sensual, mesmo que, coisa rara numa personagem de Azzarello, que trabalha os diálogos como poucos autores, não a ouçamos dizer uma palavra ... Também o Enigma nos aparece modernizado, trocando o uniforme de licra por um vestuário bastante mais urbano. O próprio Joker, acabado de sair do Asilo Arkham, comporta-se mais como um Senhor do Crime que pretende recuperar o seu território, do que como um louco sem objectivo lógico perceptlvel. O que não impede que a sua loucura se manifeste de forma assustadoramente inesqueclvel, sobretudo na violência exacerbada da história, que Bermejo traduz em imagens hiper-realistas capazes de perturbar os mais sensíveis.
Talvez por o livro ter saldo muito próximo da estreia de The Dark Knight, o segundo filme da trilogia cinematográfica que Cristopher Nolan dedicou ao Homem Morcego, houve quem visse no Joker de Azzarello e Bermejo uma versão em papel, do Joker magistralmente interpretado por Heath Ledger no cinema, mas as semelhanças entre o livro e o filme são apenas coincidência, pois Azzarello escreveu a história em 2006, dois anos antes do filme estrear. É possível, no entanto, que um desenho que Bermejo fez para o site Batman on Film, em 2006, possa ter servido de inspiração aos responsáveis pela concepção visual do filme de Nolan.
Se Azzarello constrói com grande eficácia uma história extremamente violenta de luta pelo poder, a responsabilidade pela visão perturbadora que esta história transmite ao leitor é igualmente de Lee Bermejo. O desenhador passou quase dois anos a produzir as mais de cem páginas desta história, e o resultado valeu a pena. Alternando na mesma página imagens desenhadas a traço, com ilustrações em cor directa, Bermejo, contando com a arte-final de Mick Cray, consegue imagens espectaculares e de um realismo perturbador, acentuado pelas cores sombrias de Patrícia Mulvihill. E, num livro cheio de pormenores, que justificam sucessivas leituras, não falta mesmo uma homenagem à Piada Mortal, na cena no restaurante italiano, com o Joker a comer camarões numa mesa rodeado de bandidos, que nos remete para uma cena idêntica num flashback da Piada Mortal, com a grande diferença que, em vez de um jovem inseguro, pressionado por um grupo de criminosos a participar no assalto que vai mudar a sua vida, desta vez é o Joker quem comanda o jogo.
João Miguel Lameiras
Brian Azzarello e Lee Bermejo
Brian Azzarello escreve comics profissionalmente desde meados dos anos 1990. É um autor best-seller do New York Times, com títulos aclamados como Batman, Jonny Double, Spaceman, Moonshine, e a extraordinária e inovadora série 100 Balas, que venceu inúmeros prémios Eisner e Harvey, criada em colaboração com o artista Eduardo Risse. Outras obras suas incluem H Ellblazer e Loveless (ambas com Marcelo Frusin), Super-Homem: Pelo Amanhã (com Jim Lee, já editado pela Levoir) , Joker, Lex Luthor: Preconceito E Orgulho (editado pela Levoir), Before Watchmen e Batman: Damned (estes últimos com Lee Bermejo), bem como uma fase de três anos na Mulher-Maravilha que ajudou a redefinir a personagem (com Cliff Chiang), e Dark Knight III: The Master Race (com Frank Miller e Andy Kubert). É natural de Chicago.
O premiado Lee Bermejo é o ilustrador das novelas gráficas Batman/Deathblow, Lex Luthor: Preconceito e Orgulho, Before Watchmen: Rorschach, e do best-seller do New York Times Joker, todas criadas em colaboração com Brian Azzarello.
Outros trabalhos que assinou para a DC incluem Global Frequency (com Warren Ellis), Superman/Gen 13 (com Adam Hughes) e Hellblazer (com Mike Carey), bem como dúzias de capas pintadas. Também escreveu e ilustrou as aclamadas novelas gráficas Batman: Um Conto de Natal (editada pela Levoir) e Suiciders, para a Vertigo. O seu mais recente projecto é Batman: Damned. Bermejo vive e trabalha numa pequena cidade de Itália.
Alan Moore
Brian Bolland
JOKER (Edição Comemorativa)
Colecção DC Black Label
Joker, de Brian Azzarello e Lee Bermejo
Piada Mortal, de Alan Moore e Brian Bolland
Publicação produzida e distribuida por Levoir, Marketing e Conteúdos Multimédia S.A. – www.levoir.pt
Editora: Silvia Reig
Para a edição Portuguesa:
Coordenação: José de Freitas
Adaptação gráfica: Rui Alves
Tradução: José de Freitas (Joker) e Paulo Furtado (Piada Mortal)
Legendagem: Hugo Jesus
Capa dura, formato 170 x 257 mm, cores, 184 pags.
PVP: € 19,90
Edição LEVOIR
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NOTA DA “GERÊNCIA” DO KUENTRO:
UMA PEQUENA CRÍTICA PRIMÁRIA
A ESTA EDIÇÃO DE JOKER
O modo de escrita que se observa desde há algum tempo, especialmente nas traduções de obras de banda desenhada americana, contém quase por norma os mesmos erros em todas as edições. Não custaria nada escrever as designações correctas.
Depois de se indicar na 3ª página, de modo correcto os autores de Piada Mortal: Argumento de Alan Moore – desenho e cores de Brian Bolland, escreve-se de seguida e erradamente a autoria de Joker: “Argumento: Brian Azzarerello; Arte: Lee Bermejo...” deveria escrever-se em vez de Arte, Ilustração: Lee Bermejo. E porquê? É que tanto o argumento como a ilustração são formas de arte: a arte da escrita, a arte do desenho e a arte da pintura – são coisas diferentes e todas elas com o estatuto de artes!
Já agora, onde está indicado: Arte da Capa: Lee Bermejo, deveria estar escrito Ilustração de Lee Bermejo, ou capa ilustrada por Lee Bermejo!
Jorge Machado-Dias
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