segunda-feira, 16 de setembro de 2013

JOBAT NO LOULETANO (132-133) – AUGUSTO TRIGO (8 e 9)

"Campune", rapariga Bijagó. Ilustração de Augusto trigo feita na Guiné, em l967


JOBAT NO LOULETANO (132-133)
AUGUSTO TRIGO (8 e 9)

O Louletano, 21 de Abril de 2008

O MENINO QUE RABISCAVA PAREDES – 6
por: José Batista

Na data aprazada, as peças foram entregues e o presépio exposto, para descanso de uns e expectativa de outros, mormente o Provedor, que via nesse acontecimento uma boa ocasião de mostrar obra que dignificasse a instituição que dirigia.

Alguns dias depois, finda a exposição/concurso na qual tinham participado representando a secção Maria Pia, em Xabregas, chegou a agradável notícia de que o presépio por eles apresentado tinha, entre muitos outros concorrentes, ganho o 1° prémio.

Este simples mas marcante acontecimento iria originar profundas alterações na vida e carreira do jovem Augusto Trigo, pois pro­vou à saciedade a sua real vocação, capacidade e potencialidades artísticas para áreas mais consentâ­neas com o campo das artes visuais que de há muito exteriorizava, de forma concreta, nos desenhos e pequenas esculturas que às escondidas fazia. Pe­rante tal facto, por demais evidente, os professores e mestres concluíram que, pese embora o aproveita­mento nas restantes dis­ciplinas não atingisse os níveis requeridos, o aluno deveria frequentar uma mais condizente com a vocação artística de que dera sobejas provas.

Ei-lo, então, transferido para a secção Pina Manique – o nome do Intendente de polícia, no tempo do Marquês de Pom­bal, que fundou a instituição Casa Pia – em Belém, onde foi matriculado na área de Modelação e Talha, disciplina na altura ministrada pelo escultor Martins Correia, de entre outras que obrigatoriamente frequentava por fazerem parte do currículo do respectivo curso. Não podemos afirmar que a apetência por essas outras áreas do saber se modificou, mas sim que a empatia com o mestre escultor e a nova disciplina foi natural e espontânea, numa osmose per­feita entre a sua natural vocação e o meio escolhido para a educar e desenvolver.

Estamos em 1953, e o jovem artista, com 15 anos apenas, aí passará os próximos quatro, vazando na argila - matéria bastante dúctil utilizada para modelar as figuras que depois servirão de modelo para esculpir em pedra, ou talhar em madeira - as formas que a sua inspira­ção suscita ou a disciplina que frequenta exige. Embora não estivesse inscrito nas aulas de desenho à vista, vez por outra, dada a sua natural apetência por essa área, frequentava as aulas do mestre Bernardino, professor já idoso mas muito competente, que ministrava essa disciplina. »»

Vinheta da série incompleta "Turu-Bã", desenhada por Augusto Trigo na Guiné, em 1965

Esboço de Augusto Trigo para a restauração de um mural, a pintar em tela, feito na Guiné em 1965

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O Louletano. 28 de Abril de 2008

O MENINO QUE RABISCAVA PAREDES – 7
por: José Batista

O material utilizado na feitura dos desenhos nas aulas do mestre Bernardino, para além do papel, como é óbvio, eram pequenos gravetos de carvão, preparados para esse fim, e, como borracha ou apagador, miolo de pão, fresco do próprio dia, fornecido por uma padaria do exterior da instituição, cuja macieza, melhor do que qualquer outro produto, absorvia e limpava o desenho onde e como o ilustrador ou o desenho o exigissem.

A utilização da parte interior do pão, dava lugar a que a côdea, não aprovei­tada, o fosse, entre os alunos, para aquele para que é feito, isto é, servir de alimen­to. Talvez porque o pão produzido fora da Casa Pia fosse mais fresco ou mais saboroso, e porque, como é sabido, "barriga de moço não tem osso", estivessem subalimentados - era normalmente encomendado em quantidade superior ao que era necessário para as aulas de desenho, pois que as côdeas sobrantes, e não só, eram insuficientes para satisfazer o apetite ou gula da pequenada candidata à parte não utilizada.

O velho professor, com a tarimba que os muitos anos lhe tinham dado, não reservava a sua atenção apenas para a arte que ensinava, mas também para o olhar cobiçoso que os seus jovens alunos lançavam ao fresco pão que todos os dias rece­bia. Para além de artista era também profundamente hu­mano e psicólogo no que concerne às crianças. Depois, os tempos eram ainda de crise no Portugal de então, país não refeito das convul­sões causadas pela guerra mundial que assolara vastas zo­nas do globo, com reflexos visíveis na nossa frágil econo­mia, especialmente na área alimentar daqueles com mais débeis recursos.

Embora o estilo de escultura do mes­tre Martins Correia fosse, à época, um pouco estilizado, de forma alguma incutiu naqueles que ensinava essa vertente artís­tica como se ela fosse a única existente e válida. Respeitava-lhes as tendências com visão aberta e tolerante, não os formatando à sua medida, como por vezes acontece a quem ensina, embora, como é lógico, essa influência fosse notória. O convívio entre professor e aluno foi tão sereno quanto útil para Augusto Trigo, que a breve trecho se transformou num prestável colaborador do mestre, inclusive para, quando este por indisponibilidade o não podia fazer, classificar os trabalhos dos seus colegas de turma. Martins Correia confiava tanto na capacidade artística do seu jovem instruendo que, por vezes, lhe bastava somente uma fugaz indicação - punha um aluno a posar na posição que desejava - para que a peça escultórica surgisse e lhe servisse de base às alterações que o seu estilo exigia. »»

Ilustração de Augusto Trigo referente à crise do petróleo, publicada no periódico local Guineense, "O Arauto", em 1964.

Tocador de "Balombátá", Mandinga. Ilustração de Augusto Trigo retratan­do um costume local, feita na Guiné em 1967

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LUZ DO ORIENTE
(8 e 9)
Jorge Magalhães (argumento) - Augusto Trigo (ilustrações)



(continua...)
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