domingo, 1 de setembro de 2013

GAZETA DA BD (12) NA GAZETA DAS CALDAS – NOVO LIVRO DE ÁLVARO – BALCÃO TRAUMA

GAZETA DA BD (12)
NA GAZETA DAS CALDAS
NOVO LIVRO DE ÁLVARO
BALCÃO TRAUMA

in Gazeta das Caldas, 30 de Agosto de 2013
Jorge Machado-Dias

A sequência de Sexo, Mentiras e Fotocópias, editado em 2007 pela Pedranocharco Publicações, surgiu agora, com o título Balcão Trauma, editado pelo próprio autor, Álvaro Santos (não, não é o ex-ministro), com a chancela Insónia.

Para se entender este livro em pleno, dever-se-ia ler primeiro o anterior, acima citado – embora este novo título tenha todas as condições para se individualizar. Contudo, a leitura dos dois livros em sequência mostraria, mais que não fosse, a quem se interessa por esses aspectos mais técnicos, a evolução do autor em narrativas longas.

Em Sexo, Mentiras e Fotocópias, um jovem entra num “Centro de Fotocópias” pretendendo comprar uma folha de papel de formato A3 (esta questão do formato A3 vs A4, vai gerar uma série de confusões delirantes), uma vez que a papelaria já está encerrada. Mas a “funcionária das fotocópias” insiste que não se vendem ali folhas de papel, mas sim fotocópias. A saga vai continuando, com o jovem a entrar em laivos de loucura, perante a imbecilidade intransigente da sempre impassível “senhora das fotocópias” e a entrada em cena de diversas outras personagens. No final, o jovem acaba por ser levado pela polícia, por estar a “provocar desacatos”.

Em Balcão Trauma, inicia-se a narrativa com a entrada do jovem (que ficou tresloucado) na história anterior, no serviço de urgências de um hospital – no serviço “Balcão Trauma”, clara piada aos balcões “Simplex” do governo de José Sócrates – onde é encaminhado para uma jovem médica “que ainda vive com a mãe e com quem tem problemas”. A jovem médica, “que fuma demasiado”, não consegue comunicar da melhor forma com o doente (e vice-versa) e as coisas complicam-se.

Neste livro, Álvaro introduz de forma sistemática uma técnica narrativa que poucas vezes usa em Sexo, Mentiras e Fotocópias: a contracena. Daí que, enquanto se desenrola a cena principal, do jovem com a médica, o autor comece a mostrar, em contracena, o que se passa na sala de espera. E é aí, com a conversa das “comadres” à espera de serem atendidas, que a história se vai tornar delirante, suplantando mesmo o tema principal. Até que, a dada altura, a contracena passa a ter maior protagonismo e a conquistar o centro da cena, apoderando-se até do epílogo, num delírio de loucura em crescendo. A história termina, assim, com o jovem (das fotocópias) a olhar para nós leitores, atónito, sem perceber nada do que se está a passar à sua volta e a jovem doutora a dormir, devido ao efeito dos comprimidos que tinha tomado a certa altura, para “se acalmar”.

Com isto parece-nos que Álvaro começa a dominar as narrativas mais longas – que em Sexo, Mentiras e Fotocópias é ainda um pouco incipiente, demasiado linear e, por isso, até maçador – sendo ele mestre nas histórias curtas.

Posto isto, devemos dizer que Álvaro Santos nasceu em 1970, é Arquitecto por formação mas sem grande apetência para a profissão, dedicando-se à ilustração, cartoon e banda desenhada, que não lhe darão grande pecúlio, pelo que, como complemento, exerce a “profissão” de explicador de Geometria Descritiva e outras disciplinas relacionadas com a arquitectura.

Álvaro publicou um primeiro livro (edição de autor) em 1998, As Insustentáveis Incompatibilidades dos Seres de que, segundo consta, tem quase toda a edição arrumada debaixo da cama. Começou a participar activamente no fanzine “Tertúlia BDzine”, editado na Tertúlia BD de Lisboa – da qual é actualmente um dos mais antigos frequentadores e também um dos quatro coordenadores, desde a “reforma” (em Junho deste ano) de Geraldes Lino, seu fundador e coordenador durante vinte e oito anos.

Participou em outros fanzines editados pelo fundador da TBDL, nomeadamente no Efeméride, desde o nº 2 – e cujo nº 5, dividido em quatro partes começará a sair este ano no Festival de BD da Amadora.

Vencedor de vários prémios em Festivais de BD e Cartoon, o autor publicou em 2006, pela Pedranocharco Publicações o Manual de Posições para Labregos e, em 2007, Sexo, Mentiras e Fotocópias, que havia começado a ser publicado em “fascículos” no BDjornal, do nº 13 ao nº 18 e participando com bandas desenhadas curtas em outros números do BDjornal desde o nº 7 (2005), com um episódio de Xatoman. Em 2008 congemina o projecto de uma revista humorística, a que deu o título de Moda Foca, editada pela Pedranocharco Publicações, mas que, mau grado a qualidade da publicação, não alcançou os objectivos comerciais pretendidos, talvez devido ao facto de que o público português, lembrado ainda das edições de José Vilhena, nos anos 1960 e 1970, estaria mais habituado àquele tipo de humor.

Quanto a nós, o maior sucesso comercial que Álvaro poderia ter, para já, seria com a edição (compilação) em livro das suas numerosas histórias curtas, de inegável sucesso, onde pontificam por exemplo, Xatoman – o super-herói mais chato que a própria sombra –, a hilariante história do nascimento de Cristo, em No Presépio..., escrita por José Pinto Carneiro, ou Salvai-nos Irmão! E muitas outras.

 BALCÃO TRAUMA: páginas 14 e 15, onde se inicia a combinação referida acima, “cena” – “contracena”...

____________________________________________________

BALCÃO TRAUMA
À VENDA NA LIVRARIA PEDRANOCHARCO ONLINE

____________________________________________________

2 comentários:

  1. Eh, pá! Este é um livro que vou comprar. Já tinha lido alguns tópicos sobre esta obra do Álvaro em outros blogues, mas a forma como o Machado-Dias expôs, em género de recensão, este trabalho, deixa-me preparado para, na próxima oportunidade, adquirir o livro.
    O Autor tem uma visão (ao que me parece) privilegiada da sociedade e dos seus contrastes, e sabe expô-la nestas vinhetas de grande profundidade humorística, em diálogos actuais, oportunos e com evidente criatividade.
    Ao Álvaro - e, naturalmente, ao Machado-Dias pelo seu artigo - os meus parabéns.

    ResponderEliminar
  2. Caro amigo Machado-Dias

    Acerca de "Balcão Trauma", a mais recente obra do Álvaro, considero que escreveste uma crítica brilhante para o jornal "Gazeta das Caldas".

    Por acaso também fiz uma crítica a esse livro, mas em apresentação ao vivo na Feira de Poesia e Banda Desenhada (a estupenda iniciativa semanal da Inês Ramos), mas fiquei muito aquém da tua análise, embora também tenha apreciado a invulgaríssima exploração do conceito de alternância de duas cenas paralelas.

    Uma pequena correcção, no que se refere às colaborações do Álvaro no meu fanzine "Efeméride": ele começou a colaborar logo no nº1, para a obra colectiva "Sonhos de Nemo no Século XXI", cujas pranchas estiveram em exposição no Festival BD da Amadora.

    ResponderEliminar

 
Locations of visitors to this page