Onde é que eu estava no 25 de Abril?*
Bem, exactamente há 40 anos, eu estava no “Centro de Recruta”, ou “Destacamento” (ou lá como se chamava) da Escola Prática de Cavalaria, na Avenida do Brasil em Santarém, desde o dia 23, quando “assentei praça” convocado para o Serviço Militar obrigatório. Nesse dia 23, depois das formalidades burocráticas, em bichas que demoraram horas, recebemos o fardamento (também em bichas que demoraram horas) – com provas das fardas e trocas, até se acertar com os tamanhos mais ou menos certos. Depois foi altura de engraxar botas, preparar a farda para o dia seguinte e tratarmos da instalação na caserna, onde passariamos os três meses seguintes. No dia 24 recebemos as armas (as célebres G3 - de Gewehr 3) e depois formámos os pelotões, na parada, ouvimos muita treta meio “psicológica” dos Aspirantes e Cabos Milicianos que, segundo nos pareceu, estavam muito inquietos, falavam muito uns com os outros e por vezes formavam grupinhos em “conversas misteriosas”...
Engraxanço de botas, tardinha de 24 de Abril de 1974 - tinhamos que as engraxar todos os dias...
Saímos pela porta-de-armas, um de cada vez, com instrução de “correr em ziguezague” para atravessar a Avenida do Brasil, em direcção à Estação da CP. No comboio para Lisboa, sem perceber patavina do que se estava a passar, reparei que alguns passageiros ouviam marchas militares nos rádios transistores. Apanhei o barco para Almada, no Terreiro do Paço, sem reparar no aparato militar que lá se encontrava... Enfim, estava completamente “a Leste do Paraíso”...
Por volta das 8h30, já em Almada, ao atravessar uma rua em direcção a casa, cruzei-me com o meu pai, que vinha de carro, parou com ar preocupado quando me viu e perguntou: “Eh, pá, não me digas que desertaste?” – “Não desertei nada, mandaram-nos embora, não sei porquê!”, respondi. “Então, não sabes que houve um Golpe de Estado?” respondeu ele. Então, em vez de ir para minha casa, fui para casa do meu vizinho e amigo Carlos Guerreiro (actualmente dos Gaiteiros de Lisboa) e ficámos os dois, uma data de tempo a ouvir as notícias... Depois, bem, depois fui namorar - com a televisão em fundo, em transmissão directa e "ao vivo" do 25 de Abril, no Largo do Carmo, com a minha futura sogra a choramingar "ai coitadinho do Marcelo, o que é que vão fazer ao homem?" e com o meu futuro sogro em silêncio mas com um sorriso de felicidade, que não cabia nele.
Foi assim que soube que se tinha dado o “25 de Abril”...
Só regressei a Santarém no dia 29 e depois foi toda a gente para casa passar o 1º de Maio, regressando de novo a 6 de Maio. O meu serviço militar terminaria em meados de Outubro de 1975, depois de uma “Comissão de Serviço” de seis meses em Angola. Não vivi portanto nada da "loucura" colectiva de 1974, nem do PREC (Processo Revolucionário Em Curso), nem o “Verão Quente” de 1975, nem nenhuma das trapalhadas que aconteceram nesse ano e meio – estive sempre metido em quartéis (e depois em Angola), excepto nos fins-de-semana ou no gozo de uma ou outra licença entre mudanças de quartéis. Mas andava bem informado sobre o que se estava a passar, claro.
Depois da "licença" do 1º de Maio de 1975 (o único de bigode)...
Durante a Recruta, em Santarém...
Semana de Campo - Vale de Cavalos, Santarém...
(*) Da pergunta criada por Herman José num dos seus programas humorísticos – quando ainda tinha humor – e depois utilizada por jornalistas em centenas de entrevistas “sérias”.
QUEM QUISER, PODE VER AQUI TODA A CRONOLOGIA PORMENORIZADA DO 25 DE ABRIL E DIAS ANTERIORES
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AMANHÃ
RECORTES DE IMPRENSA
O 25 DE ABRIL VISTO POR
VASCO PULIDO VALENTE E JOÃO MIGUEL TAVARES
E AS FOTOS A PRETO E BRANCO
DE EDUARDO GAGEIRO
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